As iniciativas impactantes do papa - e suas limitações
O papa Francisco publicou nesta sexta-feira (8) novas orientações sobre a vida familiar, nas quais argumenta que a Igreja deveria mostrar mais compreensão com as realidades atuais, incluindo o divórcio e o fato de as pessoas se casarem mais de uma vez.
O documento, baseado em dois Sínodos sobre o assunto, era aguardado com grande expectativa pelo mundo católico.
A fala de Francisco não necessariamente abre espaço à aceitação de divorciados na Igreja, como queriam alguns progressistas, mas sugere que bispos e padres de diferentes países podem fazê-lo caso a caso, adaptando-se a realidades locais --algo que pode ter impacto significativo na prática eclesiástica.
"Ninguém pode ser condenado para sempre", afirmou o papa. "Estou aqui falando não apenas dos divorciados e dos que se casaram de novo, mas de todas as pessoas, em qualquer situação que se encontrem."
Francisco incentiva os padres a exercitarem o discernimento sobre "famílias feridas" e serem misericordiosos em vez de julgarem.
Dentro da Cúria, posições como essa têm polarizado opiniões, mesmo que Francisco não tenha mudado a doutrina católica e continue a ser um forte opositor do aborto, que recentemente chamou de "mal absoluto".
Discursos e iniciativas propostas pelo papa têm sido impactantes, ainda que nem sempre ágeis o bastante ou populares entre demais sacerdotes e todos os seguidores da fé católica. Veja algumas delas abaixo, bem como suas limitações:
1. Mudanças nas finanças e no Vaticano
O papa Francisco começou suas reformas reunindo uma comissão especial de cardeais para aconselhá-lo (a chamada "C9"), em uma espécie de gabinete papal, e está gradualmente pressionando pela reestruturação de partes da Cúria.
Uma de suas primeiras reformas foi a instauração, em 2015, de um departamento único de comunicação do Vaticano. A nova instância reuniu várias entidades e mais reformas estruturais, e a fusão de departamentos devem acontecer neste ano.
Até agora, tal reforma estrutural tem tido desdobramentos lentos, embora a varredura nas finanças do Vaticano e do Banco do Vaticano seja, talvez, a mais avançada dessas mudanças: Francisco recentemente definiu novas diretrizes contábeis e financeiras para o departamento que cria santos.
O papa também manifestou seu desejo por uma "descentralização saudável" da Igreja, ideia que enfrenta resistência dentro da Cúria.
2. Abuso sexual
O papa foi elogiado por ter lidado com o histórico vergonhoso da Igreja no que diz respeito ao abuso sexual de menores.
Francisco já fez críticas públicas ao crime e estabeleceu uma comissão para combatê-lo na Igreja. Mas a recente saída de Peter Saunders, um dos dois únicos sobreviventes de tais abusos a participar da comissão, lançou dúvidas sobre a eficácia desta.
Saunders e outros críticos acreditam que o Vaticano ainda não está fazendo o suficiente para punir casos de abusos de crianças por clérigos com rapidez e transparência.
3. Gays e divórcio
No documento divulgado nesta sexta-feira, o papa afirma que "todos, independentemente de sua orientação sexual, devem ser respeitados em sua dignidade e tratados com consideração". Mas acrescenta: "Não há absolutamente nenhuma base para considerar uniões homossexuais de qualquer modo similares ou remotamente análogas aos planos de Deus para o casamento e a família".
Esse trecho final provavelmente decepcionará muitos na comunidade gay que esperavam da Igreja um passo além do respeito à orientação sexual.
Previamente, o papa também disse várias vezes que é necessário uma atitude mais acolhedora aos católicos homossexuais --embora a união de pessoas do mesmo sexo tenha sido empurrada para fora da agenda.
Em 2013, durante o voo de volta ao Vaticano, após a visita ao Brasil, o pontífice ganhou manchetes ao dizer: "Se uma pessoa é gay e busca a Deus, quem sou eu para julgá-la?".
Falas prévias de Francisco também deram esperanças aos católicos mais liberais de que mudanças sobre temas delicados à Igreja podem estar a caminho.
Em outubro, o sumo pontífice afirmou durante uma audiência que divorciados que se casaram novamente "seguem fazendo parte da Igreja" e não devem ser tratados como excomungados.
4. Aproximação entre Cuba e Estados Unidos
Os governos de Cuba e dos Estados Unidos disseram que Francisco foi crucial na reaproximação que levou à retomada das relações diplomáticas entre os dois países.
Autor da biografia "O Grande Reformista: Francisco e a construção de um papa radical", o jornalista britânico Austen Ivereigh disse à BBC Brasil que o pontífice deu o pontapé inicial no processo, quando enviou cartas aos líderes Raúl Castro e Barack Obama.
"Adoraria saber o que estava escrito naquelas cartas, mas foi o suficiente para aproximá-los. Deve ter sido um apelo muito profundo para uma visão de futuro", disse Ivereigh.
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