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Collor só decidiu sair horas antes de julgamento, diz porta-voz de renúncia

José Moura Rocha que foi advogado do ex-presidente Fernando Collor de Mello e entregou sua carta de renúncia - Carlos Madeiro/UOL
José Moura Rocha que foi advogado do ex-presidente Fernando Collor de Mello e entregou sua carta de renúncia Imagem: Carlos Madeiro/UOL

Carlos Madeiro

Colaboração para o UOL, em Maceió

09/04/2016 06h00

Na manhã do dia 29 de dezembro de 1992, o advogado José Moura Rocha esteve no centro das atenções do país. Naquele dia, o Senado se reuniu para julgar o impeachment do então presidente Fernando Collor de Mello. Pouco antes do início da sessão, Moura Rocha pediu a palavra ao presidente da sessão -- o presidente do Supremo Tribunal Federal Sidney Sanches -- e leu a carta em que Collor anunciava sua renúncia.

Chegava ali ao fim o mandato de Collor, mas que não impediria a votação do impeachment, confirmado em votação horas após a leitura da carta. “Fiquei estupefato [com a decisão do Senado de seguir com o julgamento]”, disse Moura Rocha.

Carta de renúncia do então presidente Fernando Collor de Mello em 1992 - Reprodução - Reprodução
Carta de renúncia do então presidente Fernando Collor de Mello em 1992
Imagem: Reprodução

O espanto ocorreu porque, ao ler a carta, a defesa acreditava que o processo de impeachment seria extinto, o que evitaria a inelegibilidade de Collor. Mas o Senado decidiu seguir o julgamento, que terminou com 76 votos a favor do afastamento e três contra.

Vinte e quatro anos depois, Moura Rocha recebeu a reportagem do UOL em sua casa, em um sítio de Maceió, e confidenciou que, apesar das pressões e conselhos durante todo o andamento do processo no Senado, a decisão de Collor de renunciar foi tomada somente às vésperas do julgamento, quando se convenceu de que não teria chance de escapar na votação. “Na noite anterior ele me chamou, falou e entregou a carta, na Casa da Dinda. A pus no bolso do colete e fui para casa”, disse.

Pensou antes de assumir

De poucas palavras, Moura Rocha lembra que não tinha aproximação com o ex-presidente: Não era aliado, nem inimigo. Lembra que, certo dia, tocou o telefone de sua casa com uma mulher do outro que o disse: “o presidente quer falar com o senhor”. “Presidente de quê, minha filha?”, questionou ele naquele momento, sem suspeitar até então que se tratava de Collor. “O presidente da República”, confirmou a telefonista.

O advogado conversou com Collor, que o pediu para ir a Brasília no dia seguinte. Ele conta que não aceitou de imediato a ideia de defender o presidente àquela altura. Decidiu consultar familiares e aliados políticos. “Aceitei a pedido de Geraldo Bulhões [ex-governador de Alagoas]”, disse. “Não me orgulho, nem me arrependo”.

Moura Rocha foi chamado para assumir a defesa de Collor menos de duas semanas antes da votação no Senado. Ele lembra que o então presidente decidiu destituir os advogados constituídos em uma estratégia para ganhar tempo.

Mesmo sendo o advogado de defesa, ele admite que não acreditava na absolvição de Collor no Senado. “Não tinha como, o povo estava todo contra”, cita.

O defensor evita fazer hoje uma análise da suposta inocência ou não de Collor. “Ficou mais ou menos definido que a saída foi decorrência de uma perua Elba. Foi o elemento concreto”, diz, citando que, além do argumento jurídico, o “isolamento político grande” foi determinante.

O advogado lembra que foi alvo de críticas por defender uma figura tão impopular. “Algumas pessoas falavam. Diziam que estava defendendo o indefensável”, lembra.

Mas nada o colocou medo em seguir na defesa. “Não me assustei. Fiquei admirado [com tanta gente na rua]. Na minha carreira, tive juris criminais em ambientes bem mais hostis, mais difíceis”, citou. "Mas aquele foi um processo de intensidade e velocidade vertiginosas”, lembra.