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Contra incêndios, moradores da favela do Moinho em SP derrubam muro de contenção

Camila Macial

Da Agência Brasil, em São Paulo

04/08/2013 13h28Atualizada em 04/08/2013 17h27

Uma rota de fuga para os moradores da favela do Moinho, localizada sob o Viaduto Orlando Murgel no centro da capital paulista, foi feita neste domingo (3) com a derrubada de parte de um muro de contenção, com cerca de 3 metros de altura, que circunda a comunidade. Pretende-se que eles tenham pelo menos mais uma forma de sair da favela, especialmente em caso de incêndio. Atualmente, existe apenas uma saída da comunidade, pela qual é preciso passar pelos trilhos de linha de trem.

Cerca de 400 famílias moram na área, segundo a associação comunitária. A comunidade foi atingida por dois grandes incêndios nos anos de 2011 e 2012. No primeiro incêndio, 1,2 mil famílias ficaram desabrigadas e duas pessoas morreram  e no do ano passado, pelo menos uma morte foi registrada e mais 300 pessoas perderam suas casas.

De acordo com a líder comunitária Alessandra Moja, 29, o muro foi construído após o primeiro incêndio com a justificativa de que seria por medida de segurança. "Existia um prédio do outro lado do muro, que também estava ocupado, e foi esse prédio que pegou fogo. Falaram que era preciso construir, porque iam demolir o prédio", explicou. Hoje, no entanto, ela considera que o muro é um dos principais fatores de insegurança para os moradores. "O Corpo de Bombeiros já deu um laudo [dizendo] que se pegar fogo no começo da comunidade, morre todo mundo queimado".

O trabalho de derrubada começou por volta das 11h30. Com marretadas, os moradores abriram as primeiras passagens. Cerca de meia hora depois, a Polícia Militar chegou ao local com cerca de 20 homens. Segundo os policiais responsáveis pela operação, que não quiseram gravar entrevista, eles receberam um chamado pelo 190 e foram ao local verificar a denúncia. A chegada da PM, que adentrou na comunidade com carros em velocidade, provocou apreensão na comunidade.

Alessandra apresentou uma liminar conseguida na Justiça em março deste ano que autoriza a prefeitura a derrubar o muro. "Ficaram de quebrar em julho, mas não fizeram e não deram resposta. Derrubar não é ilegal. Ilegal é ele estar aí", criticou. Ela disse que o ato de derrubada do muro feito hoje, além de ser emergencial pela segurança da comunidade, é também uma forma de pressionar o Poder Público por outras melhorias importantes, como a implantação de um sistema de água e esgoto. Após dialogar com moradores, a polícia deixou o local.

Para as lideranças da comunidade, a área tem grande interesse do mercado imobiliário, pois está situada em um terreno valorizado da região central. "A gente também tem direito à cidade. Não é porque somos pobres que temos que viver na periferia. Aqui, a gente tem trabalho, escola, creche, posto de saúde. Moro aqui há 18 anos, não são 18 dias", disse Alessandra.

A mesma opinião é compartilhada pela moradora Josefa Flor da Silva, 62 anos, que vive há 12 anos no Moinho. "O que querem mesmo é tirar a gente daqui. Pobre não pode morar em lugar bom", disse. Apesar de a justificativa apresentada para a construção do muro ter sido a segurança da própria comunidade por causa da demolição, ela acredita que a real motivação era garantir que o terreno do prédio não seria novamente ocupado. "Primeiro fizeram de madeira e depois subiram o muro. Passei por dois incêndios e nada mudou aqui".

Alessandra explica que a proposta de ocupação da área que é isolada pelo muro será apresentada amanhã pela comunidade na primeira reunião do grupo de trabalho (GT) formado pelas famílias do Moinho e por órgãos da gestão municipal, entre eles a Secretaria de Habitação (Sehab), a Subprefeitura da Sé, a Secretaria de Relações Governamentais (SMRG) e a Secretaria de Desenvolvimento Urbano (SMDU).

A prefeitura informou, por meio de nota, que é preciso aval dos laudos dos órgãos envolvidos para derrubar o muro, são eles: Companhia de Saneamento Básico do Estado de São Paulo (Sabesp), Eletropaulo e Corpo de Bombeiros e disse que a prefeitura e o Corpo de Bombeiros fizeram uma vistoria no local na última quarta-feira (31) para estudar a abertura de rotas de fugas na favela.

Segundo o governo municipal, o processo de desocupação da favela do Moinho teve inicio em 2012, após o primeiro incêndio. Na época, foram cadastradas 810 famílias e, desse total, cerca de 50% recebem auxilio-moradia e aguardam as unidades definitivas. Foram oferecidas moradias definitivas na Ponte dos Remédios, na Lapa, cujas obras estão em andamento.

Ainda não há uma definição sobre a destinação a ser dada para a área, que hoje é ocupada pelas famílias. O terreno, que é 100% cercado por trilhos, é titulado em nome da União. A rede ferroviária atualmente é operada pela Companhia Paulista de Trens Metropolitanos (CPTM) e, segundo a prefeitura, não há nenhuma utilização viável para a área que não seja para atividades decorrentes do funcionamento do sistema.