Fim de lixão preocupa catadores, que chegaram a ganhar R$ 100 por dia nos "tempos áureos"
Positiva do ponto de vista ambiental, a desativação do lixão de Gramacho, no Rio de Janeiro, é motivo de preocupação para mais de mil catadores que trabalham no local. Alguns chegavam a ganhar R$ 100 por dia antes do início do processo de desativação.
Nos "tempos áureos” de Gramacho, na década de 90, o número de catadores alcançava os 5.000; atualmente não passa de 1.800. Ao todo, 1.719 estão cadastrados para receber a indenização da Prefeitura do Rio no valor de R$ 14.847 para cada um, segundo a Comlurb (Companhia Municipal de Limpeza Urbana).
O catador Geraldo da Silva Oliveira, 59, viveu grande parte da sua vida no lixão. “Eu vi a rampa [área destinada ao despejo do lixo] começar e agora terminar. Foram quase 40 anos”, conta.
fim do lixão de Gramacho, no Rio
“Quando fiquei desempregado, vim para cá e me senti adotado pelo lugar. Eu não cato lixo, eu cato material para ser reciclado”, afirma Oliveira, que diz gostar de trabalhar em Gramacho.
Segundo a Associação dos Catadores do Aterro Metropolitano do Jardim Gramacho (ACAMJG), os catadores retiram cerca de 200 toneladas de materiais todos os dias, o equivalente ao montante produzido por uma cidade de 400 mil habitantes.
Todo este material recolhido configura um arranjo produtivo que se formou no entorno do aterro no bairro de Jardim Gramacho, em Duque de Caxias (Baixada Fluminense). Esta cadeia movimenta a economia dos 15 mil moradores da região.
O fluxo de caminhões, porém, vinha diminuindo nos últimos tempos. No passado, mil circulavam todos os dias pelo lixão, o maior a céu aberto da América Latina. Desde 2011, quando começou o processo de desativação de Gramacho, o fluxo de caminhões de lixo caiu pela metade.
“Na época das vacas gordas, eram três rampas e vinha lixo de Copacabana, Botafogo, de todo o Rio e era um lixo de primeira qualidade. Hoje acabou. O dinheiro que eu ganhava daqui pagava a minha autonomia. Eu tirava entre R$ 60 e R$ 90. Hoje, tiro R$ 25”, conta Oliveira.
O veterano catador já encontrou cordões de ouro, celulares ainda em bom estado, roupas novas, panela de pressão e até moedas estrangeiras, como dólar e gourdes (do Haiti), que carrega consigo como recordação até hoje. “As pessoas jogam fora muitas coisas boas”.
R$ 100 por dia
A catadora Simone da Conceição Batista, 35, trabalha há 11 anos no lixão e diz que agora vai “tentar arranjar um serviço fora”. Ela conta que foi trabalhar em Gramacho pela dificuldade de arrumar emprego. Simone já era mãe solteira e tinha que sustentar seus dois filhos, hoje com 11 e 14 anos.
“Não escondo que sou catadora do aterro, não tenho vergonha, somos guerreiras. O trabalho é pesado, a gente trabalha debaixo de sol e chuva. Já me machuquei, já peguei micose na pele, pneumonia, e vi gente perder a perna ou morrer em acidente aqui”, relembra.
Em 10 horas seguidas de trabalho, Simone diz que conseguia retirar por dia cerca de R$ 100. “Eu pego o que dá para reciclar e reutilizo tudo. Reciclar é bom para não prejudicar o meio ambiente.”
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