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Ex-aluno que brigou com Witzel é elo de governador afastado com empresário

Wilson Witzel (PSC) e o ex-secretário de Desenvolvimento Econômico Lucas Tristão - Reprodução/Facebook
Wilson Witzel (PSC) e o ex-secretário de Desenvolvimento Econômico Lucas Tristão Imagem: Reprodução/Facebook

Maria Luisa de Melo

Colaboração para o UOL, no Rio

29/08/2020 04h00

Um dos principais personagens da trama envolvendo o governador Wilson Witzel (PSC), afastado ontem do cargo sob denúncias de corrupção, o advogado Lucas Tristão, preso ontem, está no centro das investigações. Ex-aluno de Witzel, Tristão conheceu o ex-juiz quando ainda cursava Direito, no Espírito Santo.

Segundo as investigações, ele é o elo entre Witzel e Mário Peixoto —principal fornecedor de mão de obra terceirizada do governo fluminense desde a gestão de Sérgio Cabral (MDB). Preso desde maio, Peixoto teve ontem um novo mandado de prisão cumprido contra ele na esteira da decisão do STJ (Superior Tribunal de Justiça) que afastou Witzel do cargo.

A aproximação de Witzel com Tristão começou quando o advogado ainda era seu aluno e recebeu uma nota baixa do ex-juiz, o que resultou em desentendimento entre eles. Superada a briga, anos mais tarde, após deixar a magistratura, Witzel passou a trabalhar no escritório de advocacia de Tristão.

A empresa tinha Mário Peixoto entre seus principais clientes. Começou aí a aproximação do ex-juiz com o empresário. Nesta época, Peixoto já era um dos principais fornecedores do governo emedebista.

Coube ao senador Romário (Podemos) expor, em outubro de 2018, durante o debate eleitoral dos candidatos ao governo do Rio, a relação entre Witzel e Peixoto —o episódio viralizou ontem nas redes sociais. Menos de dois anos depois, graves denúncias de corrupção envolvendo a dupla vêm à tona.

Segundo as investigações do Ministério Público Federal, o grupo formado por Mário Peixoto seria o responsável por usar a pandemia do coronavírus para tentar expandir seus negócios. Há indícios de movimentações da organização de Peixoto em superfaturamento para a instalação de hospitais de campanha.

O empresário acabou preso em maio deste ano, no âmbito da Operação Favorito. A ação foi assim batizada em "homenagem" ao próprio, considerado o predileto na escolha de empresas prestadoras de serviço.

Os procuradores afirmam agora que ao menos três empresas ligadas a Peixoto fizeram pagamentos mensais ao escritório de advocacia da primeira-dama Helena Witzel. Ela seria peça-chave no esquema do marido.

Segundo as investigações, as empresas Cootrab e DPAD Serviços, ligadas a Mário Peixoto; QualiClínicas, ligada a Peixoto e Tristão; e o Hospital Jardim Amália, ligado ao ex-prefeito de Volta Redonda Gothardo Neto Lopes, também aliado de Witzel, repassaram o montante de R$ 554 mil ao escritório de Helena, entre 13 de agosto de 2019 e 19 de maio de 2020.

O valor é apontado como pagamento de propina para Witzel.

"A interlocução de Mário Peixoto com o governador Wilson Witzel ocorria por intermédio de Lucas Tristão, secretário de Desenvolvimento, Energia e Relações Internacionais, homem de confiança de ambos", diz trecho de pedido de prisão e afastamento de Witzel, assinado pelo ministro Benedito Gonçalves.

Já Mário Peixoto, segundo a denúncia, "atua como líder deste braço da organização criminosa, integrando o seu núcleo econômico. Trata-se de um dos maiores empresários do setor de serviços vinculados a organizações sociais que administram UPAs no Estado do Rio de Janeiro e ainda atua como dirigente oculto de diversas dessas OSs".

O empresário seria o responsável "pelos contatos políticos da organização criminosa e fazia os ajustes a respeito do pagamento de vantagens indevidas para agentes públicos de modo a conseguir benefícios para suas empresas contratarem com o Poder Público".

Além de Tristão, Gothardo Neto Lopes, médico e ex-prefeito de Volta Redonda, também foi preso nesta sexta-feira. Ele seria o responsável pelo repasse de R$ 280 mil do Hospital Jardim Amália (Hinja), que pertence à sua família, ao escritório de Helena Witzel. A empresa foi a que fez o maior repasse à conta da primeira-dama.

O que dizem os citados

Witzel negou as acusações, disse que tudo é um "circo" e "perseguição" com "uso político" e citou a família Bolsonaro (veja vídeo abaixo). O governador afastado afirmou que não há provas que comprovem os fatos.

A defesa de Witzel, através de nota, afirmou que a decisão do "ministro Benedito [Gonçalves, do STJ] desrespeita democracia, afasta governador sem sequer ouvi-lo e veda acesso aos autos para defesa. Não se esperava tais atitudes de um Ministro do STJ em plena democracia".

Ainda de acordo com a defesa, "a decisão de afastamento do cargo, tomada de forma monocrática e com tamanha gravidade" foi recebida com surpresa.

Procurada a defesa de Lucas Tristão informou que só se manifestará nos autos processuais.

Já a defesa de Mário Peixoto diz que levará o caso ao Supremo Tribunal Federal, "que se encarregará do restabelecimento da legalidade" e que "o Ministério Público Federal postulou a prisão preventiva de Mário Peixoto com base em teoria presuntiva e uma delação premiada pueril, não respaldada por nenhuma prova".

A defesa de Gothardo Netto, por sua vez, não foi encontrada para comentar as acusações.