Diplomacia personalista de Bolsonaro derruba imagem do Brasil no mundo, dizem analistas
Vista mais como publicidade do que política diplomática séria, a aventada comitiva de presidentes para visitar Vladimir Putin em meio à guerra não tem até aqui elementos para ganhar corpo e fazer diferença nos esforços para o fim do conflito. Especialistas ouvidos pela RFI disseram que a ideia que Jair Bolsonaro (PL) sugeriu à chancelaria turca retrata o personalismo do presidente brasileiro, de olho nas eleições, e a falta de conhecimento das estratégias diplomáticas.
"Infringe uma das mais elementares regras do procedimento diplomático que é a discrição e o sigilo. Se ele quer mesmo desempenhar algum papel de mediador deveria fazer com discrição", afirmou à RFI William Gonçalves, professor de relações internacionais da UFRJ. "E a partir do momento que ele se pronuncia dessa maneira, propondo a visita a um presidente, também está tomando partido e assim invalidando sua atuação. É no mínimo contraproducente."
Nos bastidores, diplomatas tentam amenizar as reações que as palavras do presidente geraram e dizem que não houve uma proposta formal de comitiva, mas uma ideia levantada de forma geral por Bolsonaro no encontro com o chanceler da Turquia, Mevlüt Çavusoglu, semana passada no Palácio do Planalto. Laerte Apolinário, da PUC São Paulo, afirmou à RFI que não vê respaldo técnico do Itamaraty às palavras do presidente. "Isso não foi comentado nem confirmado pela diplomacia brasileira. Então me parece uma iniciativa muito mais personalista do presidente brasileiro do que uma política de Estado. Acredito que tenha o objetivo de aumentar a popularidade no contexto da disputa eleitoral doméstica do que relação mesmo com a política externa do país."
Fora do G7 de novo
Mesmo que tente atrelar sua imagem a alguma iniciativa de mediação do conflito, Bolsonaro dificilmente colherá frutos nessa seara, pois o Brasil não tem hoje estatura internacional para liderar projetos mais audaciosos e de peso no mundo, na avaliação dos especialistas. Prova disso veio com a terceira exclusão consecutiva do país do G7, grupo que reúne as nações mais ricas do mundo, mas que recebe líderes convidados para sua cúpula anual, que em 2022 será realizado mês que vem em Berlim.
"Simboliza os resultados da política externa errática dos últimos anos. O país que já foi convidado várias vezes para o evento tem ficado fora desde o início do governo Bolsonaro. Embora isso tenha um peso mais simbólico que prática, não deixa de mostrar o isolamento internacional do país", disse Laerte Apolinário. "O Brasil sempre teve boas relações com todo o mundo, pequenos e grandes, e isso se perdeu nos últimos anos. O atual governo queimou pontes com nossos principais parceiros, como Estados Unidos, Europa, China. Além dos latinos americanos."
Foram convidados a participar da Cúpula do G7 líderes da África do Sul, Índia, Indonésia e Senegal. Para William Gonçalves, o grupo não vê porque chamar um país que não tem liderança nem entre seus vizinhos mais próximos. "Não gozamos mais da liderança política na América do Sul. Os países daqui não nos reconhecem mais como um líder natural, ao contrário. O Brasil, com o atual governo, fez tudo para esvaziar completamente o Mercosul, sair da Unasul. Rompemos os laços de solidariedade que tínhamos com nossos vizinhos."
O analista afirma que a exclusão do G20 ilustra os obstáculos que o país tem pela frente para recuperar respeito e credibilidade lá fora. "Nossa imagem no mundo hoje é péssima, nós abraçamos as piores causas, nosso presidente provoca antipatia por onde vai, em especial com relação às questões ambientais."
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