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Pesticidas causam curto-circuito nas abelhas, mostra estudo europeu

Circuitos de aprendizagem dos cérebros das abelhas param de funcionar quando elas são expostas a pesticidas encontrados em flores, afetando a memória dos insetos - Joe Klamar/AFP
Circuitos de aprendizagem dos cérebros das abelhas param de funcionar quando elas são expostas a pesticidas encontrados em flores, afetando a memória dos insetos Imagem: Joe Klamar/AFP

Em Paris

28/03/2013 10h36

Pesticidas usados para proteger cultivos podem embaralhar os circuitos cerebrais das abelhas melíferas (produtoras de mel), afetando sua memória e sua capacidade de navegação, necessárias para encontrar comida, alertaram cientistas.

Segundo artigo publicado na revista científica Nature Communications, isso poderia ameaçar colônias de abelhas inteiras, cujas funções polinizadoras são vitais para a produção de comida para nós, humanos.

A equipe de cientistas estudou os cérebros de abelhas produtoras de mel no laboratório, expondo-as a pesticidas neonicotinoides usados em lavouras, e a organofosfatos, o grupo de inseticidas mais usado no mundo (neste caso, o coumafos), inclusive, para controlar infestações de ácaros em colmeias.

Segundo os cientistas, quando expostos a concentrações similares dos dois pesticidas encontradas na natureza, os circuitos de aprendizagem nos cérebros das abelhas logo param de funcionar.

"Juntas, as duas classes de pesticidas demonstraram ter um efeito negativo maior no cérebro das abelhas e que podem inibir o aprendizado das abelhas produtoras de mel", explicou um dos coautores do estudo, Christopher Connolly, do Instituto de Pesquisa Médica da Universidade de Dundee, no Reino Unido.

"As polinizadoras têm comportamentos sofisticados enquanto se alimentam, que exigem que aprendam e se lembrem de tratos florais associados à comida", acrescentou sua colega, Geraldine Wright, do Centro de Comportamento e Evolução da Universidade de Newcastle, no Reino Unido.

"A interrupção desta importante função tem implicações profundas na sobrevivência de colônias de abelhas produtoras de mel, porque as que não conseguem aprender não conseguirão encontrar comida", emendou.

A descoberta foi feita em meio a um intenso debate sobre o uso continuado de neonicotinoides. Há duas semanas, países europeus rejeitaram uma proposta de proibição por dois anos do grupo de inseticidas que atinge o cérebro, depois da oposição da indústria agroquímica.

Apicultores da Europa, da América do Norte e de outras partes do mundo estão preocupados com o chamado distúrbio de colapso das colônias, um fenômeno no qual as abelhas adultas abruptamente desaparecem das colmeias - algo que tem sido atribuído a ácaros, vírus e fungos, pesticidas ou a uma combinação desses fatores.

As abelhas são 80% dos insetos polinizadores de plantas. Sem elas, muitos cultivos seriam incapazes de frutificar ou, então, teriam de ser polinizados a mão.

Os cientistas afirmam que suas descobertas podem levar a uma reavaliação do uso de pesticidas.

"Nossos dados sugerem que o uso amplo de coumafos, como acaricida, é um risco desnecessário para a saúde das abelhas melíferas", afirmou Connolly, que propôs o uso de ácidos orgânicos para o controle de ácaros nas colmeias.

Em termos de pesticidas para a proteção de cultivos, a indústria agroquímica argumenta que alternativas aos neonicotinoides seriam mais tóxicas para as abelhas.

"Uma comparação direta das alternativas parece ser o único caminho" para encontrar a opção menos nociva, afirmou o cientista.

Comentando o estudo, Francis Ratnieks, professor de apicultura da Universidade de Sussex, disse que as concentrações usadas na pesquisa pareciam altas.

"Não surpreende que altas concentrações de inseticidas sejam nocivas, mas não sabemos se os baixos níveis de inseticidas neonicotinoides no néctar e no pólen de plantas tratadas também são nocivos no mundo real", acrescentou.

Além disso, o uso de coumafos é ilegal em grande parte da Europa e não é amplamente usado nos Estados Unidos, afirmou Ratnieks, citado pelo Science Media Centre, em Londres.

Na quarta-feira (28), apicultores franceses pediram ao Ministério da Agricultura a proibição de pesticidas neonicotinoides, enquanto a CE (Comissão Europeia) analisa a adoção de uma norma específica sobre o caso.

"A situação é catastrófica", disse Henri Clément, porta-voz dos apicultores franceses, afirmando que a taxa de mortalidade das abelhas passou de 5% na década de 1990 para 30% atualmente, o que provocou uma redução dramática na produção de mel na França, para 16 mil toneladas.

Clément se reuniu com os legisladores, aos quais pediu apoio ao seu apelo pela proibição dos neonicotinoides, e pediu a criação de um "comitê de apoio a alternativas aos pesticidas".

Este ano, a CE já propôs a suspensão do uso de três produtos neonicotinoides nas culturas de milho, canola, girassol e algodão, pois eles contribuem para uma alta notável na mortalidade das abelhas.