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Jornal francês descreve Bolsonaro como "pior inimigo dos índios"

O presidente da República, Jair Bolsonaro (PSL), durante cerimônia de troca da Guarda Presidencial, em frente ao Palácio do Planalto - Mateus Bonomi/Agif/Estadão Conteúdo
O presidente da República, Jair Bolsonaro (PSL), durante cerimônia de troca da Guarda Presidencial, em frente ao Palácio do Planalto Imagem: Mateus Bonomi/Agif/Estadão Conteúdo

09/08/2019 10h08Atualizada em 16/08/2019 15h53

O jornal católico francês 'La Croix' publicou nesta hoje duas matérias em que abordam a situação indígena no Brasil. O presidente Jair Bolsonaro é descrito no título de uma delas como "o pior inimigo das populações indígenas".

Diante do desmatamento na Amazônia, o presidente Jair Bolsonaro contesta os números oficiais e ataca cientistas e ONG's, relata a correspondente especial em São Paulo, Marie Naudascher. Sua matéria traz o caso do chefe indígena Emyra Wajipi, que foi violentamente assassinado no Amapá mês passado.

Seu corpo foi exumado após ter sido encontrado em um rio - o que não é uma prática deste povo -, para que sua morte fosse esclarecida. Ainda assim, antes mesmo da conclusão, Bolsonaro declarou que não havia indícios de que a invasão de 50 garimpeiros nas terras pertencentes à tribo tinha relação com o homicídio, de acordo com o "La Croix".

Opinião contestada pela FUNAI, que afirma que os garimpeiros se sentem encorajados pela política favorável da agroindústria defendida pelo presidente. "A cobiça pelo ouro, manganês e cobre impulsionou a invasão destas terras, delimitadas pelo Estado Brasileiro desde 1996", relatou o jornal.

Segundo a antropóloga Dominique Tilkin Gallois, professora da USP, em entrevista ao jornal, a motivação em querer explorar terras indígenas não pode ser outra além da ideológica. A intenção é ignorar totalmente a realidade dos povos tradicionais e não conceber a ideia de que eles vivam de maneira diferente da dos moradores dos centros urbanos.

Em nota publicada no fim de julho, a Coordenação das organizações indígenas da Amazônia brasileira declarou que Bolsonaro e seus ministros "anti-indígenas" são os seus piores inimigos. Segundo o jornal, eles relembram que durante a campanha os seus chefes foram atacados, criminalizados, em nome do velho discurso do desenvolvimento social e econômico do país.

A correspondente ainda relata que, desde sua chegada ao poder, Bolsonaro adotou medidas claras de favorecimento ao agronegócio, como ter nomeado a chefe do lobby agrícola no congresso, Tereza Cristina, para ser ministra da Agricultura. E também quando retirou da FUNAI a responsabilidade das demarcações, decisão que foi anulada no STF.

A reportagem também repercutiu o desmatamento, que em julho teve um aumento de 278% em comparação com o mesmo mês no ano passado. O jornal ainda destaca que, durante a reunião do G20, Bolsonaro criticou líderes europeus e disse que a Amazônia não os pertencia, e que, para ele, as ONG's querem que os índios continuem "prisioneiros como em um zoológico, ou como homens pré-históricos".

Por fim, a professora da USP Tilkin Gallois disse que as maiores vítimas desta intransigência são os povos da floresta, e constata que os indígenas também deveriam participar dos processos de decisão que dizem respeito a eles mesmos.

A defesa dos indígenas pela igreja Católica na Amazônia

Em outra reportagem do jornal "La Croix", o Conselho Idigenista Missionário (CIMI) é destacado como uma das instituições mais ativas por defender os territórios e os direitos fundamentais dos povos da floresta. A enviada especial do jornal a Atalaia do Norte (AM), Claire Lesegretain, entrevistou a missionária Marta Barral Nieto. De acordo com ela, a Igreja Católica está na região, em primeiro lugar, para proteger a vida dos indígenas e que "muitos índios se dizem católicos, mesmo se não são batizados ou nunca tenham ido à igreja, porque eles sabem que a Igreja os respeita".

A missionária ainda disse ao jornal que os indígenas sabem diferenciar os católicos dos grupos neopentecostais que estão se implantando cada vez mais na região, e recebendo ajuda do governo, com o intuito de "catequizá-los". Segundo o padre italiano Alberto Panichella, os evangélicos estão proibindo os índios de tatuar ou pintar seus corpos, e estão os aterrorizando por causa de seus "fetiches e totens", relata o jornal.

Os dois missionários trabalham no CIMI, conselho fundado pela CNBB, afim de apoiar as 305 etnias indígenas que existem no Brasil. "O objetivo do Cimi não é levar o evangelho às comunidades - porque queremos respeitar sua religião natural -, mas ajudá-las a enfrentar as muitas dificuldades que enfrentam", afirmam.

A reportagem ainda conversou com o indígena da etnia Marubo, Cloves Marubo, que alertou sobre os perigos cotidianos vividos pelos povos desta região. "Estamos ameaçados dentro de nossas reservas [8 milhões de hectares para os 16 grupos étnicos que vivem na bacia do Javari] pelos traficantes de madeira e pelos proprietários de fazendas, pelos caçadores furtivos que pilham ovos de tartaruga, por mineradores subterrâneos... A Funai não tem mais meios para manter seus postos militares e proteger as demarcações de nossas terras. Só a Igreja Católica nos ajuda, através do (Cimi) e da Rede Eclesial Pan-Amazônica (Repam)."