'Quero olhar no olho dele', diz mãe de mulher morta no CE; viúvo é suspeito

A contadora Kaianne Bezerra, de 35 anos, morreu por esganadura e asfixia, segundo laudo obtido pelo UOL com a família da vítima. A mulher foi morta na casa onde morava no bairro Planalto do Sol, em Aquiraz (CE), na noite de 26 de agosto. O viúvo da vítima, o professor de inglês Leonardo Chaves, foi preso suspeito de encomendar a morte da mulher.

O que aconteceu

A família de Kaianne soube nesta terça-feira (11) que a contadora morreu por asfixia mecânica e esganadura — e não por uma paulada na cabeça como pensavam anteriormente. A família teve acesso ao atestado de óbito de Kaianne, que descreve a causa da morte.

A advogada da família acredita que o laudo altera o que se sabia sobre o crime. "Hoje, para nossa surpresa, [soubemos que] a causa da morte foi asfixia mecânica e esganadura, o que muda totalmente a dinâmica do crime", disse a advogada criminalista Fernanda Cavalcante.

A investigação quer saber quem asfixiou Kaianne. "Reviravolta, tudo novo, a linha de investigação aponta que como ela não morreu com a paulada, alguém teria finalizado o ataque. Resta saber quem. Não descartamos o envolvimento do Leonardo, também, no momento da morte", disse Fernanda.

Leonardo Nascimento Chaves teria encomendado a morte da própria esposa, Kaianne Bezerra; câmeras flagraram Leonardo encontrando os dois suspeitos de torturarem e matarem a vítima
Leonardo Nascimento Chaves teria encomendado a morte da própria esposa, Kaianne Bezerra; câmeras flagraram Leonardo encontrando os dois suspeitos de torturarem e matarem a vítima Imagem: Reprodução/Redes Sociais

O crime

Kaianne foi feita refém na casa onde morava pouco depois das 21 horas do dia 26 de agosto, por dois homens. Na primeira versão sobre o crime, o marido havia sido rendido na calçada por um homem e um adolescente armados. O motorista de aplicativo Adriano Andrade Ribeiro e o adolescente foram detidos. O marido teria escapado com ferimentos.

As investigações apontaram, porém, que Leonardo se encontrou com os suspeitos uma hora antes do crime. Adriano e o adolescente chegaram a um shopping perto da casa da vítima e entram em uma sorveteria. Cerca de 20 minutos antes de a dupla entrar no estabelecimento, Leonardo também havia chegado ao local.

Quando Leonardo passa em frente à sorveteria novamente, ele é seguido pela dupla. Os três ficam 11 minutos conversando no estacionamento. "Prova por A mais B que houve esse encontro. Aí, no novo depoimento, eles [a dupla] confessam a autoria do crime e a participação do marido da vítima", disse o delegado Gustavo Pernambuco, diretor da Polícia Judiciária do Ceará.

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Leonardo (de amarelo) foi flagrado conversando com o adolescente (de blusa vermelha) e o motorista de aplicativo, Adriano (de camiseta azul), no estacionamento. As imagens foram veiculadas pelo Fantástico (TV Globo).
Leonardo (de amarelo) foi flagrado conversando com o adolescente (de blusa vermelha) e o motorista de aplicativo, Adriano (de camiseta azul), no estacionamento. As imagens foram veiculadas pelo Fantástico (TV Globo). Imagem: Reprodução/TV Globo

Na ocasião, Leonardo teria combinado o momento em que jogaria água nas plantas fora de casa, quando deveria ser abordado pelos criminosos. As câmeras da residência estariam desligadas.

No dia do crime, câmeras da rua flagraram Leonardo regando plantas na calçada com o portão aberto, quando é abordado pela dupla que matou Kaianne e poupou a vida dele. "Ele foi encontrado supostamente amarrado, com algumas agressões, mas longe da vítima, em outro ambiente da residência." Depois do crime, a dupla roubou objetos de valor e fugiu com o carro da contadora.

Segundo a investigação, Leonardo entrou com Adriano no quintal, enquanto o adolescente foi para o quarto do casal, onde Kaianne estaria do lado da cama. Depois, Leonardo teria pedido para ser agredido pelos dois em outro quarto nos fundos da casa. E, como combinado, gritou por socorro 35 minutos depois do crime.

Kaianne tinha contratado um seguro de vida de R$ 60 mil dois meses antes de ser morta, o que —segundo as investigações— teria motivado o marido a encomendar o crime.

Último contato

A mãe de Kaianne, que preferiu não se identificar, disse que conversou com a filha minutos antes de ela ser assassinada, por meio de uma rede social. Ela estranhou quando Kaianne parou de digitar.

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Falamos até umas 9 da noite e, de uma hora pra outra, ela parou de teclar. Mal sabia que nunca mais falaria com a minha filha, provavelmente já estava sendo friamente assassinada.
Mãe de Kaianne

Ela estava feliz, me contando algumas novidades, me explicando como usar um novo produto para malhação que ela tinha adquirido. Imaginei que ela estivesse ocupada, não quis atrapalhar. Esperei, ela não retornou, fui dormir. Fiquei tranquila, porque ela já estava segura dentro de casa. Mal sabia que nunca mais falaria com a minha filha. Na hora em que ela parou de teclar, provavelmente, já estava sendo friamente e cruelmente violentada até a morte.
Mãe de Kaianne

A mãe também falou que nunca imaginou que o genro, que tinha um relacionamento ótimo com todos da família, fosse capaz de tamanha crueldade. "Estou em luto duas vezes, tinha ele como um filho. Quero olhar no olho dele, ficar cara a cara, e perguntar por que ele fez isso com a minha filha. Ele me chamava de mãe", diz.

A irmã mais nova de Kaianne, que também não se identificou, conta que a família inteira está com medo, e teme que os suspeitos saiam da cadeia.

Estou em choque, desenvolvi pânico, não tenho mais vontade de fazer nada. Não sei como será daqui pra frente sem a minha irmã. Eles eram os meus pais adotivos. Eu era muito nova quando a Kaianne começou a namorar o Leonardo. Eu não saía da casa deles. A minha irmã fazia tudo pela família.
Irmã de Kaianne

Como era o relacionamento

O casal estava junto havia 12 anos e não tinha filhos. Segundo relatos da família, os dois se relacionavam muito bem e faziam planos de morar fora do país.

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A mãe de Kaianne conta que a filha começou a achar estranho o fato de o marido gastar dinheiro de forma desproporcional. Ela não entendia por que Leonardo vivia pedindo dinheiro emprestado aos familiares, já que a renda do casal era de aproximadamente 18 mil reais mensais.

Kaianne morava em Aquiraz, no Ceará; casal estava junto havia 12 anos
Kaianne morava em Aquiraz, no Ceará; casal estava junto havia 12 anos Imagem: Arquivo pessoal

A advogada da família acredita que ele estava endividado com jogos eletrônicos, e devendo a agiotas, o que pode ter motivado o desespero em levantar dinheiro a qualquer custo. "A investigação apontou que Kaianne tinha dois seguros de vida, um pela empresa, e outro pessoal, imaginamos que isso poderia ter sido a causa de ele ter planejado a morte da própria esposa", disse a advogada. A soma era de 60 mil reais, segundo aponta a investigação.

Luciano Moura Bezerra, tio de Kaianne, diz que desconfiou do depoimento de Leonardo à polícia. "Ele enganou a todos. Não queria investigação, não queria mídia, queria cremar o corpo da minha sobrinha, tudo muito estranho."


Dias antes de ser preso, Leonardo planejava deixar o país com destino a Portugal, segundo a mãe de Kaianne. Ela disse à reportagem que a viagem dos sonhos do casal estava planejada havia meses. "Agora entendo que até essa viagem, já estava programada nos planos dele, premeditando em fugir depois de matar a minha filha".

Kaianne e Leonardo: caso foi inicialmente tratado como latrocínio (roubo seguido de morte)
Kaianne e Leonardo: caso foi inicialmente tratado como latrocínio (roubo seguido de morte) Imagem: Arquivo pessoal

O que diz a defesa

Por meio de nota, a defesa de Leonardo afirmou que ele é "vítima de grave crime que lhe é falsamente imputado". A defesa diz ainda que colabora com a autoridade policial e que confia na Justiça. Os advogados do adolescente e do outro acusado não se apresentaram oficialmente na delegacia.

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