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"Empresa que paga propina agora será punida", diz secretário da CGU

Carlos Higino: "Empresa tem que ver que a corrupção gera prejuízo" - Divulgação/CGU
Carlos Higino: 'Empresa tem que ver que a corrupção gera prejuízo' Imagem: Divulgação/CGU

Bruno Lupion

Do UOL, em Brasília

21/01/2014 06h00

A Lei Anticorrupção, que entra em vigor no próximo dia 29, mudará a relação entre empresas e poder público. Quem afirma é o secretário-executivo da CGU (Controladoria-Geral da União), Carlos Higino.

Companhias que oferecerem ou derem propina a servidores ou fraudarem licitações pagarão multas de até 20% do faturamento bruto anual. Isso fará os empresários concluírem que corrupção dá prejuízo, diz Higino, em entrevista ao UOL.

“Hoje os políticos flagrados em [atos de] corrupção perdem os mandatos e os servidores públicos vão presos, mas a empresa não sofre sanções. Agora temos como atacar não só o corrupto, mas também o corruptor”, diz.

Otimista, Higino afirma que o avanço institucional proporcionado pela nova lei, no combate à corrupção, será semelhante ao obtido pela Lei de Acesso à Informação no campo do acesso a dados públicos. “Antes o padrão era a opacidade, hoje é a transparência”, compara. 

A seguir, trechos da entrevista:

UOL - A Lei Anticorrupção entra em vigor no próximo dia 29. O país está pronto para aplicá-la?

Higino -  Há poucos aspectos da lei que ainda dependem de regulamentação por decreto [federal]. Um deles é como serão feitas as denúncias e que benefício a empresa terá com o acordo de leniência. A regulamentação também definirá em que casos a multa será reduzida ou ampliada. Esperamos que o decreto esteja pronto antes que a lei entre em vigor. Quanto à abertura dos processos e às multas, a lei é autoaplicável.

Há semelhanças entre a Lei Anticorrupção e a Lei de Acesso à Informação?

São duas leis aprovadas nos últimos quatro anos que mudam bastante o panorama da relação entre administração pública e cidadão.  A Lei de Acesso à Informação mudou a regra que era de opacidade para a regra da transparência. Dizia-se que tudo era opaco, que o cidadão não sabia o que acontecia no poder público, e isso começou a mudar.

Agora a Lei Anticorrupção toca num ponto muito criticado no Brasil, que é a posição do corruptor. Hoje a empresa costuma sair ilesa –os políticos flagrados em corrupção perdem os mandatos e os servidores públicos vão presos, mas a empresa não sofre sanções. É claro que as mudanças culturais demoram, mas isso vai acontecer. E a empresa tem que sofrer sanções econômicas, tem que ver que a corrupção gera prejuízo para ela. Teremos um instrumento para atacar não só o corrupto, mas também o corruptor.

Como o governo federal se adequará à lei?

Em âmbito federal há duas competências exclusivas da Controladoria-Geral da União: nos casos de suborno transnacional –quando uma empresa brasileira paga propina no exterior–, e nos acordos de leniência –quando a empresa envolvida na corrupção decide cooperar com a investigação e passa a desfrutar de benefícios.

Fora dessas duas hipóteses, a competência para instaurar procedimentos administrativos caberá a todos os ministérios e entidades. Por exemplo, se ocorreu problema com uma empresa contratada pelo Ministério da Saúde, o próprio ministro pode instaurar um processo de apuração lá. Se houver acordo de leniência, o processo vem para cá.  Em alguns casos, a CGU poderá avocar [chamar para si] o procedimento, seja a pedido do ministério ou por se tratar de caso mais complexo. Minha opinião é que a CGU conduzirá apenas os processos que envolverem quantias mais relevantes.

E a aplicação da lei nos Estados e municípios?

A competência é concorrente. Os Estados e municípios podem regulamentar os processos administrativos em suas esferas, dentro dos limites da lei. Nossa expectativa é que essa regulamentação tenha linhas gerais parecidas em todo o Brasil. Mas a União não pode forçar os Estados a seguir uma mesma linha.

As empresas temem que cada Estado defina um procedimento diferente...

Nossa preocupação é que a gente não tenha uma diversidade muito grande de regulamentações. Isso poderia provocar instabilidade entre Estados e municípios. Queremos uma parceria, um diálogo com todos os entes, para que tenhamos linhas gerais parecidas.

A falta de regulamentação pelos Estados prejudica a aplicação da lei?

Sim. Temos mantido contato com o setor privado. As emprestas têm que ter clareza do que vai acontecer em casos de corrupção. As multas são pesadas, podem chegar a até 20% do faturamento bruto. Por ser uma punição alta, o Estado que deixar essa regulamentação em aberto pode espantar as empresas. Se a empresa quiser entrar naquele Estado, contratar com o governo, mas não tiver ideia do que pode acontecer, pode desistir. Mas os Estados vão ser preocupar em regulamentar a lei. Hoje boa parte deles já tem órgãos de controle, com bons resultados.

Há risco de as empresas questionarem as multas na Justiça?

Haverá obviamente algumas contestações judiciais, mas acredito que empresas e autoridades públicas estarão interessadas em resolução célere dos casos. Todas as empresas têm o direito de acesso ao Judiciário, mas elas terão que fazer a opção em cooperar com a administração em um processo administrativo –que, nunca cansaremos de repetir, sempre deve respeitar a ampla defesa e o contraditório–, ao invés de ter seu nome associado a um processo judicial longo, que certamente será muito mais caro e causará desgastes ainda maiores à imagem da empresa.