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Exceção na Europa, França mantém alta taxa de natalidade; entenda como

Presidente francês François Hollande segura um bebê ao chegar a um hospital de Paris - Philippe Wojazer/AFP
Presidente francês François Hollande segura um bebê ao chegar a um hospital de Paris Imagem: Philippe Wojazer/AFP

Do UOL, em São Paulo

14/07/2015 06h00

O baixo índice de nascimento de bebês afeta vários países da Europa, como Alemanha e Dinamarca, e gera preocupação pela perspectiva de queda do número de pessoas ativas no mercado de trabalho ou até mesmo de redução do número geral de habitantes. Não é o caso da França, já há algum tempo, por vários motivos.

De acordo com o Eurostat (Departamento de Estatísticas da União Europeia), a França fechou 2013 com um índice de 1,99 filho por mulher, perdendo apenas para a Turquia (2,08) e em um cenário consideravelmente mais favorável que Alemanha (1,40), Itália (1,39), Espanha (1,27) e Portugal (1,21). Esse índice, atualizado a cada ano com o número de nascimentos no período, enfrenta na França uma ligeira queda –chegou a ser de 2,03 em 2010–, mas ainda assim deixa os vizinhos europeus bem para trás.

Outra taxa positiva dos franceses apareceu em um estudo divulgado no último mês de maio pela empresa de auditoria alemã BDO em conjunto com o Instituto de Economia Internacional de Hamburgo (HWWI): o país teve 12,7 nascimentos a cada mil habitantes nos últimos cinco anos, contra 8,2 da Alemanha –que, segundo a pesquisa, tem o pior índice do mundo.

Incentivo financeiro e herança cultural

O valor de incentivos financeiros recebidos pelas famílias francesas, concedidos pela assistência social, ilustram o esforço do poder público para manter os índices altos e ajudam a explicar por que a população local não considera ter filhos uma má ideia.

Caso cumpram os pré-requisitos, que incluem um teto para o rendimento mensal familiar, os pais recebem diferentes benefícios a partir do momento que têm um filho –como um bônus de 923 euros logo após o nascimento (que dobra ou triplica em caso de gêmeos ou trigêmeos, respectivamente) e uma quantia de 184 euros (mensal e válida até que a criança complete três anos) para complementar os custos. Após a chegada da criança ao período escolar, dos 6 aos 18 anos, os pais podem se inscrever para receber outra ajuda, que vai até 395 euros, destinada a complementar os cursos com a educação.

Apesar dos benefícios servirem de estímulo para as mulheres engravidarem, eles não excluem aqueles que decidem adotar uma criança. Pelo contrário: o bônus recebido por quem amparar um menor desabrigado chega a 1.846 euros.

Outros benefícios aos pais incluem uma licença maternidade mais bem remunerada para mulheres que têm um terceiro filho, auxílio no pagamento a babás e cuidadores (que recebem formação específica através da assistência social) e creche gratuita em período integral.

“Na França há essencialmente duas preocupações. O governo quer que as mulheres estejam no mercado de trabalho –porque precisa delas, sobretudo das mais qualificadas– e não quer elas reduzam o número de filhos que têm”, disse a francesa Jeanne Fagnani, especialista em políticas de família na França, em entrevista ao jornal português “Público”, em junho. “A França não quer que aconteça o que acontece na Alemanha, onde as mulheres dizem: ‘Terei um filho e vou para casa cuidar dele’.”

A consequência desse cenário é a mulher não desistir da ideia de ter mais um filho em virtude de sua presença no mercado de trabalho, que poderia ficar ameaçada caso ela dedicasse maior tempo e esforço para cuidar da criança.

Segundo a analista demográfica Laurent Toulemon, em entrevista ao jornal inglês “The Guardian” em março, o francês também possui ideias mais flexíveis em relação ao conceito de família do que em outros lugares do mundo. “No Japão [outro local que sofre com o baixo índice de natalidade], por exemplo, o ‘pacote família’ envolve muitas restrições. Uma mulher entrando nesse relacionamento precisa aceitar também o casamento, obedecer seu marido, ter um filho, parar de trabalhar depois do nascimento e abrir lugar para seus sogros idosos. É um caso de tudo ou nada”, exemplifica.

“Na França, ou na Escandinávia [região onde a taxa de natalidade fica em 1,8 filho por mulher], as normas familiares são bem mais flexíveis, com casamentos tardios, famílias reconstruídas, divórcios, pais solteiros e muito mais filhos fora do casamento. As pessoas estão menos preocupadas com a imagem de sua família como ‘instituição’”, alega Toulemon.