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Mineração de MG perde prazo para eliminar barragens; setor tenta evitar punições

Muro construído pela mineradora Vale para barrar rejeitos da barragem B3/B4 retém água das chuvas, acusam moradores da região de Macacos, em Nova Lima (MG) - Reprodução
Muro construído pela mineradora Vale para barrar rejeitos da barragem B3/B4 retém água das chuvas, acusam moradores da região de Macacos, em Nova Lima (MG) Imagem: Reprodução

09/02/2022 15h20

RIO DE JANEIRO (Reuters) - A Vale e outras mineradoras estão prestes a descumprir um prazo legal que previa a eliminação de suas barragens consideradas mais perigosas em Minas Gerais até 25 de fevereiro e poderão operar sob o risco de sanções, como a suspensão de suas licenças, segundo representantes do setor.

O prazo, considerado inviável desde o início pela indústria de mineração, devido à complexidade para a eliminação das estruturas, foi determinado um mês após o rompimento de barragem em Brumadinho (MG), que ocorreu em 25 de janeiro de 2019.

Uma lei de Minas Gerais deu prazo até o próximo dia 25 para o fim das barragens alteadas pelo método a montante, consideradas mais perigosas, por suas paredes serem construídas sobre uma base de resíduos, em vez de em material externo ou em terra firme. A tecnologia foi utilizada em Brumadinho e também na barragem da Samarco que se rompeu em Mariana (MG) em 2015.

No total, apenas 18 barragens a montante terão sido descomissionadas dentro do prazo, das 48 existentes em Minas Gerais em 2019, conforme levantamento da Federação das Indústrias do Estado de Minas Gerais (Fiemg). Outras seis devem ser totalmente eliminadas até o fim do ano no Estado, apontou.

Para ilustrar a dificuldade dos trabalhos, a federação calculou que se todas essas barragens fossem descaracterizadas, mediante a remoção de estimados 689,5 milhões de metros cúbicos de rejeitos, seriam necessárias décadas. Há, no entanto, outras formas de se descaracterizar as estruturas.

Diante desse cenário, a federação decidiu recorrer à Justiça para evitar sanções e encontrar meios para que o prazo seja flexibilizado de acordo com as características e demandas de cada empreendimento.

"Não queremos que seja mais lento, o que tem que fazer é o mais seguro... Descomissionar assodadamente também seria um risco", disse à Reuters o presidente da Fiemg, Flávio Roscoe, ressaltando ainda que o processo de descomissionamento e o prazo deveriam levar em conta estruturas individuais e segurança.

"Defendemos que seja cumprida a Lei Federal e o órgão técnico defina o cronograma para o descomissionamento das barragens."

Cada empresa, segundo ele, apresentou um cronograma para a descaracterização das barragens, considerando o prazo e o método necessário para que seja feita de forma segura.

Uma lei federal, publicada em setembro de 2020, também determina a data de 25 de fevereiro para a conclusão da eliminação de barragens a montante, mas prevê que o prazo poderá ser prorrogado pela entidade que regula e fiscaliza a atividade minerária.

A gigante Vale, dona do maior número de barragens relacionadas à produção de minério de ferro no Estado, eliminou desde 2019 quatro estruturas a montante em Minas Gerais - outras três do Pará -, das 30 mapeadas pelo Programa de Descaracterização da empresa, detalhou a companhia recentemente.

Nesta semana, a mineradora iniciou o descomissionamento da primeira das cinco que estão previstas para serem descomissionadas ainda neste ano, todas em Minas Gerais.

Procurada para comentar a lei estadual, a Vale reiterou seu compromisso de descomissionar as barragens a montante no país e evitar novas tragédias.

"Um dos pilares do trabalho da Vale no princípio de garantia de não repetição de rompimentos como o de Brumadinho é a eliminação de todas as suas barragens alteadas a montante no Brasil, no menor prazo possível, tendo como prioridade, sempre, a segurança das pessoas, dos trabalhadores e do meio ambiente", afirmou a empresa por email.

Além da Vale, há barragens a montante de diversas companhias no Estado, conforme registros da reguladora ANM e do governo mineiro. As estruturas pertencem a empresas como CSN, Gerdau e ArcelorMittal, entre outras.

Procuradas, a agência reguladora do setor ANM, CSN, Gerdau e ArcelorMittal não responderam imediatamente a pedidos de comentários.

Recursos na Justiça

Diante do cenário, a Fiemg apresentou ação na Justiça na semana passada, questionando a constitucionalidade da lei estadual, em busca de evitar que as empresas tenham suas licenças cassadas ao não cumprir os prazos.

Segundo Roscoe, a possível aplicação da suspensão da licença como penalidade vai na contramão do que prevê a própria lei, uma vez que as empresas seriam impedidas de dar continuidade às atividades necessárias para o descomissionamento.

Uma outra ação deverá ser apresentada pela federação no fim desta semana na Justiça, segundo Roscoe, pedindo uma mediação do judiciário para que os trabalhos de descomissionamento sejam realizados de acordo com a necessidade de cada empreendimento.

Luiz Fernando Visconti, sócio de Mineração do escritório de advocacia SiqueiraCastro, afirmou à Reuters que "não é novidade que não seria possível cumprir esses prazos", devido à complexidade dessas estruturas.

Ele destacou ainda que a insegurança jurídica e a sobreposição de normas sobre o mesmo tema prejudicam investimentos no país. A própria ANM, ressaltou Visconti, publicou em agosto de 2019 uma regulamentação definindo prazos mais longos para a eliminação das barragens a montante, levando em consideração os volumes de rejeitos em cada estrutura.