Garota de programa decide processar embaixada dos EUA
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André Borges/Folhapress
Romilda afirma que sofreu agressões de funcionários americanos
Os advogados da dançarina e garota de programa ferida em um incidente com quatro funcionários norte-americanos da embaixada dos Estados Unidos em Brasília disseram à Reuters nesta quarta-feira que irão processar a representação diplomática pedindo reparação moral e estética e ressarcimento de gastos médicos.
O Ministério Público decidiu que não se trata de um crime de trânsito, como concluiu o inquérito policial, e encaminhou o caso para a área criminal, que decidirá se denuncia os quatro norte-americanos e o motorista brasileiro da van blindada da embaixada que teria atropelado Romilda Aparecida Ferreira, de 31 anos, em dezembro.
O incidente ocorreu quando os norte-americanos, três deles fuzileiros navais que trabalhavam como seguranças da embaixada e um funcionário civil, deixavam uma boate de Brasília no carro diplomático com quatro garotas de programa.
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Depois de uma discussão com o motorista, segundo o relato de Romilda, ela foi retirada à força da van por um dos norte-americanos, caiu para baixo do veículo e foi atropelada. Os homens deixaram o local sem prestar socorro, eles reconheceram em depoimento à polícia.
O episódio veio a público nos últimos dias, pouco depois de outro caso envolvendo agentes secretos dos Estados Unidos que levaram prostitutas ao hotel em que se hospedavam com a comitiva do presidente norte-americano, Barack Obama, em Cartagena, na Colômbia.
O caso da brasileira está a cargo do escritório do advogado Cezar Britto, ex-presidente da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB). Ele afirmou que houve pelo menos dois meses de tentativas de negociar com a embaixada o ressarcimento. Segundo os advogados, apenas os gastos médicos ultrapassam 50 mil reais.
"Nosso interesse era que houvesse um tratamento digno e de respeito para com uma mulher brasileira que estava em nosso país e que foi desrespeitada por um carro da embaixada americana", disse Antonio Rodrigo Machado, um dos advogados da dançarina.
"A embaixada americana foi muito arrogante", afirmou Machado, acrescentando que o governo dos Estados Unidos chegou a pedir uma proposta de acordo que incluía uma cláusula de sigilo para evitar a publicidade do caso.
Romilda deslocou a clavícula, quebrou duas costelas e teve o pulmão perfurado.
O inquérito policial, que classificou o episódio como um crime de trânsito, indiciou o motorista brasileiro por omissão de socorro e lesão corporal culposa. Já o norte-americano que forçou a garota de programa para fora do carro foi indiciado por omissão de socorro.
Em entrevista à Reuters nesta quarta-feira, Romilda afirmou que ela e três colegas encontraram os quatro norte-americanos em uma boate onde ela trabalhava como dançarina e garota de programa havia três anos.
"E assim como outra noite qualquer, sentamos com os rapazes para beber, conversar. Combinamos os valores e para a casa de quem íamos...E na van rolou um estresse comigo e o motorista da van", disse ela.
Segundo a mulher, o motorista ligou para um dos norte-americanos que seguia em um táxi atrás da van relatando que estaria sendo ofendido pela dançarina. O estrangeiro, então, teria ido até o veículo para retirar Romilda à força.
"Eu bati a cabeça e desmaiei...Ele bateu na van pedindo para seguir em frente...eu caí por baixo (do carro) e a traseira (da van) passou por cima de mim", disse ela.
Os norte-americanos, que prestaram depoimento à polícia, deixaram o país, informou a embaixada dos Estados Unidos, que disse ainda ter colaborado com as investigações.
Em visita a Brasília na terça-feira, o secretário de Defesa norte-americano, Leon Panetta, afirmou que os Estados Unidos "não vão tolerar esse tipo de comportamento nem no Brasil nem em qualquer outro país" e anunciou a punição dos fuzileiros.
Romilda disse ainda que durante os 12 dias em que ficou internada foi visitada por uma representante da embaixada e um advogado, que ofereceram uma compensação de cerca de 4.000 reais, que ela não aceitou. Ela afirmou que não quer voltar a ser garota de programa e agora trabalha em um pet shop nos arredores de Brasília.
"Eles (a embaixada) não me deram assistência nenhuma", afirmou ela.
Em declaração nesta quarta-feira, um representante do Departamento de Estado dos Estados Unidos afirmou que a mulher abriu a porta do veículo em movimento e caiu.
A promotora de Justiça Laura Beatriz Rito contou à Reuters que um dos norte-americanos chegou a dizer à polícia que eles não conheciam as mulheres e apenas estavam dando uma carona até a rodoviária. Já outros confirmaram a versão de Romilda, mas não explicaram o motivo de não terem socorrido a vítima.
"Delito de trânsito não existe, mas tem que se investigar se houve intenção de lesão", afirmou a promotora.
* Reportagem adicional de Hugo Bachega