Governador de SP posa com fuzil, e especialistas veem medida eleitoreira

Leonardo Martins

Do UOL, em São Paulo

  • Divulgação/Facebook Márcio França

    Márcio França posa com fuzil em propaganda eleitoral

    Márcio França posa com fuzil em propaganda eleitoral

O candidato à reeleição ao governo de São Paulo, Márcio França (PSB), comentou em uma de suas propagandas eleitorais pelas redes sociais na última quinta-feira (27) medida aprovada recentemente por ele como governador que amplia o uso de fuzis de alta precisão pela polícia militar do estado. O equipamento, agora, pode ser utilizado por policiais para patrulhamento preventivo nas ruas. Anteriormente, esse tipo de armamento era usado apenas por unidades de ronda ostensiva ou em operações específicas da polícia.

"Autorizamos todos os sargentos aqui em São Paulo, todas as viaturas, junto com fuzil .556, de alta precisão, porque os bandidos precisam saber o que está dentro das viaturas", disse França em vídeo.

"Isso [a liberação dos fuzis] já produziu muitas reações no Estado de São Paulo positivas. Os bandidos fugiram, nós conseguimos evitar o crime com o armamento pesado que a polícia de São Paulo tem que ter", completou o governador. Nos vídeos, ele não apresentou nenhum estudo técnico que embasasse a medida.

No mesmo evento em que divulgou a adoção da medida, França prometeu aumentar o salário dos policiais em 25%, mas sem estipular tempo para cumprir a promessa.

Não é a primeira vez que o governador acena à classe policial. França homenageou, em maio, a policial Katia Sastre, candidata a deputada federal pelo PR, após a cabo ter matado um criminoso na porta de uma escola em São Paulo. Além disso, escolheu a coronel da PM Eliane Nikoluk (PR) como vice em sua chapa.

"Polícia não pode ser política", diz especialista

Especialistas em segurança pública consultados pelo UOL discordam da eficácia da medida do governo. Para eles, Márcio França aprovou o uso de fuzis para utilizar em suas propagandas eleitorais e não divulgou nenhum estudo técnico para justificar a ação.

Rafael Alcadipani, professor de gestão pública da FGV (Faculdade Getúlio Vargas), diz não ser contra a utilização de fuzis em situações que demandem o armamento, como roubos a banco e confrontos diretos com o crime organizado, já que os policiais militares são bem treinados. Porém, diz o docente, o problema é a forma e o momento em que esse tipo de ação entra em vigor.

"[França] Não pode entrar em uma instituição do Estado, e não do governador, e tirar benefício próprio para sua campanha política a uma semana da eleição. É inaceitável utilizar uma coisa pública para benefício eleitoral. Polícia não pode ser política", afirma.

Para Samira Bueno, diretora do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, o problema pode ser maior.

"Isso tem o potencial para ser desastroso. Para aprovar uma medida como essa você tem que ter uma justificativa técnica que embase, senão, gera-se uma falsa sensação de liberdade. Além disso, dá margem para que aquele tipo de armamento poderoso, que não circula muito em São Paulo, tenha maiores riscos de ser desviado".

Gilberto Marques/Divulgação
Márcio França (PSB) entrega flores à cabo Katia Sastre

"Utilizar fuzis para fazer ronda e patrulhamento ordinário é uma grande bobagem. Boa parte das soluções que precisamos não passam por aumentar poder de armas de fogo, mas essa é uma resposta muito mais simples, rápida e eleitoreira", complementa.

Bruno Langeani, gerente do Instituto Sou da Paz, diz que, mais do que uma estratégia eleitoral, a ação aumenta o risco de tiroteios e balas perdidas que podem tirar vidas de civis.

"No dia a dia, as ocorrências que demandam a utilização de um fuzil são minoritárias. Utilizar em todas as ocorrências aumenta a chance de confronto policial, estimula tiroteios, são balas que atravessam pessoas, paredes e até carros dependendo da distância".

No primeiro semestre deste ano, segundo levantamento do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, policiais do Estado de São Paulo mataram 415 pessoas em confrontos diretosO valor representa uma queda de 9,5% no número de mortes em relação ao mesmo período do ano passado.

O TRE-SP (Tribunal Regional Eleitoral de São Paulo) determinou no sábado (29), horas depois da publicação da reportagem, que Márcio França excluísse três vídeos de suas redes sociais em que aparece nas unidades da Polícia Militar de São Paulo. 

Segundo o juiz Celso Afonso da Silva, " houve o uso de bens móveis e imóveis pertencentes à Administração Pública, além de funcionários públicos, em proveito da candidatura do Sr. Márcio França", atitude vedada pela Lei das Eleições. 

Para ouvidor das polícias, governador deve investir em prevenção

Benedito Mariano, ouvidor das polícias de São Paulo, explica que o aumento da segurança se dá quando a polícia atua na prevenção dos crimes, chegando antes dos criminosos efetuarem o ato, e não no flagrante. "A polícia em São Paulo é uma das mais equipadas do país, equipamento não é o problema", endossa.

Para Mariano, os fuzis devem ser utilizados em situações de confronto direto com o crime organizado, como roubos a bancos. "O armamento pesado não vai diminuir os índices de violência no Estado, pelo contrário, pode aumentar a violência letal até contra os próprios policiais".

"É uma reposta de apoio aos policiais", diz França

O governador Márcio França, por meio de sua assessoria de imprensa, negou que use a aprovação da medida como pauta política. "É uma reposta de apoio aos policiais. Como tenho feito nesses cinco meses. Na homenagem à policial que reagiu ao assalto na escola e nos elogios aos bons policiais", afirmou. 

França também endossou que o uso de fuzis por sargentos da Polícia Militar "é uma prática já autorizada e empregada" e que, com o uso de fuzis, "já foi possível reduzir os índices de criminalidade".

"Nossa Polícia Militar tem que inibir e dissuadir a ação dos bandidos mostrando que tem armas potentes para enfrentá-los. Risco é deixarmos a polícia e a população indefesas", ressalta. 

Questionado pela reportagem, o governador não respondeu se há algum estudo técnico que justifique a liberação de fuzis para patrulhamento preventivo nas ruas.

França aparece em terceiro lugar nas principais pesquisas de intenção de voto para o governo de SP. No Datafolha divulgado nesta sexta (28), ele tem 14%, atrás de João Doria (PSDB), com 25%, e Paulo Skaf (MDB), com 22%. A margem de erro é de dois pontos percentuais, para mais ou para menos.

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