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Em 1º discurso sobre mensalão pós-condenação, João Paulo Cunha cita Mandela e ataca Barbosa

Do UOL, em São Paulo

11/12/2013 16h48Atualizada em 11/12/2013 18h33

No primeiro discurso sobre o mensalão depois de ter sido condenado pelo STF (Supremo Tribunal Federal), o deputado federal João Paulo Cunha (PT-SP) defendeu-se das acusações que resultaram na sua condenação, citou o líder sul-africano Nelson Mandela, fez referência a trechos da "Bíblia" e desferiu críticas ao presidente do Supremo e relator da ação do mensalão, ministro Joaquim Barbosa.

O discurso, na tarde desta quarta-feira (11) na tribuna da Câmara dos Deputados, durou mais de 40 minutos e foi recheado de citações à Bíblia e referências às dificuldades da família do petista no passado. O deputado apareceu na Casa para divulgar uma revista --intitulada “A Verdade - Nada mais que a verdade sobre a ação penal 470”-- em que rebate as acusações pelas quais foi condenado no STF.

PENAS DO MENSALÃO

  • Arte/UOL

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Cunha afirmou que, no julgamento do mensalão, “há réus que foram condenados sem provas e outros que foram condenados contra as provas”, e que ele se encaixaria nesse segundo grupo.

Sobre Barbosa, o deputado sustentou que o presidente do Supremo “trabalha com informações seletivas” e ignorou provas e documentos que o inocentariam. Um dos exemplos citados por Cunha diz respeito aos contratos de publicidade assinados por ele enquanto era presidente da Câmara, pelos quais foi condenado por peculato e corrupção passiva.

Cunha foi condenado por corrupção passiva e peculato por, no entendimento do STF, aceitar R$ 50 mil de propina do grupo de Marcos Valério --o operador do mensalão-- em troca de contratos entre a agência SMP&B com a Câmara dos Deputados em 2003, época em que ele presidia a Casa, no valor de R$ 17,7 milhões.

Já a condenação por lavagem de dinheiro diz respeito à tentativa de Cunha em esconder a origem dos R$ 50 mil, ao enviar sua mulher para retirar o montante em uma agência do Banco Rural em Brasília.

De acordo com o petista, os contratos foram assinados antes de sua gestão na Casa. O parlamentar citou relatório definitivo do TCU (Tribunal de Contas da União), auditoria da Câmara e inquérito da Polícia Federal atestaram sua inocência, mas Barbosa se apegou um relatório feito por um secretário da Câmara em 2005 e por um relatório parcial do TCU com recomendações à Cunha.

“O ministro Joaquim Barbosa dá as costas para o relatório definitivo [do TCU]. É ou não é um ministro que trabalha com informações seletivas?”, criticou. “Ele se apega a um relatório feito em junho de 2005, pelo secretario de controle interno, colocado no cargo de modo ilegal e que tinha uma rixa entre o secretário interno [da Câmara]”, afirmou o deputado.

“Observem o que é o STF. A PF (Polícia Federal) disse que o único problema está no contrato com a empresa chamada IFT, que não prestou serviços para que foi contratada, e que no ‘contratão’ não há problema”, prossegue Cunha. “O que faz o ministro Joaquim Barbosa? No contrato com a IFT ele me absolve, e naquele que não há problemas ele me condena. Não é seletivo?”, questionou o parlamentar.

Cunha afirmou que todos os contratos assinados por ele são legais que o recursos repassados às empresas de Marcos Valério são resultantes de bônus de volume, tipo de bonificação praticado no mercado por empresas de publicidade e veículos de comunicação.

Cronologia do mensalão

  • Nelson Jr/STF

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Sobre o recebimento de R$ 50 mil, Cunha afirmou que sua mulher esteve na agência do Banco Rural para sacar o montante e que também pagou contas de TV a cabo no mesmo banco. Os R$ 50 mil, diz o deputado, não era dinheiro de propina, e sim para pagar pesquisas que ele fez em municípios da Grande São Paulo, região de sua atuação como parlamentar.

De acordo com o deputado, o dinheiro foi solicitado por ele ao ex-tesoureiro do PT Delúbio Soares, que teria acionado Marcos Valério.

Ao negar a existência de peculato (desvio de recursos mediante ação de agente público), Cunha desafiou o presidente do Supremo a descobrir para onde foi o dinheiro e ressarci-lo. "O ministro Joaquim Barbosa tem que dizer o que eu desviei. Ele não diz porque ele não sabe, porque não consegue. E mais, porque não existe."

Mandela e dor

Ao comparar-se com Nelson Mandela, morto na semana passada, Cunha disse que irá cumprir suas responsabilidades quando for preso. “Semana que vem pode ser decretada minha prisão. Ou daqui quatro ou cinco meses. Vou cumprir o tempo. Mandela cumpriu 27 anos, não saiu menos indigno que entrou. E antes de ir pra cadeia, Mandela pegou em armas.”

Segundo Cunha, a condenação no mensalão “não é uma dor” que irá lhe “carregar para o túmulo, para trás das trincheiras”. “É uma dor de sofrimento, aquela que você aprende e que dela você sai mais forte do que entrou”. 

Deputado ainda será julgado em 2014

Cunha foi condenado a 9 anos e 4 meses de prisão por corrupção passiva, peculato e lavagem de dinheiro no julgamento do mensalão. Ele não está preso porque a Suprema Corte ainda precisa analisar um recurso apresentado pela defesa do deputado.

Em 2014, a condenação por lavagem de dinheiro será revista, já que o parlamentar teve direito aos embargos infringentes, tipo de recurso que reabre o julgamento nas condenações com placar apertado (mínimo de quatro votos favoráveis ao réu). Se a condenação for mantida, Cunha cumprirá a sentença em regime fechado, já que a pena será superior a oito anos.

O Supremo Tribunal Federal já expediu mandados de prisão para 19 dos 25 réus condenados no julgamento. 

João Paulo Cunha era presidente da Câmara dos Deputados na época do escândalo do mensalão e foi condenado devido a contratos de publicidade entre a Câmara e o publicitário Marcos Valério, operador do mensalão. No julgamento de 2012, o Supremo entendeu que o deputado aceitou propina para assinar contratos fraudulentos com as empresas de Marcos Valério.

Antes de se pronunciar na tribuna do plenário, Cunha concedeu entrevista coletiva, na qual também citou Mandela e criticou Barbosa. Ele chegou a dizer, ironicamente, que é "mensaleiro de muitos anos".