Horror domina 1º testemunho contra Mladic, ex-general da guerra da Bósnia

Maite Rodal.

Haia, 9 jul (EFE).- A primeira testemunha de acusação no processo contra o ex-general servo-bósnio Ratko Mladic, um jovem muçulmano bósnio, reviveu nesta segunda-feira no Tribunal Penal Internacional para a Antiga Iugoslávia (TPII) o horror da limpeza étnica que ele e sua família sofreram por parte das tropas servo-bósnias.

A testemunha, Elvedin Pasic, de 34 anos, explicou, em uma declaração interrompida várias vezes pelas lágrimas, que todos os membros homens de sua família foram assassinados, "depois da primeira noite" de prisão pelos sérvios.

"Não há dúvidas para mim que, depois da primeira noite na escola (que as tropas servo-bósnias usavam como centro de detenção), todos foram assassinados", desabafou entre soluços Pasic, que tinha apenas 14 anos quando a guerra da Bósnia (1992-1995) eclodiu.

A testemunha se referiu a um grupo de cerca de 150 homens muçulmanos que foram detidos em condições brutais pelas forças servo-bósnias em 1992, pouco após a guerra começar, e após se verem obrigados a fugir de suas casas escapando dos ataques sérvios.

O homem descreveu como militares servo-bósnios destruíram suas propriedades e casas e mataram os que insistiam em ficar em suas casas.

Visivelmente emocionado, Pasic falou do momento em que seu pai, com uma arma na mão, ordenou a sua mãe e a ele que abandonassem a casa pela janela.

"As balas chegavam perto (...) e lá, onde quer que fôssemos parecia que não éramos bem-vindos", contou em inglês perfeito já que, depois da guerra, se refugiou nos Estados Unidos.

Ao voltar ao povoado, "não havia nada em nossa casa, tudo tinha desaparecido, tinham matado o cachorro e, dos idosos que ficaram, quatro foram queimados e outro morto a tiros", lembrou.

O jovem reviveu o pesadelo da fuga com seu pai, até que finalmente se viram obrigados a se render perante os militares servo-bósnios e foram detidos na escola adaptada como prisão.

"Fizeram-nos deitar em fileiras sobre a lama, levantaram meu pai, que para me proteger disse que não tinha nenhum parente no grupo, espancaram-no e depois levaram os homens para o segundo andar da escola, enquanto nós, crianças e mulheres, tivemos que entrar em um ônibus", detalhou a testemunha.

A defesa tentou questionar a credibilidade do testemunho de Pasic, ao fazê-lo reconhecer que não presenciou pessoalmente nenhum assassinato, e lembrou que houve bombardeios de artilharia, nas redondezas do povo da testemunha, que talvez tenham causado algumas das mortes.

Do banco dos réus, um Mladic de aspecto melhorado tomava notas e concordava de vez em quando, especialmente quando a testemunha disse que antes da guerra "muçulmanos, sérvios e croatas" viviam "sem inimizades, juntos".

O julgamento a Mladic foi retomado hoje depois de seu início, em 16 de maio, tendo um atraso de quase dois meses provocado por erros da promotoria ao entregar documentos à defesa.

Em princípio, estava previsto que as primeiras testemunhas contra Mladic começariam a depor em 29 de maio, mas, como a defesa não recebeu os documentos necessários para preparar o caso a tempo, a data foi adiada primeiro para junho e finalmente para hoje.

O acusado também apresentou hoje uma moção de urgência para atrasar novamente o julgamento porque não está certo que muitas das testemunhas deponham por escrito, mas os magistrados não se pronunciarão a respeito até que a promotoria faça suas colocações na audiência de amanhã.

Após interrogar Pasic, a acusação citará David Harland, assessor político das Forças de Proteção das Nações Unidas (Unprofor) na Croácia e Bósnia-Herzegovina, quem declarará acerca do assédio de Sarajevo entre 1993 e 1995, onde calcula-se que tenham morrido cerca de 12 mil civis.

A promotoria quer ainda que Harland fale dos contatos entre Mladic e o ex-líder político servo-bósnio Radovan Karadzic.

A acusação, que conta com um total de 200 horas para expor seu caso, apresentará durante o julgamento as declarações de 411 testemunhas, sete das quais irão pessoalmente, apesar de 141 estarem dispostas a ser acareadas pela defesa.

Mladic, de 70 anos, é acusado de ter cometido 11 crimes de guerra e lesa-humanidade na guerra da Bósnia, incluindo a acusação por genocídio pelo massacre na cidade bósnia de Srebrenica em 1995, onde foram assassinados cerca de 8 mil homens muçulmanos após uma ofensiva servo-bósnia.

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