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UE aposta em plano sobre refugiados para acalmar crise diplomática entre Itália e França

14/11/2022 05h21

França e Itália estão em plena crise diplomática depois que o novo governo italiano recusou receber o navio humanitário Ocean Viking, na semana passada. A União Europeia pretende agora apresentar um plano de emergência para resolver o conflito.

Letícia Fonseca-Sourander, correspondente da RFI em Bruxelas

A Comissão Europeia está elaborando um plano de emergência para resolver a escalada de tensão entre os países do bloco sobre como lidar com os requerentes de asilo resgatados no mar. A intervenção de Bruxelas vem à tona depois da crise provocada pela decisão da Itália em impedir que o navio humanitário Ocean Viking atracasse nos portos do país, com 234 imigrantes a bordo.

Uma das principais promessas eleitorais da nova primeira-ministra italiana e líder do partido neofacista Irmãos da Itália (FdI), a ultradireitista Giorgia Meloni, é deixar de receber os migrantes que chegam do norte da África em botes infláveis e promover um bloqueio naval no Mediterrâneo para conter a imigração.

Com a recusa da Itália, a França decidiu autorizar a entrada do navio Ocean Viking, que ficou três semanas à deriva no mar, no porto de Toulon. O ministro do Interior francês, Gerald Darmanin criticou Meloni e afirmou não haver dúvidas de que o barco estava na zona de busca e resgate italiana. "O incidente trará consequências sérias para a relação bilateral", salientou Darmanin, que anunciou um reforço dos controles das fronteiras entre os dois países e a suspensão dos planos do governo francês de acolher 3.500 mil refugiados recém-chegados à Itália.

Nesta segunda-feira (14), o presidente francês, Emmanuel Macron, e o italiano, Sergio Mattarella, insistiram na importância da relação entre os dois países. Em um comunicado conjunto divulgado, eles reafirmaram a necessidade de "reunir as condições para uma cooperação total em todos os setores, em nível bilateral e dentro da União Europeia."

Primeira crise diplomática do novo governo italiano

A premiê italiana Giorgia Meloni prometeu defender os interesses da Itália na Europa, no entanto em apenas três semanas no poder, ela se encontra em uma disputa diplomática que ameaça não só prejudicar os interesses de Roma mas deixá-la isolada dentro da União Europeia. Meloni declarou que a Itália não pode ser o porto para todos os imigrantes que chegam da África.

O discurso não é novo. Há três anos, o então ministro do Interior italiano, Matteo Salvini, atual vice-primeiro-ministro e ministro da Infraestrutura, afirmou que a Itália não era o campo de refugiados da União Europeia. Agora, com a extrema direita no comando do país, é provável que a política de migração endureça ainda mais. No mês passado, antes da posse do novo governo italiano, o papa Francisco, sem citar o nome de Meloni, defendeu os imigrantes de forma enfática.

"A exclusão dos migrantes é escandalosa. De fato, é criminosa. Faz com que morram na nossa frente", declarou o pontífice. O papa Francisco já havia chamado atenção para o problema no ano passado durante um discurso emotivo na ilha grega de Lesbos. Ele disse que o Mediterrâneo está se tornando um cemitério frio sem lápides e implorou para que este naufrágio da civilização termine.

As tragédias no Mediterrâneo estão mais fatais

O Alto Comissariado da ONU para os Refugiados (ACNUR) acredita que as travessias no Mediterrâneo estão mais fatais. As rotas que passam pelo Mediterrâneo Central têm um dos fluxos migratórios mais movimentados do mundo. A mais mortífera delas é a que tem origem na costa do norte da África, sobretudo da Líbia para a Itália.

Apenas este ano, 126 mil pessoas fizeram a travessia rumo à Europa e cerca de 1.200 refugiados morreram afogados. Segundo a Organização Internacional para as Migrações (OIM), agência das Nações Unidas, na última década quase 25 mil pessoas perderam a vida no mar e muitas mortes poderiam ter sido evitadas se os botes infláveis que enfrentaram problemas tivessem recebido ajuda. A ONG Human Rights Watch critica os governos europeus que priorizam o controle de fronteiras aos resgates de refugiados.