Após atentados, Europa endurece debate sobre recepção dos refugiados

Cécile Ducourtieux e Jean Pierre Stroobants

  • Robert Michael/AFP

    Três dias após ataques, movimento anti-imigração reuniu 10 mil pessoas na Alemanha

    Três dias após ataques, movimento anti-imigração reuniu 10 mil pessoas na Alemanha

Muitos países e partidos europeus não hesitaram em confundir refugiados com terroristas após os atentados de 13 de novembro, sendo que mais de 800 mil migrantes atravessaram o Mediterrâneo para chegar até a Europa este ano, 80% deles através da Grécia. Jean-Claude Juncker, o presidente da Comissão Europeia, alertou contra tais comparações no domingo, paralelamente à cúpula do G20 em Antalya, na Turquia, lembrando que "os responsáveis pelos ataques de Paris são criminosos e não refugiados ou requerentes de asilo". Os atentados de Paris, no entanto, deverão levar a um endurecimento do debate europeu sobre os imigrantes e sobre a regulação do espaço Schengen de livre circulação.

Os "falcões" (ala belicista), que questionam a política de acolhimento da União Europeia em relação aos refugiados, começaram a se manifestar já no sábado. O novo ministro polonês dos Assuntos Europeus, Konrad Szymanski, afirmou que seu partido conservador Direito e Justiça (PiS), que chegou ao poder no início de novembro, poderia reconsiderar o acordo do governo liberal, que se comprometeu a receber 7.500 imigrantes dentro do plano europeu de cotas.

"A Polônia acolherá refugiados se houver garantias de segurança, e estas estão sendo questionadas após os atentados de Paris", ele comentou. O novo ministro das Relações Exteriores, Witold Waszczykowski, foi ainda mais longe: "Devemos abordar de uma maneira diferente a comunidade muçulmana, que odeia este continente e quer destruí-lo."

Discurso moderado está fragilizado

No final de setembro, a Polônia havia aceitado cumprir sua parte no plano europeu de realocação temporária de 160 mil requerentes de asilo que chegavam pela Itália e pela Grécia. Foi esse sinal verde de Varsóvia que permitiu que países "grandes" e a Comissão impusessem esse mecanismo de solidariedade em toda a União Europeia, apesar da recusa dos mais reticentes (Eslováquia, Hungria etc.). O primeiro-ministro eslovaco, Robert Fico, também fez a associação entre imigrantes e os atentados de Paris, no sábado, e comemorou o fato de que seu país tenha se recusado a participar do mecanismo de realocação temporária. Na Holanda, o dirigente de extrema-direita Geert Wilders disse que "nossas fronteiras devem ser fechadas agora."

A posição dos "moderados", como Angela Merkel, criticada por sua própria maioria, é ainda mais frágil pelo fato de que não estão funcionando as soluções europeias propostas nos últimos meses para administrar o fluxo de imigrantes ao mesmo tempo em que se respeitam as convenções internacionais sobre o asilo e os valores europeus de abertura.

Os raros "hot spots" (centros de identificação) em operação na Grécia estão sobrecarregados. A maior parte dos refugiados que recebem a proposta de realocação a recusam, preferindo a Alemanha ou a Suécia. No máximo algumas dezenas aceitaram o país designado.

"Não vejo necessidade de modificar nossa abordagem geral", explicou Juncker durante o G20. Mas com esse clima parece difícil para a Comissão esperar impor seu polêmico projeto de um mecanismo permanente de realocação, sugerido no início de setembro. Os franceses, por sua vez, já estavam muito cautelosos quanto à realocação de 160 mil refugiados (sendo 30 mil para a França), e até o momento evitaram demonstrar um apoio aberto à "Willkommen Politik" (política de boas-vindas) da chanceler.

Em compensação, a questão do reforço das fronteiras externas da UE, já no coração do debate, se tornará ainda mais urgente nos próximos dias. Bruxelas prevê apresentar um projeto de guarda de fronteiras europeias até o final deste ano, uma vez que a Grécia se revela incapaz de administrar sozinha o fluxo de imigrantes que chega a seu litoral.

O mesmo vale para a necessidade de se encontrar o mais rápido possível um acordo com a Turquia, onde se refugiaram 2,2 milhões de sírios, para convencê-la a frear ao máximo a partida deles para a Grécia. Os europeus estariam dispostos a pagar 3 bilhões de euros para Ancara e a acelerar a concessão de vistos para os cidadãos turcos. Eles aceitaram a possibilidade de realização de uma cúpula entre UE e Turquia, talvez no dia 29 de novembro, em Bruxelas.

Reunião extraordinária

Os ataques de Paris, afinal, podem acabar dando um golpe definitivo contra o espaço Schengen de livre circulação tal como ele existe hoje. A incapacidade dos europeus de administrarem coletivamente a crise dos imigrantes já o está minando por todos os lados.

O presidente Hollande anunciou, já na noite de sexta-feira, que seriam reativados os controles nas fronteiras, algo que de qualquer forma já seria feito na ocasião da COP21. E no domingo o ministro do Interior, Bernard Cazeneuve, pediu a seus colegas europeus que "efetuem controles sistemáticos e coordenados nas fronteiras externas da União Europeia, através de uma revisão selecionada do código de fronteiras Schengen."

O intuito seria autorizar controles sistemáticos dos cidadãos europeus que estejam retornando à União Europeia após temporadas no exterior. Os ministros do Interior dos 28 Estados-membros devem se encontrar em uma reunião extraordinária, na sexta-feira (20), em Bruxelas.

A Alemanha, que havia reintroduzido um controle temporário em suas fronteiras no início de setembro, também havia anunciado, na sexta-feira, algumas horas antes dos atentados de Paris, que ela o prorrogaria até fevereiro de 2016, para "conter" o fluxo de imigrantes. Logo em seguida a República Checa e a Eslováquia adotaram medidas similares, e também a Áustria, cujo governo também anunciou, na sexta-feira, que instalaria uma cerca em sua fronteira com a Eslovênia, algo inédito no espaço Schengen.

Tradutor: UOL

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