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Quem é Tia Eron? A deputada federal que decidirá o destino de Eduardo Cunha

Flávio Costa

Do UOL, em São Paulo

14/06/2016 06h00Atualizada em 14/06/2016 17h49

Na sessão do Conselho de Ética desta terça-feira (14), coube à deputada federal Tia Eron (PRB-BA), 44, um dos votos decisivos do parecer que pede a cassação do presidente afastado da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ).

Em discurso aos colegas de conselho, a deputada rebateu as críticas dos deputados sobre a ausência dela na última sessão da comissão e afirmou que os parlamentares "não mandam nessa 'nega' aqui".

"Respeito todos aqui presentes. Surpreende que os senhores [hoje] não me procuraram, nem sequer citaram meu nome, entenderam que de fato não mandam nessa 'nega' aqui. Nenhum dos senhores manda", afirmou.

Mais tarde, no momento da votação, ele votou favoravelmente ao parecer do relator Marcos Rogério (DEM-RO). "Não posso absolver o representado", disse.

Em pelo menos duas ocasiões, Tia Eron havia votado de acordo com interesses de Cunha: votou nele na eleição para a Presidência da Câmara, no início de 2015, e deu seu voto favorável à admissibilidade do processo de impeachment de Dilma Rousseff, na sessão do dia 17 de abril.

Para a deputada, sob a direção de Cunha, a Câmara "produziu como nunca". E acrescentou: "Claro que eu tenho de comemorar, isso é um grande ganho político para a população brasileira".

Apesar dessa concordância com Cunha, desde que os holofotes se voltaram para a deputada federal, ela se negou a indicar como votaria no Conselho de Ética. A parlamentar, inclusive, tem reclamado de pressão de parlamentares e da opinião pública sobre seu voto. Em suas redes sociais, eleitores têm deixado mensagens pedindo para que ela vote pela cassação de Cunha.

Fiel da Igreja Universal de Reino de Deus, com uma pauta parlamentar ligada aos direitos das mulheres e da população negra, a congressista foi a mulher mais votada entre os deputados federais eleitos pela Bahia, nas eleições de 2014, após três mandatos consecutivos como vereadora de Salvador.

Por ter supostamente cometido improbidade administrativa, ela é ré em uma ação civil pública que tramita na 5ª Vara de Fazenda Pública da capital baiana e teve sua prestação de contas de campanha contestada pelo Ministério Público Eleitoral (leia mais abaixo).

Voto de Tia Eron será decisivo no processo contra Cunha

Band News

Publicamente, antes da votação do Conselho de Étrica,  eram 10 votos contrários contra nove votos favoráveis ao parecer do deputado federal Marcos Rogério (DEM-RO), cujo relatório recomenda a cassação do mandato de Cunha, por quebra de decoro parlamentar, ao mentir à CPI da Petrobras sobre a existência de contas no exterior em seu nome. 

Se Tia Eron votasse contra o parecer, ele seria arquivado. Neste caso, um novo relatório teria de ser aprovado pelo conselho para que o processo siga para o plenário. Segundo a Secretaria-Geral da Mesa da Casa, o presidente do Conselho de Ética, José Carlos Araújo (PR-BA), designará outro relator entre os deputados que votaram contra o documento. Esse parlamentar terá de apresentar, já na próxima reunião do colegiado, um novo parecer, que será colocado em votação.

Como Tia Eron votou a favor do parecer contra Cunha, havia expectativa de um empate de 10 a 10, e se assim for a questão será decidida pelo presidente do conselho, que já se posicionou a favor da cassação. "Ela não fala sobre o assunto com ninguém, mas me pareceu muito tranquila e segura do que irá fazer", disse o vereador de Salvador Isnard Araújo, colega de partido.

Na última sessão do Conselho de Ética, na terça-feira passada (7), a deputada federal se ausentou, o que estimulou especulações sobre seu comparecimento à sessão de votação. Ao UOL, sua assessoria de imprensa disse que ela somente "responderá a questionamentos após a votação do Conselho de Ética", mas confirmou que estará presente à sessão desta terça.

Onde está Tia Eron?, pergunta deputado no Conselho de Ética

UOL Notícias

Com nome civil de Eronildes Vasconcelos Carvalho, ela ganhou o apelido de Tia Eron, com qual entrou na vida política, quando era professora na EBI (Escola Bíblica Infantil), voltada para filhos de membros da Igreja Universal. Teve boas votações para vereadora de Salvador e recebeu quase 120 mil votos na campanha para deputada federal. Seu nome tem sido especulado para ser vice na chapa de reeleição do prefeito ACM Neto (DEM).

Na Câmara da capital baiana, Tia Eron presidiu a Comissão Permanente dos Direitos de Defesa da Mulher e se posicionou contra um projeto de lei municipal de combate à intolerância religiosa, um de seus muitos embates com ativistas do movimento negro. "Tivemos vários embates, apesar do respeito mútuo. Temos posturas políticas antagônicas, em diversos assuntos, a exemplo sua atuação na aprovação do PDDU do então prefeito João Henrique, antecessor de ACM Neto", disse a ex-vereadora Olívia Santana e atual secretária de Políticas para Mulheres do Estado da Bahia.

Apesar desses embates, segundo ex-colega de Câmara de Vereadores de Salvador que não quis se identificar, Tia Eron não teve uma grande atuação na Câmara, com pouca presença na tribuna. 

Ré em ação civil pública

Tia Eron e outros 30 vereadores são réus em uma ação civil pública na 5ª Vara Fazenda Pública de Salvador por suspeita de improbidade administrativa. Na denúncia do Ministério Público da Bahia, os vereadores são acusados de desrespeitar uma decisão judicial ao incluir irregularmente artigos no projeto de lei do PDDU (Plano Diretor de Desenvolvimento Urbano) de Salvador em outro projeto de lei -- a Lei de Ordenamento de Uso do Solo. O processo é de 2012.

"Tia Eron e outros vereadores realizaram uma manobra e desrespeitaram uma ordem judicial que era conhecida publicamente para aprovar um projeto repleto de ilegalidades", afirma a promotora Rita Tourinho, autora da ação.

Já a prestação de contas de campanha para deputada federal de Tia Eron foi reprovada pelo Ministério Público Eleitoral da Bahia, que apontou omissões e irregularidades na comprovação de despesas. No final de 2014, o TRE-BA (Tribunal Regional Eleitoral reconheceu as irregularidades, porém decidiu aprovar as contas com ressalvas.

Outro aspecto controverso de sua campanha é o fato de que cinco de seus doadores recebiam bolsas de estudo pagas pela Assembleia Legislativa da Bahia na condição de alunos "carentes", como informou o jornal "Folha de S.Paulo". Na época, a deputada disse que nunca fez parte da Assembleia e, por isso, não tinha ingerência sobre a concessão das bolsas.

Desde quinta-feira (9), o UOL tentou entrar em contato a deputada federal e enviou à sua assessoria de imprensa, no início da noite de sexta-feira (10), uma lista com 12 perguntas a serem respondidas por Tia Eron. Na tarde de segunda-feira (13), recebeu a seguinte resposta:

"A deputada só responderá questionamentos da imprensa após a votação do Conselho de Ética. Até porque todas as perguntas nesse momento estão em torno disso e ela quer evitar qualquer especulação em cima disso, diante de tanta repercussão".

A reportagem voltou a pedir à assessoria de imprensa que Tia Eron reconsiderasse, já que nem todas perguntas estavam relacionadas ao seu voto no Conselho de Ética, mas não recebeu respostas até a publicação desta reportagem.