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Ex-contadora de Youssef diz que fez acordo com PF na Lava Jato para não ser denunciada

Meire Poza presta depoimento ao juiz Sergio Moro - Reprodução/Justiça Federal do Paraná
Meire Poza presta depoimento ao juiz Sergio Moro Imagem: Reprodução/Justiça Federal do Paraná

Bernardo Barbosa e Daniela Garcia

Do UOL, em São Paulo

01/12/2017 20h31

Ré em processo da Operação Lava Jato, a contadora Meire Poza, que prestou serviços para o doleiro Alberto Youssef, afirmou em interrogatório nesta sexta-feira (1º) ao juiz Sergio Moro que, apesar de não ter feito delação premiada, tinha um acordo com autoridades para que não fosse denunciada por crimes que cometeu. A contrapartida seria sua colaboração com as investigações do esquema de corrupção. 

Meire revelou à Polícia Federal como Youssef lavava dinheiro para empreiteiras, inclusive com documentos. Neste processo, ela é acusada de ter usado duas empresas de sua propriedade para emitir notas fiscais, a pedido de Youssef, simulando prestação de serviços. A operação teria como intuito esconder a transferência de R$ 2,4 milhões para o ex-deputado federal André Vargas e seu irmão, o empresário Leon Vargas. Os dois também são réus no processo. 

UOL questionou a Superintendência da Polícia Federal no Paraná e o MPF (Ministério Público Federal) no Estado sobre o teor das declarações de Meire Poza, mas não recebeu resposta até o horário da última atualização deste texto. 

Questionada por Moro sobre por que não fechou um acordo de colaboração premiada apesar de passar informações sobre crimes à Polícia Federal, a contadora afirmou que ouviu do delegado Márcio Anselmo, ex-integrante da força-tarefa da Lava Jato na PF, que sua palavra teria mais peso como testemunha do que como delatora. Meire disse que chegou a negociar uma minuta de delação com o MPF.

"Quando eu saí de lá com essa minuta de delação, de acordo de colaboração premiada, e conversei com o doutor Márcio, ele me disse o seguinte: se eu fizesse um acordo, eu seria uma ré colaboradora. E que isso teria um peso muito diferente do que se eu fosse uma testemunha", disse. "E ali foi feito nosso acordo, excelência. O nosso acordo foi o seguinte: eu seria testemunha, tanto é que eles cumpriram a parte deles até 2014, 2015, 2016, isso tudo foi cumprido. Que eu não seria denunciada, que eu não teria nenhum tipo de problema."

Meire disse ter estado três vezes no Ministério Público e que "sempre foi dito" que ela não teria "nenhum tipo de problema". Segundo a contadora, seu objetivo era ajudar a Operação Lava Jato.

"Perdão judicial"

Meire relatou que criou uma conta de e-mail para passar informações à PF. Depois, passou a participar de um grupo de WhatsApp com Anselmo e Rodrigo Prado, outro policial federal.

"Nos falávamos 24h por dia, sete dias por semana. Eles tinham uma carga de trabalho muito grande", disse. "Nessas mensagens, eles faziam perguntas, tiravam dúvidas. Eu tirava foto de algum documento para o doutor Márcio."

A contadora afirmou que "abriu mão da sua vida" a partir de julho de 2014 para prestar uma série de depoimentos à PF de Curitiba.

"Eu vinha e ficava [em Curitiba] de terça a sexta-feira. Eu devo ter prestado mais de 100 depoimentos", afirma.

No depoimento a Moro, Meire se emocionou ao lembrar que teve dificuldades financeiras para ir a Curitiba. "Quando eu não tinha mais dinheiro para vir de avião e ficar hospedada para Curitiba, eu vinha de carro e fazia bate e volta", afirmou, com a voz embargada.

Meire acusou Anselmo --que deixou a PF no Paraná no começo de 2017 e hoje trabalha no Espírito Santo-- de ter feito a promessa de que ela não seria denunciada, devido às informações prestadas.

"O doutor Márcio me disse: 'Se alguém te denunciar, eu vou pedir o seu perdão judicial'. E ele é uma pessoa de credibilidade absurda [na operação]", disse.

Segundo ela, Anselmo também teria feito duas orientações que a prejudicaram. Meire relata que o coordenador da operação na PF, Igor Romário de Paula, teria oferecido a ela uma escolta policial e que entrasse no programa de proteção à testemunha. Ela afirma que Anselmo teria dito para negar ambas as ofertas, porque "era tranquilo" e nada iria acontecer contra ela. 

"Infelizmente, não foi verdade. Porque incendiaram o meu escritório [em março de 2016]. Acabou mesmo a minha vida ali", disse, chorando.

Crime por amor

Meire foi acusada pelo MPF em outubro de 2016, e a denúncia foi aceita por Moro em dezembro daquele ano. Ela não é ré em outros processos da Lava Jato. A contadora assumiu ter emitido as notas fiscais simulando prestação de serviços --e disse ter feito isso por amor. No caso, por Enivaldo Quadrado, condenado no escândalo do mensalão e em processos da Lava Jato, que trabalhava com Alberto Youssef.

"Eu fiz isso porque eu era apaixonada pelo Enivaldo Quadrado e ele precisava de dinheiro", afirmou.

Segundo a denúncia do MPF, Meire emitiu notas forjadas de prestação de serviços à empresa IT7 Sistemas, de Marcelo Simões, que teria ganhado um contrato de R$ 71,3 milhões com a Caixa Econômica Federal por influência de André Vargas.

O ex-deputado também depôs hoje e negou ter mantido qualquer relacionamento comercial com Youssef ou conhecer Marcelo Simões. Vargas também questionou o teor das delações de Youssef e de Rafael Ângulo Lopez, tido como braço direito do doleiro, que relataram como o dinheiro teria sido entregue a Vargas. 

"É uma delação combinada, e mal combinada", afirmou.

Leon Vargas e Marcelo Simões optaram por ficar em silêncio durante seus interrogatórios.