De jamais sair sozinho a reverenciar líderes, as regras que turistas brasileiros precisam seguir na Coreia do Norte
Já sabe onde vai passar suas próximas férias? Bem, se você é daqueles que estão cansados de visitar sempre os mesmos países e, na próxima viagem, deseja conhecer um lugar diferente, acredite: a Coreia do Norte é uma boa opção.
Lá, o visitante não pode tirar foto de tudo o que vê pela frente, sair desacompanhado pelas ruas da capital ou questionar o roteiro de viagens, elaborado pela Agência Coreana de Viagens Internacionais (KITC, em inglês), o órgão oficial de turismo.
O país mais fechado do mundo, segundo estimativas não oficiais, recebe uma média de 70 mil turistas por ano. A título de comparação, a França, o mais visitado do planeta, recebe algo em torno de 85 milhões.
Bem, se considerarmos apenas os turistas ocidentais, o número cai para 5 mil. "Brasileiros não chegam a dez por ano", calcula Rayco Vega, diretor da KTG, uma agência de turismo sediada na China.
"Este ano, houve uma queda na procura. Por causa da crescente troca de ameaças entre EUA e Coreia do Norte, muitos turistas desistiram de viajar."
Fácil, mas caro
Visitar a terra natal de Kim Jong-un - que, semana passada, testou mais um míssil balístico de longo alcance - não é missão impossível.
Com exceção de sul-coreanos, norte-americanos e jornalistas ocidentais, todos são muito bem-vindos. O índice de vistos negados, aliás, é extremamente baixo. A KTG é uma das três agências que operam na Coreia do Norte.
As outras duas são Koryo Tours e Juche Travel Service. São elas que emitem os vistos, compram as passagens, reservam os hotéis - padrão 4 estrelas, com água quente e energia elétrica - e contratam os guias.
A única conexão existente até a Coreia do Norte é a que parte da China. A viagem dura 25 horas de trem ou duas de avião.
Viajar até Pyongyang pode não ser difícil, mas é caro.
A Koryo Tours, por exemplo, oferece pacotes de duas (R$ 3,4 mil) a 21 noites (R$ 17,7 mil) para grupos até 20 pessoas. O valor do pacote inclui hospedagem, transporte e alimentação.
Em solo norte-coreano, o turista nunca vai estar sozinho. Terá sempre a companhia de dois guias e um motorista.
Fugir do hotel pode dar cadeia
Um dia antes do embarque para Pyongyang, os agentes de turismo orientam os visitantes a seguir algumas recomendações.
"A principal era ter em mente que qualquer coisa que eu fizesse de errado ia ser paga pelos meus guias, dificilmente por mim", recorda o publicitário gaúcho Marcelo Druck, de 29 anos.
"De resto, era basicamente não fotografar militares (exceto na Zona Desmilitarizada, na fronteira com a Coreia do Sul), não sair sozinho do hotel e perguntar antes tudo, qualquer coisa."
Distribuir material religioso e discutir política internacional também estão fora de cogitação. "Atos que parecem triviais em outros países são considerados crime na Coreia do Norte", avisa Rayco Vega, da KTG.
Os turistas também não podem entrar com câmeras com GPS, livros ou revistas sul-coreanos e lentes de longo alcance em Pyongyang. "Tivemos que deixar nossos celulares e passaportes com as autoridades norte-coreanas", recorda o funcionário público paulista Guilherme Bahia, de 38 anos.
Desobedecer às regras impostas pelas agências de turismo pode ser extremamente perigoso. Um exemplo? No dia 2 de janeiro de 2016, o estudante americano Otto Frederick Warmbier, de 22 anos, foi preso por ter roubado um cartaz com propaganda política no hotel onde estava hospedado, em Pyongyang.
Condenado a 15 anos de trabalhos forçados por "atividades hostis", Warmbier foi extraditado, em coma, em 13 de junho de 2017. Nove dias depois, morreu.
Interagir com cidadãos norte-coreanos, ao contrário, não é proibido. "O problema é que poucos falam inglês", lamenta Gabriel Britto, um produtor de conteúdo gaúcho de 41 anos.
Mesmo assim, as conversas giraram em torno de temas, como futebol e novela. "Uma das guias morou em Cuba e quis saber tudo sobre 'A Escrava Isaura'. Foi surreal!", diverte-se Druck.
Já alguns moradores fizeram alusão ao 2 a 1 entre Brasil e Coreia do Norte, na Copa do Mundo de 2010, na África do Sul. "Foi um jogo apertado. O Brasil ganhou meio no sufoco e eles se orgulhavam disso", acha graça Britto.
Visitantes são convidados a prestar reverência aos grandes líderes
O roteiro de viagem a Coreia do Norte privilegia visitas a parques, fábricas e museus. Muitos museus. Um deles é o Museu da Guerra Vitoriosa da Libertação da Pátria, que dá sua versão para a Guerra da Coreia (1950-1953).
Outro point obrigatório é a Exposição Internacional da Amizade, que reúne os mais de 100 mil presentes recebidos por Kim Il-sung, o Grande Líder, de outros líderes, como Robert Mugabe, que renunciou à Presidência do Zimbábue, no último dia 21, após 37 anos no poder.
Pensa que acabou? Longe disso. O roteiro, de 12 horas diárias, inclui, ainda, visita a uma plantação de maçãs, um criadouro de tartarugas e uma engarrafadora de água mineral.
Dos muitos costumes locais, o que mais chama a atenção dos turistas é o hábito de prestar reverência e depositar flores diante das inúmeras estátuas erguidas em memória do Grande Líder, que libertou o país da ocupação japonesa, em 1945, e de Kim Jong-il, seu filho, o Querido Líder.
"O povo norte-coreano venera seus governantes como se fossem deuses", resume Britto.
Druck, Bahia e Britto viajaram para a Coreia do Norte em 2012. Na ocasião, passaram cinco dias na capital, Pyongyang.
O primeiro viajou sozinho, e os dois últimos, em excursão. Mas todos por agência de turismo - no caso, a britânica Koryo Tours.
Cinco anos depois, a lembrança que fica, segundo Britto, é a do povo norte-coreano, "gente como a gente". "Não é todo mundo lá que é louco como o ditador, entende?", explica.
Indagado se gostaria de voltar lá algum dia, responde que sim. Mas, que ficaria menos tempo. "Um final de semana é mais do que suficiente", dá a dica.
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