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Após morte de adolescente em UPP, Beltrame recebe prêmio por 'pacificação'

O secretário de segurança do Rio, José Mariano Beltrame (segundo à esquerda) recebeu uma medalha do Instituto Mudando o Final - Fábio Guimarães/Agência O Globo
O secretário de segurança do Rio, José Mariano Beltrame (segundo à esquerda) recebeu uma medalha do Instituto Mudando o Final Imagem: Fábio Guimarães/Agência O Globo

Paula Bianchi

Do UOL, no Rio

01/10/2015 17h44

Dois dias após a morte do adolescente Eduardo Felipe Santos Victor, 17, baleado por policiais militares da UPP (Unidade de Polícia Pacificadora) da Providência na última terça-feira (29), o secretário de Segurança do Estado do Rio de Janeiro, José Mariano Beltrame, foi premiado em uma cerimônia que exultou o trabalho de policiais de UPPs. O Instituto Mudando o Final, que apoia projetos sociais nas comunidades pacificadas, distribuiu medalhas a “policiais militares e civis que se dedicaram exaustivamente ao processo de pacificação das favelas do Rio”.

A medalha lembra o prêmio de saneamento concedido pela Comissão de Desenvolvimento da Câmara dos Deputados ao governador de São Paulo, Geraldo Alckmin (PSDB) na semana passada, anunciado durante a maior crise hídrica da história de São Paulo. 

Durante a cerimônia no Rio, no entanto, não foi feita nenhuma menção a Eduardo - cuja morte foi registrada inicialmente como morte em decorrência de intervenção policial, até que um vídeo feito por moradores desmentiu a versão oficial -, ou qualquer um dos outros casos de violência envolvendo policiais de UPPs ocorridos no Estado nos últimos meses. Em vez delas, os oradores se revezavam tecendo elogios à atuação dos policiais.

Beltrame disse apenas que “dificuldades” não serão capazes de abalar o projeto, iniciado em 2008 durante o governo de Sérgio Cabral, que também foi homenageado, mas não compareceu à cerimônia. “Podem falar o que quiserem, os números estão melhores, os índices estão melhores. Vocês estão salvando vidas. Daqui dez, 15 anos, vocês vão notar que participaram de uma grande mudança”, afirmou à plateia, formada majoritariamente por policiais, muitos deles armados com fuzis e pistolas.

Os dois únicos comandantes de UPPs premiados foram o capitão Alexandre Lima Ramos, da UPP Alemão, e o capitão Jean Carlos Sanches, da Vila Cruzeiro, duas das favelas da cidade que mais sofrem com os constantes tiroteios entre PMs e traficantes.

O ano de 2015 não tem sido fácil para os responsáveis pela segurança pública do Rio de Janeiro. Logo em janeiro, uma sucessão de casos com vítimas de bala perdida levantou questionamentos. Três meses depois, um menino de dez anos foi baleado na cabeça, na porta de casa, no Complexo do Alemão, onde há uma UPP (Unidade de Polícia Pacificadora).

Segundo testemunhas, a bala que matou Eduardo de Jesus Ferreira saiu da arma de um PM. Em depoimento à Divisão de Homicídios, o policial afirmou ter efetuado disparos no dia em que a criança foi atingida, pois havia um suposto confronto com traficantes. A corporação afastou oito dos 11 militares que participaram da ação.

A morte trágica de Eduardo gerou críticas à política de segurança do Estado e teve repercussão internacional, assim como o caso do médico Jaime Gold, assassinado a facadas em tentativa de assalto na ciclovia da Lagoa Rodrigo de Freitas, em maio, na zona sul carioca.

No fim do primeiro semestre, o Rio teve uma sucessão de roubos violentos, nos quais os criminosos, principalmente adolescentes, esfaqueavam as vítimas. Meses depois, os frequentadores das praias da zona sul carioca voltaram a temer os arrastões. Em resposta, o Estado decidiu antecipar a Operação Verão, na qual mais de 1.000 agentes de segurança e assistentes sociais são designados para conter a violência nas praias.

Presidente do Mudando Vidas, Ludmila Rocha minimizou a morte de Eduardo e disse não ver problema em realizar a premiação nesta quinta-feira (1). “É um processo”, afirmou. “Acho excelente que a gente possa valorizar as boas condutas. Não podemos generalizar. O projeto (das UPPs) está acima das pessoas.”

Segundo dados do ISP (Instituto de Segurança Pública do Rio), a três meses do fim do ano, o Rio de Janeiro já possui mais casos de mortes causadas por policiais do que o acumulado em todo o ano de 2013. De janeiro a agosto desse ano, a Polícia Civil registrou 459 ocorrências do tipo nas delegacias do Estado. Em 2013, de janeiro a dezembro, o mesmo indicador foi de 416 vítimas.

(Colaborou Hanrrikson de Andrade)