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Grupo da Unesp combate praga de baratas que 'roem' índios com isca caseira

José Bonato

Do UOL, em Ribeirão Preto (SP)

04/10/2013 11h20

Pesquisadores da Unesp (Universidade Estadual Paulista) de Botucatu, a 238 km de São Paulo, desenvolveram uma "fórmula caseira" para minimizar os ataques de baratas contra índios que vivem em reservas nas regiões Centro-Oeste e Norte do país.

Os insetos da espécie Blattella germanica "roem" a pele dos índios enquanto eles dormem à noite, segundo grupo relata em artigo no Jornal Internacional de Dermatologia. Eles mordiscam a pele, atraídas pela queratina, e costumam também penetrar no nariz, nos ouvidos e na boca dos indígenas.  É que as baratas se alimentam de fezes, couro, sangue e outros tipos de material orgânico. 

Em razão disso, expõem a saúde dos índios ao risco de doenças, explica Wilson Uieda, 60, professor do departamento de zoologia da Universidade. Além de feridas, o contato dos bichos pode iniciar um quadro infeccioso leve nos 250 indígenas das etnias Apterewa Kayap e Matododakwa Enawen e-naw-e, que vivem em reservas em Altamira (PA) e Brasnorte (MT). 

Fórmula caseira

A isca, que é produzida com queijo ralado, farinha de trigo, cebola, açúcar e ácido bórico, deu resultado em dois dias: segundo Uieda, o chão das moradias ficou repleto de baratas mortas nesse tempo. 

Responsável pela matança da praga, o ácido bórico administrado em baixas quantidades não é tóxico para as pessoas, segundo o pesquisador, tanto que é utilizada em colírios e pomadas para micose. Mas a mistura caseira foi colocada nas partes altas das ocas, entre a madeira e as palhas, para evitar o contato com crianças e animais. 

O pesquisador conta que, inicialmente, a fórmula caseira foi recebida com desconfiança pelos índios. Mas o sucesso do resultado, em uma das reservas indígenas, foi comemorado com festa pelos silvícolas.

Para matar as baratas, o ácido costuma normalmente ser misturado com cerveja e depositado em tampinhas de refrigerante espalhadas pelo solo. "Mas como não é permitido entrar nas aldeias com álcool, achamos essa solução com a farinha, o queijo, a cebola e o açúcar."

Uieda afirma que as baratas invadiram as aldeias indígenas devido à presença do homem branco. Os animais são parecidos com as baratas caseiras (Periplaneta americana), mas de tamanho menor.

Para ele, a infestação das baratas nas aldeias também ocorreu por razões culturais. Ele conta que os nativos são indiferentes à presença dos insetos e não possuem consciência dos danos causados pela transmissão de infecções ou pela destruição de seus alimentos. O fato de viverem em reservas ambientais, afirma Uieda, é outro entrave, pois restringe a entrada e o uso de métodos poluentes.

Cada ovo depositado pelas baratas dá origem a 32 novos insetos. Portanto, em condições favoráveis, apenas uma barata pode gerar 100 mil indivíduos no período de um ano, calcula Uieda.

Procurada pela reportagem, a Sesai (Secretaria Especial de Saúde Indígena), ligada ao Ministério da Saúde, não quis se manifestar sobre o problema nas reservas indígenas.

Segundo Vidal Haddad Junior, dermatologista da Unesp que assina o trabalho em parceria com Uieda, os insetos podem, eventualmente, causar asma e infecções nos seres humanos, mas isso não foi constatado nos índios, apenas os ferimentos na pele.

Haddad diz que a experiência com os índios permitiu descrever corretamente as causas das feridas na pele. "As descrições anteriores eram muito antigas. Eliminamos que os ferimentos tenham como causa picadas de insetos, sarna e outras doenças que poderiam ser confundidas com as mordidas."

Em caso de mordidas dos insetos, o médico apenas recomenda lavar as lesões com água e sabão.  Para eventuais casos de infecção, sugere o uso de pomadas antibióticas.