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Programa de imunização completa 6 meses sem chefe e sem indício de nomeação

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Carlos Madeiro

Colaboração para o UOL, em Maceió

07/01/2022 04h00

O Brasil completa hoje a marca de seis meses sem uma pessoa à frente do PNI (Programa Nacional de Imunizações), órgão do Ministério da Saúde responsável pela vacinação dos brasileiros. No dia 7 de julho, Franciele Fontana deixou o cargo, que não foi mais ocupado por ninguém.

A ausência por tanto tempo de um líder do programa é algo inédito. "Desde que acompanho o programa de perto, nos anos 1990, nunca se viu tanto tempo sem alguém. Nesse tempo ocorreram trocas, mas nunca ficou esse tempo ausente de chefe", conta Isabella Ballalai, vice-presidente da SBIm (Sociedade Brasileira de Imunizações).

Procurado pelo UOL, o Ministério da Saúde afirma que "a servidora Greice Ikeda atua como coordenadora-geral substituta do Programa PNI, conforme publicado no Diário Oficial da União". A pasta afirma que "as ações que dizem respeito ao PNI seguem sendo realizadas normalmente", mas não dá previsão para uma nomeação definitiva.

A falta de um chefe efetivo ocorre em um momento crítico da cobertura vacinal do calendário de imunização brasileira —que é uma referência mundial no controle de doenças.

Em 2020, o país viu suas taxas vacinais despencarem e retrocederem a coberturas similares às dos anos 1980. Essa redução é sentida desde 2016, mesmo antes da pandemia do novo coronavírus. Há duas justificativas principais para o fenômeno: a falta de campanhas efetivas sobre a importância da vacinação e o desaparecimento de doenças —que fez pessoas mais jovens não darem muita importância às vacinas.

"Sem um coordenador, você não tem planejamento, não define ações do PNI. E isso ocorre justamente hoje, quando coberturas de vacinas retrocedem. A gente está hoje com risco de volta da pólio, como voltou o sarampo. A situação piorou bastante com a pandemia e já pode ser considerada uma emergência em saúde pública.

Nesses seis meses, o programa chegou a ter um nome indicado: o pediatra e professor da UFS (Universidade Federal de Sergipe) Ricardo Gurgel. Entretanto, mesmo nomeado, ele não chegou a tomar posse porque teria expressado opiniões contrárias às do presidente Jair Bolsonaro sobre imunização.

"Eu considero [a negativa ao cargo por defender as vacinas] um grande elogio, porque só reforça a minha convicção pessoal. Deve ser por isso a dificuldade em encontrar alguém para querer o cargo, se estiverem realmente procurando alguém com esse perfil [antivacina]," disse ele ao UOL, no final do ano passado.

Baixa cobertura

Em 2021, números ainda parciais mostram que devemos ter outra queda nas coberturas vacinais. "A gente tem somente os dados preliminares, e ainda não pode afirmar que será menor. Mas com certeza, pelo que observamos, no mínimo a cobertura baixa [de 2020] se repetirá. Não houve melhora alguma", afirma Isabella Ballalai.

Para ela, a falta de coordenação do PNI é um dos motivos para a não retomada e é uma demonstração de que o tema imunização ficou fora das prioridades do governo.

"A gente não vê a priorização disso em ações do ministério. As nossas coberturas vacinais estão muito baixas, e não se vê um movimento --exceto a campanha multivacinação que ocorreu em outubro do ano passado, que teve uma adesão baixa e com comunicação fraca à população.
Isabella Ballalai, SBIm

Isabella Ballalai afirma que a Fiocruz (Fundação Oswaldo Cruz) procurou a SBIm para fazer uma parceria e, junto com o Ministério da Saúde e secretarias estaduais e municipais de saúde, lançou o projeto "Reconquista das Altas Coberturas Vacinais", coordenado pelo Instituto de Tecnologia em Imunobiológicos (Bio-Manguinhos).

O projeto prevê uma ação estratégica e tem como meta o aumento na cobertura vacinal homogêneo em todo o país até o ano de 2025.

"Nesse caso, há um planejamento, e a gente espera que exista um movimento grande com comunicação e ações proativas. A população brasileira confia e acredita na vacina, a gente sabe disso", comenta.

Vacinação da pólio, em gotas, foi uma das marcas do PNI  - iStock - iStock
Vacinação da pólio, em gotas, foi uma das marcas do PNI
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Sobre as quedas de cobertura vacinal, o ministério alega que "segue monitorando" e "intensificando as estratégias necessárias para reverter este cenário."

"Nos últimos três anos, além de campanhas de influenza, poliomielite e de multivacinação (para a atualização da carteira de vacinação), também foram promovidas estratégias de vacinação contra o sarampo", afirma a pasta.

Mesmo em tempos de pandemia, o ministério diz que a recomendação dada é que "os processos de trabalho das equipes de saúde sejam planejados com o objetivo de imunizar o maior número possível de pessoas contra as doenças, conforme orientações do Calendário Nacional de Vacinação."

PNI é modelo mundial

Hoje o PNI distribui 300 milhões de doses de imunizantes todos os anos (sem contar covid-19, que faz parte de uma secretaria à parte), que são aplicadas em mais de 38 mil salas de vacinação espalhadas pelo Brasil. O programa oferece à população vacinas gratuitas em todo o país para mais de 20 tipos de doenças.

A grande estrutura fez o país se tornar uma referência mundial em controle de doenças entre países em desenvolvimento. Foi graças a essa rede espalhada por todo o Brasil que a vacinação contra a covid-19 conseguiu chegar a mais de 150 milhões de brasileiros.

Entretanto, como revelou no mês passado, o programa passa por retrocessos inéditos em seus 48 anos de existência, como o fim da o fim do CTAI (Comitê Técnico Assessor de Imunizações), em 2019; e a falta de campanhas de incentivo à vacinação.

Também é a primeira vez —desde que o programa foi criado na ditadura militar— que o país tem um presidente e líderes do governo com perfil antivacina.