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Disputa entre poderes acirra crise política no Egito

09/07/2012 14h26

O atual impasse entre a Justiça, os militares e Executivo do Egito, após a tentativa do novo presidente Mohammed Mursi de restaurar o Parlamento (dissolvido sob ordem dos militares no mês passado), voltou a acirrar a crise política no país. O novo capítulo do conflito de poderes, no entanto, deve ser resolvido sem confrontos.

Na visão de Jon Leyne, analista da BBC no Cairo, a posição da Suprema Corte, que nesta segunda-feira rejeitou o decreto Mursi restaurarando o Parlamento, representa muito mais um desdobramento da tentativa do país de se ajustar a uma nova configuração de poder do que o o início de um confronto aberto.

O especialista relembra que, semanas atrás, a Suprema Corte apenas julgou que parte das eleições parlamentares, vencidas pela Irmandade Muçulmana (partido de Mursi), era inconstitucional. A decisão de dissolver totalmente o Parlamento foi do Conselho Supremo das Forças Armadas.

Em um comunicado, o tribunal deixou claro que "não é uma parte interessada em nenhum confronto político".

Logo, o impasse seria muito mais focado entre uma tentativa dos militares, aliados a setores seculares, de esvaziar o governo, composto por setores religiosos, do que um embate direto entre o novo líder do Executivo e a mais alta corte egípcia.

Além de dissolver o Parlamento, os militares aprovaram uma declaração constitucional antes do anúncio das eleições, retirando qualquer poder do presidente sobre as Forças Armadas. Os comandantes também receberam poder de legislar, além de poderem vetar partes da futura Constituição, que ainda não possui um rascunho.

Disputa de poderes

Mursi pertence à Irmandade Muçulmana, partido com a maioria dos assentos no Parlamento eleito neste ano, o que tende a ser visto como fator de preocupação pelos militares, que no passado mantiveram muitos líderes do grupo presos ou exilados.

Apesar da crise, Mursi e o marechal Hussein Tantawi, que detém o poder militar, apareceram juntos em uma cerimônia de premiação de cadetes nesta segunda-feira.

"Superficialmente, o anúncio da Suprema Corte indica que o presidente Mursi e a Irmandade Muçulamana estão em um rumo de confronto tanto com os militares como com a Justiça, mas na prática não é tão simples. Tudo que a corte fez foi julgar que parte das eleições para o Parlamento foi inconstitucional. Então Mursi não está indo diretamente contra uma ordem judicial", diz Leyne.

"Quanto aos militares, eles não estão, nesse momento, atuando como se estivessem preparando um grande confronto com a Irmandade Muçulmana. Na verdade há mais indícios do contrário. A segurança em torno do Parlamento foi reduzida, e não aumentada".

Para o analista, o contexto aponta para chances de que a crise possa ser resolvida "sem um grande confronto".

Mesmo assim é provável que Mursi entre em novas disputas para ampliar seu escopo de governabilidade, já que foi eleito para liderar um país sem uma Constituição aprovada, sem uma definição clara de seus poderes como presidente e sem poder contar com o apoio entre os congressistas, cuja maioria detinha de acordo com os resultados das eleições parlamentares.

Instabilidade

Embora o recurso de Mursi tenha sido rejeitado pela Suprema Corte, o presidente do Parlamento, Saad al-Kathani (também da Irmandade Muçulmana), convocou os congressistas para uma reunião na terça-feira.

Unidades do Exército foram vistas deixando as portas do prédio, permitindo a entrada de alguns parlamentares.

Membros de partidos rivais criticaram o decreto de Mursi, que prevê o retorno dos trabalhos no Congresso e novas eleições parlamentares 60 dias após a nova Constituição ser aprovada em um referendo nacional.

Já os militares, que entregaram formalmente o poder a Mursi no dia 30 de junho, têm despertado cada vez mais desconfiança e insatisfação na população. Setores da sociedade os acusam de querer manter o poder mesmo após a revolução que derrubou o ex-líder Hosni Mubarak, que comandou o país por 30 anos.