Muçulmanos de Ciudad del Este inauguram mesquita, dispostos a sacudir estigmas

Ciudad del Este, Paraguai, 28 Jan 2016 (AFP) - Um domo branco de 18 metros de altura se impõe na paisagem de Ciudad del Este. É a mesquita Alkhaulafa Al-Rashdeen, o terceiro templo erguido pela comunidade muçulmana na tríplice fronteira que o Paraguai divide com Brasil e Argentina, onde se busca sacudir estigmas ligados ao terrorismo.

O templo de um milhão de dólares, onde sobressaem duas torres de 35 metros de pura arquitetura árabe, foi concluído em dezembro, depois de quatro anos de aportes dos mais de 7.000 árabes muçulmanos radicados em Ciudad del Este. Vinte mil vivem na região da tríplice fronteira.

"Queremos demonstrar com nossos atos que somos gente de bem. O Paraguai é um país hospitaleiro que nos recebeu. Este templo é o fruto do nosso esforço", explicou à AFP Khaled Ghotme, presidente do Centro Árabe Islâmico Paraguaio.

A mesquita, visível de Foz do Iguaçu, do lado brasileiro da fronteira, foi construída como centro de orações com capacidade para mais de 500 pessoas, mas também como referência turística com seu revestimento de pedras e materiais importados da Arábia Saudita e da China.

Khaled, que chegou ao Paraguai aos 17 anos vindo do Vale do Bekaa, no Líbano, diz ter encontrado a paz que procurava nesta cidade quente e úmida quando se tornou "insuportável a invasão de Israel" em seu país natal.

Mas, ele admite que esta tranquilidade desaparece quando acontece algum atentado a mando dos radicais islâmicos no mundo, como o que deixou 130 mortos em 13 de novembro, na França.

"O que aconteceu na França foi doloroso. Nós o repudiamos de todo coração", comentou.

Said Mohamed Taiyen, vice-presidente do centro islâmico paraguaio, lamenta que a imprensa não trate da mesma maneira os atentados produzidos no Oriente Médio.

"Não deram a mesma transcendência (ao atentado) que ocorreu no Líbano. As vítimas foram 100% muçulmanos. Por que fazem distinção?", questiona-se, enquanto um dos fiéis intervém: "Todos somos servos de Deus. Não há diferença entre seres humanos (...) Por acaso não vivemos na mesma Terra?"

"Chega de difamação"Até agora havia nesta região duas mesquitas: uma xiita e outra sunita.

A Mesquita do Profeta Maomé, situada em pleno centro e cercada de lojas, pedestres e veículos em trânsito constante, serve como local de oração para os donos dos estabelecimentos comerciais vizinhos.

O templo maior e mais frequentado até agora tem sido a mesquita sunita de Foz do Iguaçu, do lado brasileiro desta fronteira, cortada por uma confluência dos rios Paraná e Iguaçu.

Os representantes muçulmanos contam que, antes dos atentados de 2001 nos Estados Unidos, sua comunidade contava com 30.000 pessoas. Desde então, aumentaram as acusações de apoio ao extremismo muçulmano.

As comunidades de imigrantes - umas 85 etnias de diferentes partes do mundo - se uniram para organizar atos culturais multitudinários, integrando os moradores dos três polos urbanos: Ciudad del Este (Paraguai), Foz do Iguaçu (Brasil) e Puerto Iguazú (Argentina), para dizer "chega de difamação".

Sob suspeitaEspecialistas da polícia antiterrorista do Paraguai revelaram à AFP que em Ciudad del Este, a segunda cidade mais populosa do país, operam agentes da CIA e do FBI (polícia federal americana), do Mossad israelense e do serviço secreto francês.

Com os seis milhões de turistas que se estima que visitem anualmente as Cataratas do Iguaçu e a gigantesca represa hidroelétrica de Itaipu, que o Paraguai compartilha com o Brasil, Ciudad del Este se transformou em um local de rico intercâmbio comercial.

Em sua fúria após os atentados do 11/09, Washington denominou a região de "santuário de terroristas", qualificando-a de "ímã" para a lavagem de dinheiro, o tráfico de armas, de drogas, documentação falsa e pirataria, o que poderia esconder o financiamento de outras atividades.

A circulação de pessoas e mercadorias com pouca burocracia acentuou as suspeitas dos serviços secretos sobre a possibilidade de envio de recursos a movimentos extremistas de uma zona considerada um enclave de células adormecidas do terrorismo islâmico.

No Brasil, os governos de Luiz Inácio Lula da Silva e Dilma Rousseff, sucessivamente, defenderam a região das acusações dos Estados Unidos.

Khaled, um profissional de informática, é um dos que resistiu aos embates em uma época em que se estimavam em 30.000 os descendentes do Oriente Médio na região. "Hoje somos entre dez e quinze mil", disse.

Mas a nova mesquita de Ciudad del Este, a primeira do porte no Paraguai, fomenta o orgulho de sua comunidade muçulmana.

"É o símbolo da pluriculturalidade cosmopolita da região", comemora Said Taiyén.

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