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Moradores de Santa Teresa (RJ) querem indiciamento de secretário por acidente com bondinho

Acidente com bonde em Santa Teresa, no Rio, em agosto do ano passado, deixou seis mortos - Giuseppe Bizzarri/Folhapress
Acidente com bonde em Santa Teresa, no Rio, em agosto do ano passado, deixou seis mortos Imagem: Giuseppe Bizzarri/Folhapress

Do UOL, no Rio

09/05/2012 15h30

A Associação de Moradores e Amigos de Santa Teresa (Amast) criticou nesta quarta-feira (9) a denúncia oferecida pelo MP-RJ (Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro) que culpabiliza cinco funcionários da empresa que administra os bondinhos de Santa Teresa, bairro histórico do Rio, pelo acidente com um dos veículos, em agosto do ano passado. Na ocasião, seis pessoas morreram.

Foram denunciados por homicídio e lesão corporal culposa o motorneiro Gilmar Silvério de Castro, o engenheiro mecânico José Valladão Duarte, o chefe de manutenção Cláudio Luiz Lopes do Nascimento e os assistentes de manutenção Zenivaldo Rosa Corrêa e João Carlos Lopes da Silva. O MP constatou que houve negligência durante o processo de manutenção dos bondinhos.

Para a Amast, a ação proposta pelo Ministério Público culpabiliza o "lado mais fraco", já que isenta de responsabilidade o secretário estadual de Transportes, Júlio Lopes, que era o presidente da empresa responsável pelos bondes, a Companhia Estadual de Engenharia de Transportes e Logística (Central), na época do acidente. Caso condenados, os cinco funcionários do setor operacional da companhia poderão cumprir até dois anos de prisão.

"Há anos a Amast denuncia a falta de recursos para a manutenção adequada para a falta de sistema de bondes e isso não está na mão dos funcionários. Não são eles que provêm as condições e os recursos. São os gestores, e não os funcionários. Os funcionários são vítimas também", disse a presidente da associação, Elzbieta Mitkiewicz, à TV Globo.

Na página da Amast em uma rede social, os moradores de Santa Teresa também mostraram insatisfação com a decisão do MP. Eles chegaram a sugerir a organização de um protesto em frente à sede do órgão, no centro do Rio. "Para variar, quem paga o pato são os funcionários... Enquanto os manda chuvas saem ilesos e sempre mais ricos...", disse o morador Victor Farjalla. "Vamos protestar na porta do Ministério Público!", sugeriu André Barros.

"Revoltante o MP ter livrado a cara da cúpula da Sec de Transportes do Estado do Rio de Janeiro aceitando a sua alegação de que eles [o governo] não tinham conhecimento da precariedade do sistema. Como se durante anos a AMAST, o CREA, a sociedade civil através da imprensa, de audiências públicas e, especialmente, através de ações judiciais denunciaram a politica deliberada de sucateamento privatização?", afirmou o morador Álvaro Braga.

Os membros da associação lembraram ainda que, antes do acidente, o governo estadual já era obrigado a restaurar o sistema de bondes elétricos de Santa Teresa através de uma determinação judicial expedida pela 20ª Vara Cível da capital.

Em função de seu cargo no governo estadual, o que lhe garante foro privilegiado, Lopes está sendo investigado em um inquérito aberto pela Procuradoria-Geral de Justiça, em setembro do ano passado, para apurar o caso. O processo corre em sigilo. De acordo com a assessoria da Secretaria Estadual de Transportes, Júlio Lopes não vai se pronunciar sobre o caso.

A denúncia do MP

Segundo a denúncia ajuizada pela titular da 5ª Promotoria de Justiça de Investigação Penal, Janaína Marques Corrêa, o veículo acidentado (bonde nº 10) foi entregue ao motorneiro Nelson Correa da Silva, uma das vítimas fatais do acidente, que o conduziu em diversas viagens durante o período da tarde.

Às 15h do dia 27 de agosto do ano passado, ocorrera uma batida entre o bonde e um ônibus de passageiros na rua Joaquim Murtinho, em direção à Estação Carioca.

O motorneiro prosseguiu com o bonde até a estação para o desembarque dos passageiros, retornando ao local da batida para a confecção do boletim de registro de acidente de trânsito (BRAT). Enquanto isso, o primeiro denunciado, o maquinista Gilmar de Castro, assumiu o veículo dirigindo-se, em tese, para a garagem dos bondes.

Porém, Gilmar passou a permitir o embarque de passageiros e a realizar o trajeto padrão de tráfego. Ele não levou o bonde para a garagem e o entregou ao condutor Nelson, próximo ao local da primeira colisão.

Após a troca de condutores, em direção à Estação Carioca e pouco tempo depois de ser colocado em movimento, o sistema de freios do bonde falhou no declive da rua Joaquim Murtinho, resultando no descarrilamento, em velocidade acentuada, em local de curva até a colisão com um poste e o tombamento do veículo. Além das seis vítimas fatais, 48 pessoas ficaram feridas.

Peritos do Instituto de Criminalística Carlos Éboli (ICCE) apontaram diversos problemas de manutenção no bonde, que não apresentava condições de segurança para os usuários. Segundo a análise pericial, vários foram os fatores que concorreram para o acidente, sendo a causa determinante a falha no sistema de freios do bonde.

Dentre os problemas constatados e relacionados à falta de manutenção, estavam a falta de procedimento de drenagem dos cilindros, o desgaste do compressor e peças remendadas de forma grosseira.

De acordo com o Ministério Público, anotações registradas no livro de manutenção da oficina de bondes demonstravam que o veículo acidentado apresentava problemas crônicos no sistema de frenagem, sendo a frequência dos reparos realizados desproporcional se comparado com a das demais composições e insuficiente para solucionar os problemas verificados.

Uma declaração registrada na apuração dos fatos aponta que o bondinho em questão "apresentava problemas nas sapatas que precisavam ser trocadas com muita frequência, pois eram de má qualidade".