Se a Constituição foi ferida, o Senado tomará as providências, diz Eunício sobre afastamento de Aécio
O presidente do Senado, Eunício Oliveira (PMDB-CE), declarou nesta quarta-feira (27) que a Constituição não prevê o afastamento de um parlamentar do mandato e que, se a Constituição tiver sido ferida pela decisão de ontem do STF (Supremo Tribunal Federal) sobre o senador Aécio Neves (PBSD-MG), caberá à Casa tomar "as providências".
Na terça-feira, a primeira turma do STF (Supremo Tribunal Federal) negou, por unanimidade, o pedido de prisão contra Aécio feito pela PGR (Procuradoria-Geral da República). No entanto, determinaram que Aécio seja afastado de suas funções parlamentares, entregue seu passaporte, não saia do país e permaneça em recolhimento noturno.
O senador também está proibido de entrar em contato com outros investigados no mesmo processo a que responde. O recurso pela prisão e pelo afastamento de Aécio foi apresentado durante o mandato do ex-procurador-geral Rodrigo Janot, que deixou o cargo na última semana. A nova procuradora-geral, Raquel Dodge, tomou posse no dia 18 deste mês.
“Primeiro, o Senado precisa ser notificado sobre o teor da decisão tomada pela Suprema Corte para saber de que forma o Senado vai agir. Se vai ou não vai agir. Eu não sei qual o teor da decisão e tenho o hábito de dizer que não falo sobre hipótese, só sobre atos concretos. Enquanto não receber a notificação do Supremo, não tenho como me manifestar [...] A Constituição não tem afastamento de mandato”, afirmou Eunício.
“A Constituição é bastante clara quanto a mandatos eletivos de deputados e senadores. A Constituição determina o que deve ser feito. [...] Se a Constituição foi ferida pela decisão e cabe ao Senado tomar a decisão baseado na Constituição, obviamente que vai tomar as providências. Agora, sobre hipótese não há como me manifestar”, acrescentou Eunício, mas sem falar sobre o episódio de Aécio em específico.
Questionado por jornalistas se houve uma interferência na esfera de atuação entre Poderes, Eunício preferiu não responder por não ter tido acesso aos autos da decisão do STF. Para que se dê prosseguimento à tramitação, o presidente do Senado ainda precisa ser notificado pela Corte, o que ainda não aconteceu, mas é esperado para esta quarta-feira.
Na avaliação de tucanos e outros senadores, como Renan Calheiros (PMDB-AL), a decisão representa um cerceamento de liberdade, uma prisão domiciliar noturna, e deve ser levada ao plenário do Senado para ser deliberada.
Isso porque, segundo a Constituição, um parlamentar só pode ser preso em flagrante por crimes inafiançável. Neste caso, o Senado seria notificado em até 24 horas para que a prisão fosse apreciada por meio de votação em plenário.
Questionado se vai levar o caso de Aécio Neves ao plenário do Senado, Eunício preferiu não revelar como vai agir.
Entenda as investigações contra Aécio
Aécio passou a ser investigado a partir da delação premiada de executivos da JBS. A Procuradoria aponta que o senador teria pedido R$ 2 milhões ao empresário Joesley Batista, um dos donos da JBS, para supostamente pagar seus advogados de defesa em casos relacionados à Operação Lava Jato.
O diálogo em que Aécio pede o dinheiro a Joesley foi gravado secretamente pelo empresário, que fechou acordo de colaboração premiada.
A Polícia Federal rastreou que parte desse valor foi entregue por um executivo da JBS ao primo de Aécio Frederico Pacheco de Medeiros, que repassou o dinheiro a Mendherson de Souza Lima, na época assessor do senador Zezé Perrella (PMDB-MG).
Frederico e Mendherson também são investigados e chegaram a ser presos, mas foram libertados pela mesma decisão do STF que revogou anteriormente a prisão de Andrea Neves. Os três estão em prisão domiciliar por decisão da 1ª Turma do Supremo.
Essa investigação levou à apresentação de denúncia contra Aécio por corrução e obstrução de Justiça e à instauração de um novo inquérito contra o senador para apurar suspeitas de corrupção e lavagem de dinheiro, também a partir das investigações iniciadas com a delação da JBS.
A denúncia por obstrução da Justiça contra Aécio se baseia em ligações telefônicas interceptadas pela Polícia Federal, com autorização do STF, durante as investigações.
A PGR afirma que Aécio, por meio de uma série de contatos com o diretor-geral da PF, Leandro Daiello,"deixou clara a sua intenção de interferir" para que a investigação sobre irregularidades na licitação da Cidade Adminstrativa de Minas Gerais ficasse com "um delegado específico" na corporação. A PGR destaca que, apesar das tentativas do senador, o responsável não foi trocado.
A denúncia da Procuradoria cita ainda o telefonema de Aécio ao ministro do STF Gilmar Mendes, "numa atitude inusual", para que convencesse o senador Flexa Ribeiro (PSDB-PA) a votar a favor do projeto de lei de abuso de autoridade. Segundo Janot, Aécio usou seu mandato "não apenas para se proteger das investigações da Operação Lava Jato, mas também para barrar o avanço do Estado na descoberta de graves crimes praticados pelas altas autoridades do país, num verdadeiro desvio de finalidade da função parlamentar."
O que diz Aécio
Desde o início das investigações, Aécio tem negado todas as acusações contra ele. Seu advogado, Alberto Zacharias Toron, afirmou, em nota, à época da denúncia que a defesa do senador “refuta integralmente” o teor da acusação apresentada pela PGR e disse ver uma “inexplicável pressa” da Procuradoria em apresentar a acusação, oferecida antes de o senador ser ouvido para prestar esclarecimentos.
Ainda segundo Toron, a conversa entre Aécio e Joesley trata do oferecimento da compra de um imóvel da família do senador, recusada pelo empresário da JBS que, em troca, teria oferecido um empréstimo pessoal a Aécio. O advogado diz que o diálogo não indica suspeitas de nenhum crime e que os próprios delatores da JBS afirmam não ter sido beneficiados pela atuação de Aécio no Senado.
Sobre a acusação de obstrução à Justiça, Toron afirma que a PGR busca “criminalizar o livre exercício de legislar, pois, em termos simples, não gostou do modo de votar do senador Aécio Neves”, diz a nota.
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