Topo

Como caminhonete de encanador dos EUA foi parar na guerra da Síria - e transformou ex-dono em alvo de ameaças

A caminhonete da loja de Mark Oberholtzer apareceu no meio da guerra da Síria após ser vendida nos EUA - Twitter/Reprodução
A caminhonete da loja de Mark Oberholtzer apareceu no meio da guerra da Síria após ser vendida nos EUA Imagem: Twitter/Reprodução

16/12/2015 09h11

A caminhonete da loja de Mark Oberholtzer apareceu no meio da guerra da Síria após ser vendida nos EUA

Quando o encanador americano Mark Oberholtzer, de 62 anos, trocou sua caminhonete velha por um modelo mais novo, não podia imaginar que a transação lhe causaria tantos problemas.

Em questão de meses, ele passou de modesto dono de loja de produtos hidráulicos no interior dos EUA a alvo de ameaças de morte por ser "simpatizante de terroristas".

Tudo por uma imagem que mostra seu antigo veículo adaptado para guerra, em poder de combatentes sírios e com uma bateria antiaérea na carroceria.

Atormentado pelo assédio que sofreu, Oberholtzer, morador de Corpus Christi, cidade de 46 mil habitantes no Texas, processou a concessionária em que fez a troca, pedindo indenização de US$ 1 milhão por danos morais e materiais.

Em 23 de outubro de 2013, Obertholtzer, dono da empresa Mark-1 Plumbing, procurou a concessionária AutoNation Ford Gulf Freeway, em Houston, e trocou sua picape Ford F-250 2005 por uma caminhonete do mesmo modelo, mas de 2012.

Enquanto esperava a papelada da venda ficar pronta, o encanador diz que começou a retirar da lateral do carro os adesivos com logotipo, nome e número de telefone da empresa.

No entanto, segundo os advogados de Oberholtzer alegam na ação, um vendedor da concessionária pediu que ele não fizesse aquilo porque poderia danificar a pintura do veículo, e que a retirada seria realizada de maneira profissional.

Semanas depois, a concessionária vendeu a caminhonete em um leilão para a Maz Auto, uma empresa de carros usados em Houston.

Em 18 de dezembro de 2013, de acordo com a ação, o veículo foi exportado do Texas a Mersin, na costa mediterrânea da Turquia, onde provavelmente entrou na espiral de intercâmbio de armas e materiais para a vizinha Síria.

E o rastro do carro se perdeu.

Insultos e ameaças

Um ano depois, em dezembro de 2014, Caleb Weiss, pesquisador de movimentos jihadistas, compartilhou no Twitter uma foto que originalmente havia sido divulgada pelo grupo rebelde sírio Frente Ansar al Din.

A imagem mostrava a antiga caminhonete do encanador com uma bateria antiaérea, sendo operada por um homem não identificado.


As informações sobre a empresa de Mark Oberholtzer continuavam intactas no veículo. E aí começou o pesadelo do encanador.

Sua secretária ligou chorando para dizer que estava recebendo centenas de chamadas com insultos e ameaças.

"No final do dia, o escritório, o telefone da empresa e o celular pessoal de Mark haviam recebido mais de mil ligações de todo o país", afirma o advogado na ação, apresentada recentemente em um tribunal de Houston.

As ligações incluíam ameaças de violência, danos ao patrimônio, lesões e morte. Em alguns casos, os interlocutores cantavam em árabe, enquanto outros xingavam qualquer um que atendesse.

"No começo achei que era uma imagem de Photoshop, alguma brincadeira de amigo", disse Oberholtzer nesta semana a um jornal local. "Então minha secretária me enviou a imagem e pensei: 'Ninguém tem uma foto dessa caminhonete'."

A imagem motivou zombarias nas redes sociais e chegou até a televisão.

O apresentador e comediante Stephen Colbert comentou o assunto em seu programa Late Show with Stephen Colbert, na rede CBS.

"Esse país (Siria) está indo pelo ralo, mas pela primeira vez sabem quem chamar para desentupi-lo... Mas pensando bem, uma caminhonete, um deserto, uma arma gigante... acho que poderia ser o Texas", brincou.

Segundo Craig Eiland, advogado de Oberholtzer, seu cliente passou a andar armado para se defender.

O encanador também foi interrogado por investigadores do Departamento de Segurança Interna e do FBI.

A ação cita ainda que Oberholtzer perdeu grande parte dos clientes e ainda recebe ligações com ameaças e insultos.

Outro lado

Procurada pela BBC, a concessionária AutoNation não respondeu aos contatos da reportagem.

Contudo, um porta-voz da empresa se manifestou nesta semana. "É lamentável que o cliente esteja enfrentando esses problemas", afirmou Marc Cannon.

A concessionária que vendeu a caminhonete do encanador disse estar investigando o caso, que classificou como "lamentável"

"O veículo chegou até nós e foi encaminhado para leilão. Os adesivos deveriam ter sido retirados no leilão. Isso não ocorreu, e é lamentável."

Cannon afirmou que a empresa está conduzindo uma investigação e que ainda não sabe exatamente o que ocorreu após o veículo ser vendido.

Já o encanador do interior do Texas está resignado, e só espera receber algum tipo de compensação.

"Alguém me disse que a internet não tem borracha, e sou conhecido na minha cidade por trabalhar nesse negócio há 32 anos", lamentou.