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'Transformei minha detenção em retiro espiritual', diz francesa sequestrada por 4 anos

A francesa Sophie Pétronin foi libertada após passar 4 anos sequestrada no Mali - STRINGER/AFP
A francesa Sophie Pétronin foi libertada após passar 4 anos sequestrada no Mali Imagem: STRINGER/AFP

09/10/2020 05h54

A francesa Sophie Pétronin, 75, foi libertada na noite de ontem no Mali, depois de passar quatro anos como refém de jihadistas. A funcionária de uma ONG humanitária, última refém francesa no mundo, conversou com a RFI logo após a libertação.

"Minha saúde está ótima, estou em plena forma", afirma a ex-refém ao enviado da RFI ao Mali, Serge Daniel. Ela conta que, logo depois de ter sido libertada, passou por exames médicos e "tudo está em ordem, sem nenhum problema".

Aos 75 anos, Sophie não demonstra cansaço e exibe um invejável otimismo. "Foi um pouco longo, mas transformei minha detenção em retiro espiritual. Assim foi melhor. Aceitei o que aconteceu comigo, não estava numa postura de resistência e, 'voilà', consegui sobreviver", disse.

Sophie dirigia uma ONG franco-suíça que ajudava crianças desnutridas. Ela foi sequestrada por homens armados em 24 de dezembro de 2016 em Gao, no norte do Mali. A ativista ficou detida durante quatro anos em uma prisão a céu aberto.

"Eu observava o nascer do sol no leste, o pôr-do-sol no oeste e o sol perpendicular ao meio-dia. O ar era puro, eu bebia muita água para me hidratar. Era assim que os dias passavam." Sophie também diz ter rezado muito "porque tinha muito tempo livre" e caminhado nas ocasiões em que era permitida.

A cada sexta-feira, a RFI divulgava mensagens de apoio à humanitária, que ela diz ter lhe dado forças. "Lembro-me de certa vez uma jornalista da RFI ter dito: 'se você nos ouve, Sophie, espero que essa mensagem lhe reconforte. E, sim, ela me reconfortou. Eu escutava a RFI", afirmou.

Sophie também agradeceu os esforços do filho, Sébastien Chadaud, que trabalhou intensamente pela sua libertação. Ele foi o primeiro a abraçá-la no aeroporto de Bamako, na noite de ontem, em um esperado e emocionante reencontro.

"Meu filho é um lutador. Na nossa família somos todos assim. Para mim, o que foi mais difícil de gerenciar foi a ideia de colocá-lo em uma situação complicada, que exigiu muita energia da parte dele. Mas eu tinha certeza, no fundo do meu coração, de que ele conseguiria", disse.

Em uma mensagem que Sophie recebeu do filho, ele fez um apelo para que a mãe fosse forte, o que ela diz ter seguido à risca. "Eu pensei: 'se ele está me dizendo isso, eu devo fazer isso'. Eu segurei a barra e aguentei."

Poucos detalhes sobre negociações com jihadistas

Sophie foi sequestrada por jihadistas e as negociações para a libertação foram negociadas pelo governo do Mali, com acompanhamento do governo francês. Outro refém, Soumaïla Cissé, ex-ministro malinês das Finanças, sequestrado em março deste ano, em Tombuctu, no norte do país, foi libertado ao mesmo tempo que ela.

No entanto, poucos detalhes foram revelados sobre as negociações para a libertação dos dois reféns. Supostos extremistas que estavam presos em detenções do Mali foram libertados no último fim de semana em troca da liberdade da francesa e de Cissé.

Sophie, aliás, se recusa a chamar os sequestradores de jihadistas —prefere denominá-los grupo armado de oposição ao governo. "Em 1996, foram assinados acordos de paz. Mas se quisermos a paz no Mali, será preciso que cada um respeite seus engajamentos", disse.

A francesa não crítica as exigências feitas pelos sequestradores. "Se você tiver um grupo de militares em guerra e seus colegas forem presos, eles vão fazer de tudo para tentar libertá-los. Isso pode acontecer com os exércitos francês, congolês ou americano. 'Jihad' significa 'guerra'. Essa é uma guerra entre grupos de oposição armados contra o regime. Tudo o que eu desejo é que eles encontrem um caminho em direção da paz", afirmou.

A trabalhadora humanitária, que vive há vários anos no Mali, já havia escapado de um possível sequestro por extremistas em 2012. Na época, graças a um disfarce, ela conseguiu fugir do consulado da Argélia no país no momento em que o prédio estava sendo tomado por jihadistas.