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O americano que fez de tudo para ser preso na Coreia do Norte

Matthew Miller em foto de arquivo de 1º de setembro de 2014 - Wong Maye-E/AP
Matthew Miller em foto de arquivo de 1º de setembro de 2014 Imagem: Wong Maye-E/AP

Stephen Evans

Da BBC News, Seul

25/11/2014 15h05Atualizada em 25/11/2014 15h36

Em abril de 2014, Matthew Miller viajou para a Coreia do Norte como turista. Durante o voo ele danificou o visto para entrar no país e, ao chegar, tentou pedir asilo.

Agora, ele disse a um site especializado na cobertura de notícias da Coreia do Norte que tentou de tudo para ser preso no país asiático. Mas por quê?

O caso de Miller, preso em abril e solto no dia 8 de novembro, é intrigante. Ele tentou ser preso no país mesmo quando o governo norte-coreano tentou colocá-lo em um avião e enviá-lo de volta para casa.

Entrevistas por e-mail feitas pelo site NK News durante vários dias revelaram um "turista curioso" que queria férias radicais.


Ele disse ao site que queria descobrir o que era a Coreia do Norte, ir além dos programas comuns de turistas e ficar "face a face com os norte-coreanos, para obter respostas às minhas questões".

Carter e Clinton

A prisão de cidadãos americanos na Coreia do Norte geralmente tem grande repercussão nos Estados Unidos. Afinal, o país é tido como um dos mais despóticos do mundo, onde métodos de punição, descritos em um inquérito da ONU, incluem "extermínio, assassinato, escravização, tortura, aprisionamento, estupro, abortos forçados e outros tipos de violência sexual".

O governo americano faz de tudo para libertar cidadãos seus detidos no país. Entre os enviados especiais de Washington à Coreia do Norte em missões de libertação estiveram nomes como os ex-presidentes Jimmy Carter e Bill Clinton.

Entre os americanos presos também esteve Evan Hunziker, que atravessou a nado o rio Yalu, da China para a Coreia do Norte, em 1996, para vencer uma aposta.

Ele foi encontrado sem roupas e bêbado por agricultores norte-coreanos e libertado depois que sua família pagou US$ 5 mil (cerca de R$ 12 mil).


A maioria dos americanos que são presos na Coreia do Norte são missionários cristãos, como Robert Park, que entrou de forma ilegal no país em dezembro de 2009 e foi libertado dois meses depois. Ele disse que foi torturado e continua a sofrer com traumas.

O governo norte-coreano fornece vistos para turistas ocidentais, mas eles (os vistos) são controlados.

A maior parte dos turistas chega ao país através do vizinho maior, a China.

Em 2013, foram relaxadas algumas restrições a turistas; foi permitida a entrada com telefones celulares. Mas os contatos telefônicos com moradores locais continuam proibidos.

Medo de não ser preso

Miller contou na entrevista que seu maior medo era não ser preso quando chegasse à Coreia do Norte.

Além de danificar o visto, ele também escreveu uma série de anotações confusas que afirmavam, entre outras coisas, que ele era um "hacker" cujo objetivo era retirar os militares americanos da Coreia do Sul.


"Talvez o caderno de anotações tenha sido um pouco demais, eles souberam na hora que era falso e perguntaram qual era meu verdadeiro objetivo com a visita", disse.

O americano ainda disse às autoridades que tinha segredos militares e que os norte-coreanos sabiam que o irmão dele era um piloto de teste para caças F-35 da Força Aérea americana, mas não se importavam com isso.

Quando os norte-coreanos finalmente concordaram em não deportá-lo, em vez de enviá-lo a algum "gulag" stalinista, o colocaram em um hotel e, em seguida, em uma pensão, onde ficou trancado com outras pessoas, incluindo um outro americano.

Apenas depois de ser sentenciado a seis anos de trabalhos pesados, ele foi transferido para uma prisão mais convencional, uma "espécie de fazenda", como Miller explicou à NK News.

Logo após a divulgação da sentença, a agência de notícias Reuters descreveu Miller como um jovem de 25 anos, de Bakersfield, na Califórnia, obcecado pelo livro Alice no País das Maravilhas, de Lewis Carroll, e admirador de George Orwell e Oscar Wilde.

Arrependimento

Miller disse à NK News que se arrepende de sua aventura - que acabou depois que ele mesmo pediu ajuda ao chefe dos serviços nacional de Inteligência dos Estados Unidos, James Clapper, que foi à Coreia do Norte para interceder pelo californiano.

"Me sinto culpado pelo crime. Foi um crime. Desperdicei muito tempo dos norte-coreanos e dos americanos", afirmou.

Por outro lado, Miller contou que passou cinco meses conversando com "várias pessoas" e conseguiu seu objetivo de ver mais da Coreia do Norte.

"Acho que foi um erro, mas foi bem-sucedido", afirmou.