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Um mês após massacre, alunos de Realengo começam a superar trauma e até fazem piadas com atirador

Hanrrikson de Andrade <br>Especial para o UOL Notícias <br>No Rio de Janeiro

07/05/2011 07h00

Um mês depois do massacre no colégio Tasso da Silveira, em Realengo, na zona oeste do Rio de Janeiro, os alunos tentam superar o trauma fazendo até piadas sobre o atirador Wellington Menezes de Oliveira, ex-aluno da escola que assassinou 12 crianças.

A professora de informática Roberta Oliveira diz que “tudo voltou ao normal”. Roberta conta também que nenhuma criança manifestou até o momento emoções “mais agudas” ao retornar às salas. Pelo contrário, algumas até tratam a situação com bom humor, segundo ela. Em uma brincadeira conhecida como "roda-roda", um adolescente chegou a citar o nome do atirador [Wellington] quando a tarefa consistia em eliminar outros participantes.

"Teve um dia que um aluno foi chutar um sapato e o outro disse: chuta o sapato do Wellington!", relatou Oliveira. Um pano utilizado para cobrir os livros que estão sendo organizados gradativamente em uma das salas também já virou alvo de piadas. “Cuidado com o ‘lençol do Wellington’”, brincou um aluno.

"Tudo voltou ao normal", disse a professora de informática Roberta Oliveira. Segundo ela, os adolescentes que revisitaram as salas depois da reforma promovida pela Secretaria Municipal de Educação "não assimilaram o espaço à tragédia". "Os adultos acabam sentindo muito mais e passando isso para as crianças", complementou.

Salas de aula remodeladas

As salas nas quais 12 crianças foram brutalmente assassinadas pelo ex-aluno Wellington Menezes de Oliveira oferecem agora atividades educativas e aulas de informática.

As duas salas do primeiro andar da escola foram os principais pontos da força-tarefa organizada para "reinventar a escola", expressão constantemente utilizada pela secretária municipal de Educação, Cláudia Costin. A tinta branca que deu novo tom às paredes parece fresca, mas nos corredores ainda é possível identificar, com algum esforço, os locais atingidos por disparos.

Os computadores do laboratório de informática foram transferidos para o novo espaço, que ganhou também muitos livros e jogos de tabuleiro. Uma outra funcionária que ensinava um grupo de crianças a jogar damas diz que o trabalho para remodelar esses espaços escolares ainda não terminou. "Ainda há muita coisa a se encaixar", disse.

Tranquilidade

Do lado de fora da escola Tasso da Silveira, o clima era de normalidade nesta semana. Algumas turmas foram convidadas por uma rede de supermercados para uma sessão exclusiva da animação 3D "Rio" e seguiram para o local acompanhadas de professores e do diretor da instituição, Luis Marduk.

As aulas normais foram retomadas na última segunda-feira (2), mas os professores ainda não divulgaram datas de provas e outros detalhes referentes à continuidade do ano letivo. O assunto da tragédia ainda repercute na vizinhança, mas uma expressão comum a todos é "virar a página". O entorno do colégio também já não está mais completamente tomado por profissionais de imprensa e homens reforçando a segurança.

O controle de acesso na escola foi renovado e há funcionários recém-contratados específicos para a função nos três períodos (manhã, tarde e noite). Alguns homens da Companhia Municipal de Limpeza Urbana do Rio de Janeiro (Comlurb) ainda trabalham no interior da unidade educacional. Nesta semana, pelo menos no horário de entrada dos alunos da tarde, a reportagem do UOL Notícias não encontrou guardas municipais no entorno da escola Tasso da Silveira.

Vítimas hospitalizadas

Duas vítimas do massacre em Realengo continuam hospitalizadas, de acordo com o último boletim divulgado pela Secretaria Municipal de Saúde e Defesa Civil. Thayane Monteiro e Luan Vitor Pereira, ambos de 13 anos, apresentam quadro clínico estável. Ainda não há previsão de alta para ambos.

Há dois dias, Thayane foi transferida do CTI pediátrico para um leito da enfermaria do hospital Adão Pereira Nunes, em Duque de Caxias, na Baixada Fluminense. Até a última sexta-feira, ela estava em observação rigorosa, com quadro regular. A menina passou por mais uma intervenção cirúrgica há duas semanas para revisão de cavidade abdominal e recolocação de dreno.

Thayane, que foi baleada no abdômen e teve fratura exposta no braço esquerdo, já tinha sido operada duas vezes: para conter uma hemorragia na região do estômago e para retirar o projétil da coluna. A mãe da menina, Andrea Tavares, reclamou para a imprensa a respeito do tratamento que a filha tem recebido no hospital da Baixada Fluminense. Em entrevista à TV Globo, ela disse que um dos neurocirurgiões teria sido agressivo com a menina e dito que "ela não vai andar mais".

Em nota, o diretor do hospital, Manoel Moreira, afirmou que a paciente e sua família estão sendo informadas desde o início sobre a gravidade da lesão medular e possíveis sequelas geradas pelos tiros. Ele informou também que Thayane passará por outras avaliações e procedimentos, entre os quais sessões de fisioterapia, antes que um diagnóstico sobre a questão motora seja definido.

Já Luan, que fora baleado no olho direito, se recupera normalmente de uma cirurgia no local atingido. O adolescente deixou o CTI pediátrico do hospital Adão Pereira Nunes na última quarta-feira (27) e foi transferido para o Instituto Nacional de Traumatologia e Ortopedia (Into).

Missa

 

O arcebispo do Rio de Janeiro, Dom Orani, celebra neste sábado a missa de 30º dia em memória das 12 crianças assassinadas no massacre de Realengo. A missa será realizada às 19 horas, na capela Cristo Libertador, na rua Caminho da Bica, número 20. A capela fica perto da escola onde ocorreu o ataque.

Entenda o caso

No último dia 7 de abril, por volta de 8h30, Wellington Menezes de Oliveira entrou na escola Tasso da Silveira, em Realengo, dizendo que iria apresentar uma palestra. Já em uma sala de aula, o jovem de 23 anos sacou a arma e começou a atirar contra os estudantes.

Segundo testemunhas, o ex-aluno da escola queria matar apenas meninas. Wellington deixou uma carta com teor religioso, onde orientava como queria ser enterrado, e deixou sua casa para associação de proteção de animais.

O ataque, sem precedentes na história do Brasil, foi interrompido após um sargento da polícia, avisado por um estudante que conseguiu fugir da escola, balear Wellington na perna. De acordo com a polícia, o atirador se suicidou com um tiro na cabeça após ser atingido. Wellington portava duas armas e um cinturão com muita munição.

Doze estudantes morreram --dez meninas e dois meninos-- e outros 12 ficaram feridos no ataque.