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Para ministra, tom de brincadeira em clipe supostamente racista "só agrava a situação"

Renata Tavares

Do UOL em Uberlândia

10/05/2012 20h23

A ministra da Secretaria de Políticas de Promoção da Igualdade Racial, Luiza Helena de Bairros, considera que o fato de as imagens do clipe de divulgação da música “Kong”, do cantor Alexandre Pires, ser em tom de brincadeira “agrava ainda mais a situação”. A Procuradoria Geral da República de Uberlândia (MG) investiga denúncia de suposto racismo na música.

“É preciso considerar que a figura do macaco tem sido, historicamente, a mais utilizada para inferiorizar, desumanizar a pessoa negra, particularmente o homem. É disto que se trata o racismo - de desumanização”, afirmou a ministra à reportagem do UOL.

A ministra citou casos recentes, como a discriminação de um músico em um show de humor em São Paulo, da atendente de um cinema em Brasília, “sem contar o que acontece frequentemente com jogadores de futebol e outros atletas negros”.

“O fato de as imagens do videoclipe passarem um clima de brincadeira só agrava mais a situação”, acrescentou. Na opinião de Luiza de Bairros, no Brasil “há uma tendência de que o racismo seja praticado com máscara de brincadeira inocente”, o que dificulta a percepção de quem é discriminado e livra a prática da reprimenda social.

“Este caso nos obriga a lidar com certo 'jeitinho brasileiro' de manter o racismo existindo sem, no entanto, responsabilizar pessoas ou instituições por atitudes racistas”, disse.

A denúncia de racismo referente ao videoclipe, que conta com a participação do jogador Neymar e do funkeiro Mr. Catra, de homens fantasiados de gorilas e mulheres seminuas próximas a uma piscina, foi encaminhada à Ouvidoria Nacional da Igualdade Racial, pelo Observatório do Racismo Virtual. O documento defende que o clipe tem conteúdos “comprometem as lutas do movimento negro na superação do racismo e no movimento das mulheres na superação do sexismo”. 

Luiza Bairros explicou que, além do Ministério Público Federal, também receberam os ofícios a gravadora Sony Music, a Polícia Federal e as ouvidorias da Secretaria de Políticas para as Mulheres. “Cabe ao Ministério Público Federal convocar os envolvidos e decidir se há conteúdo racista no videoclipe ou não”.

Até o momento, o procurador da república Frederico Pelucci, responsável pelo caso, ouviu apenas o cantor Alexandre Pires. Segundo a assessoria de imprensa do Ministério Público Federal, o caso ainda está em processo de apuração e não há previsão de quando os demais envolvidos serão convocados para prestar depoimento. 

Em nota, o cantor disse que se sentia profundamente chocado com qualquer leitura racista ou sexista no videoclipe. “Não me consta que meu histórico deixe alguma dúvida sobre o meu respeito à mulher ou ao negro, e a edição deste filme em nenhum momento faz brotar qualquer insinuação similar”.

A Ouvidoria Nacional da Igualdade Racial contabiliza a abertura de procedimentos administrativos referentes a 254 denúncias de racismo apresentadas entre janeiro de 2011 e março de 2012. Segundo a ministra, todas as denúncias foram encaminhadas aos órgãos competentes para análise e providências cabíveis. “Geralmente, o acompanhamento dos casos é feito até o momento da propositura da ação judicial ou do arquivamento da denúncia”.

Sobre o cenário brasileiro com relação à discriminação racial, Luiza Bairros disse que “ainda há muito que andar”. “Mas o cenário atual é de crescente consciência de que temos que mudar as mentalidades. Temos que abrir o acesso a oportunidades para todos os grupos raciais.”