Lava Jato chega a Lula e MPF diz que governo Dilma foi beneficiado por esquema na Petrobras

  • PAULO WHITAKER

SÃO PAULO/CURITIBA (Reuters) - O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva foi levado para depor nesta sexta-feira em nova etapa da operação Lava Jato sob suspeita de ser beneficiário de crimes envolvendo a Petrobras, aproximando ainda mais a investigação do atual governo.

Pela primeira vez desde o início da Lava Jato, o governo da presidente Dilma Rousseff foi citado pelo Ministério Público Federal (MPF) como favorecido pelo esquema de corrupção e lavagem de dinheiro.

"Fica claro que o benefício político recebido foi basicamente do ex-presidente Lula e atualmente da atual presidente", disse em Curitiba o procurador do Ministério Público Federal Carlos Fernando dos Santos Lima, um dos responsáveis pela força-tarefa da Lava Jato.

Ao mesmo tempo, Lima lembrou que Dilma não é e nem poderia ser investigada pela Lava Jato na capital paranaense. Por ter foro privilegiado, qualquer eventual ação investigativa relacionada à presidente teria que passar pelo Supremo Tribunal Federal (STF), em Brasília.

A 24ª fase da Lava Jato envolvendo Lula, denominada Aletheia, acontece um dia após notícias de que o senador Delcídio do Amaral (PT-MS), ex-líder do governo no Senado, teria acertado delação premiada que detalharia atos ilícitos de Lula e de Dilma.

Cerca de 200 policiais e 30 auditores da Receita Federal cumpriram 34 mandados de busca e apreensão e 11 de condução coercitiva, incluindo o de Lula em São Bernardo de Campo (SP), de acordo com a Polícia Federal.

Segundo o MPF, a nova fase teve por objetivo aprofundar a investigação de possíveis crimes de corrupção e lavagem de dinheiro praticados por meio de pagamentos dissimulados feitos pelo pecuarista José Carlos Bumlai, amigo de Lula, e pelas construtoras OAS e Odebrecht ao ex-presidente e a pessoas associadas.

Lula, além de líder partidário, disse o MPF em nota, era o responsável final pela decisão de quem seriam os diretores da Petrobras e "foi um dos principais beneficiários dos delitos".

"De fato, surgiram evidências de que os crimes o enriqueceram e financiaram campanhas eleitorais e o caixa de sua agremiação política", afirmou o MPF.

O Ministério Público disse ainda que há ainda evidências de que o ex-presidente recebeu, em 2014, pelo menos 1 milhão de reais sem aparente justificativa econômica lícita da OAS, uma das empreiteiras envolvidas na Lava Jato, por meio de reformas e móveis de luxo destinados a apartamento tríplex no Condomínio Solaris, no Guarujá (SP).

Além do tríplex, a PF investiga um sítio em Atibaia (SP), também sob suspeita de ocultação de patrimônio pelo ex-presidente.

Ambos os imóveis foram relacionados com empreiteiras investigadas na Lava Jato. Lula tem negado que seja dono do apartamento no litoral e do sítio no interior paulista.

O ex-presidente depôs durante toda a manhã desta sexta-feira e, após ser liberado, seguiu para a sede do diretório nacional do PT em São Paulo.

À tarde, Lula fez uma pronunciamento à imprensa dizendo estar indignado e que se sentiu como um "prisioneiro" nesta manhã, mas que está disposto a percorrer o país para defender o projeto petista de governo, mesmo sem saber ainda se será candidato novamente a presidente em 2018.

"Hoje, na minha vida, é o dia da indignação, é o dia da falta do respeito democrático, o dia do autoritarismo", disse o ex-presidente na sede do Diretório Nacional do PT.

"A partir da semana que vem, quem quiser um discursinho do Lula é só acertar passagem de avião, que eu estou disposto a andar este país", acrescentou, em mensagem dirigida a movimentos sociais.

Manifestantes a favor e contra o ex-presidente fizeram protestos no aeroporto de Congonhas (SP), onde Lula depôs, e na frente de sua residência em São Bernardo do Campo e do Instituto Lula, também alvo de mandados de busca.

No mercado financeiro, o dólar chegou a cair quase 4 por cento ante o real, diante de apostas de maior chance de troca de governo, com implicações nos cenários político e econômico. O movimento perdeu força após atuação do Banco Central no câmbio.

O Ibovespa, índice que reúne as principais ações brasileiras, avançou 6 por cento na máxima do dia e subia 3,8 por cento a menos de uma hora do fechamento do pregão.

Lula presidiu o Brasil de 2003 a 2010. Ele deixou a Presidência com recordes históricos de aprovação, mas vem perdendo popularidade, segundo pesquisas de opinião, diante das investigações contra ele e do quadro econômico vivido pelo país sob a administração de Dilma, da qual ele é padrinho político.

SURPRESA NO PLANALTO

Embora o Palácio do Planalto já esperasse alguma ação da Lava Jato contra Lula esta semana, foi surpreendido com o mandado de condução coercitiva contra o ex-presidente e os de busca e apreensão envolvendo membros da sua família e pessoas próximas.

Dilma manifestou em nota seu "integral inconformismo" com a condução coercitiva de Lula e classificou a medida como "desnecessária", lembrando que Lula já foi "por várias vezes" prestar esclarecimentos às autoridades de forma espontânea.

A presidente defendeu que o respeito aos direitos individuais pressupõe a adoção de medidas proporcionais "que jamais impliquem em providências mais gravosas do que as necessárias para o esclarecimento de fatos".

O presidente do PT, Rui Falcão, pediu que todos os diretórios estaduais entrem em vigília e disse que o momento é de mobilização dos militantes. Para ele, a nova fase da Lava Jato foi "midiática e policialesca" que visa atingir o PT, Lula e o governo Dilma.

O MPF argumentou que o mandado de condução coercitiva contra Lula foi necessário por questões de segurança, já que um depoimento agendado do ex-presidente implicaria em maior chance de tumulto.

MAIS ENVOLVIDOS

A mais recente fase da Lava Jato ocorreu nos Estados de São Paulo, Rio de Janeiro e Bahia.

Foram alvo de mandados de busca cumpridos pela PF nesta sexta, além do ex-presidente, a empresa de palestas de Lula, a LILS, o Instituto Lula, a ex-primeira-dama Marisa Letícia e os filhos do ex-presidente Fabio Luis, Sandro Luis, Luis Cláudio e Marcos Claudio, que têm participação em empresas investigadas.

Além deles, a PF também fez buscas em endereços ligados a Paulo Okamoto, atual presidente do Instituto Lula, e ao ex-presidente do instituto José de Filippi Júnior, assim como a uma secretária de confiança de Lula.

O MPF chegou a pedir a prisão temporária de Okamoto e José de Filippi, assim como de um executivo da empreiteira OAS, mas o juíz federal Sergio Moro rejeitou. Em vez disso, os três foram levados pela PF para prestar depoimento.

Segundo o MPF, estão sendo investigados pagamentos feitos por construtoras beneficiadas no esquema Petrobras em favor do Instituto Lula e da LILS Palestras, em razão de suspeitas levantadas pelos ingressos e saídas dos valores.

A maior parte do dinheiro que ingressou em ambas as empresas, de 2011 a 2014, veio de empresas do esquema Petrobras, entre elas Camargo Corrêa, OAS, Odebrecht, Andrade Gutierrez, Queiroz Galvão e UTC, disse o MPF.

Segundo MPF, dos 35 milhões de reais que ingressaram no Instituto Lula no período, 20,7 milhões de reais foram repassados pelas empreiteiras. Na LILS Palestra, foram 10 milhões de reais, do total de 21 milhões de reais recebidos.

A Receita Federal, que colabora na Lava Jato, disse haver uma possível "confusão operacional e financeira" entre o Instituto Lula e a LILS Palestras, a primeira isenta de impostos e a segunda com receitas tributadas.

No último sábado, durante comemorações pelo aniversário do PT, Lula disse que tinha sido informado de que teria seus sigilos bancário, telefônico e fiscal quebrados.

"A partir de segunda-feira vão quebrar meus sigilos fiscal, telefônico, tudo, meu da Marisa, da minha netinha e até da minha mãe. Esse é o preço? Eu pago!", disse Lula. "Mas eu duvido que tenha um mais honesto do que eu."

Procuradas, Odebrecht, OAS e Queiroz Galvão disseram que não se pronunciariam sobre o assunto. Camargo Corrêa e Andrade Gutierrez ainda não tinham respondido a pedidos de comentários.

A UTC disse que a LILS Palestras foi contratada para uma conferência de Lula, em dezembro de 2012, na sede da empresa em São Paulo. A companhia afirmou ter repassado ao MPF a documentação relacionada ao evento, incluindo material de divulgação, lista de presentes e cópias das notas fiscais emitidas pela LILS totalizando 357,6 mil reais. A UTC disse ainda não ter feito qualquer doação ao Instituto Lula.

(Por Redação São Paulo; Reportagem adicional de Thais Skodowski, em Curitiba; Texto de Cesar Bianconi; Edição de Raquel Stenzel)

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