Na onda das rádios pela web, estações de música mantêm seu terreno

Nick Wingfield

Em Seattle (EUA)

  • Ruth Fremson/The New York Times

    Mapa com as marcações das cidades em que ouvintes já escreveram para a rádio KEXP

    Mapa com as marcações das cidades em que ouvintes já escreveram para a rádio KEXP

Era para a rádio pela internet ter esmagado todas as estações de FM como a KEXP. Mas esqueceram de dizer isso para a KEXP, a pequena estação que ajudou a iniciar a carreira de grandes sucessos musicais como a banda Lumineers e a dupla Macklemore e Ryan Lewis.

Na semana passada, John Richards, o DJ da manhã da KEXP, andava pela sede nova da estação, não muito longe do Space Needle, em Seattle (EUA). É um projeto de US$ 15 milhões (R$ 56 milhões) com o objetivo de fazer a estação evoluir de uma emissora musical de cimento e tijolos para a era da internet.

Enquanto os funcionários davam os últimos retoques no amplo espaço para shows perto da entrada do edifício, Richards apontou para um canto que eventualmente terá um café e outro que abrigará uma loja de discos. Uma grande janela à prova de som dava um aspecto de aquário à cabine em que Richards e outros DJs iniciarão a transmissão a partir do mês que vem.

"Parece o 'Star Trek' aqui dentro", disse Richards, inspecionando os consoles eletrônicos, microfones e monitores de computador dentro da cabine.

Os fãs de música vivem uma época de abundância, quando quase todas as músicas de qualquer estilo musical podem ser ouvidas num instante pela internet. Rádios comerciais e via satélite lotam as ondas aéreas com mais opções para descobrir músicas novas e ouvir sucessos antigos.

Ainda assim, um punhado de estações de música sem fins lucrativos como a KEXP, com raízes nas rádios universitárias, nunca estiveram tão bem. Elas estão usando a internet para atingir um público maior no mundo todo, aumentando sua programação em vídeo e se transformando em destinos mais pessoais para os fãs.

Acima de tudo, elas estão tentando se destacar com sua programação musical, com misturas de gêneros selecionadas por DJs e não por softwares, e nem ditadas pelos diretores do programação das redes comerciais de rádio.

A abundância de música e métodos de distribuição aumentou a demanda por "guias turísticos" humanos para tudo isso.

"Há tanta música por aí, tantos lugares para ir", disse Roger LaMay, gerente geral da WXPN, uma estação de música pública da Filadélfia, e presidente do conselho da National Public Radio. "Mas encontrar uma seleção feita por uma fonte confiável é uma tábua de salvação para a maioria dos amantes da música que não têm tempo ou recursos para peneirar tudo por conta própria."

A KCRW, uma estação de rádio pública no sul da Califórnia, é outra criadora de tendências. No final do próximo ano, a estação planeja se mudar do seu estúdio no porão do refeitório do Santa Monica College para uma instalação de US$ 48 milhões (R$ 182 milhões), com espaço para shows.

"O que ajudou a KEXP e a KCRW é que nós não somos rádios tradicionais", disse Jennifer Ferro, presidente da KCRW. "Estamos realmente formando essa tribo de pessoas interessadas em descobrir música e curiosas pelo mundo."

Até a Apple tem se tornado mais simpática a esta abordagem, lançando um elemento humano no serviço Apple Music com a Beats 1, uma estação de rádio ao vivo ancorada por Zane Lowe, ex-DJ de rádio da BBC, e outros formadores de opinião.

Uma das especialidades da KEXP são os programas temáticas para viciados em música, em vez de transmitir sucessos pop. Em julho, ela dedicou 12 horas a uma desconstrução meticulosa de "Paul's Boutique" o álbum seminal dos Beastie Boys, tocando cada faixa do disco junto com as amostras originais que eles gravaram. Os fãs de música deliraram nas mídias sociais.

Os DJs da estação são Wikipedias ambulantes sobre música, e não aquelas personalidades das rádios comerciais que parecem ter tomado uns expressos a mais. Mike McCready, o guitarrista principal da banda de rock Pearl Jam, escolheu elogiar um programa em que Kevin Cole, um DJ da KEXP, tocou músicas de todas as bandas que foram inspiradas por estarem presentes em um dos primeiros shows do Sex Pistos, influente banda de punk rock.

A KEXP não chega nem perto das dezenas de milhões de ouvintes de um canal na internet, e provavelmente nunca chegará. Ela atinge cerca de 206 mil ouvintes por semana, pouco mais de um quarto dos quais ouve a estação pela internet. Isso é mais de três vezes o público que tinha há 15 anos. Nova York é a segunda maior fonte de ouvintes online, depois da região de Seattle-Tacoma.

Como uma organização sem fins lucrativos, ela não precisa disputar os ouvidos das pessoas como suas rivais comerciais. A KEXP recebe cerca de metade do seu orçamento operacional anual de US$ 6 milhões (R$ 22 milhões) de doações de ouvintes, enquanto o resto vem de bolsas, financiamento corporativo e outras fontes.

A KEXP expandiu significativamente sua audiência através de um canal no YouTube, onde apresenta sessões com músicos em seus estúdios e em festivais de música pelo mundo inteiro. Ela postou mais de 500 vídeos assim no ano passado e seu canal tem cerca de 743 mil espectadores por semana.

Seu vídeo mais popular, com quase 30 milhões de visualizações, mostra Macklemore e Ryan Lewis, a dupla de hip-hop de Seattle, cantando "Can't Hold Us" quatro anos atrás, quando eles estavam à beira da fama. "Aquele foi um momento em que sabíamos que havia algo especial", disse Richards.

Nos escritórios precários e apertados que a KEXP ocupa atualmente em Seattle, uma banheiro está quebrado e a estação comprou uma privada portátil de barco no caso de o outro quebrar. O pequeno estúdio de gravação da estação é decorado com cortinas pretas baratas e luzes de Natal.

A nova sede é um palácio em comparação, com lavanderia, chuveiros e armários individuais para tornar o lugar mais confortável para as bandas em turnê. A KEXP vai gravar vídeos das sessões ao vivo com as bandas num novo espaço de shows de US$ 500 mil (R$ 1,89 milhão), com uma área para uma plateia de 75 pessoas.

"Nós quase não nos chamamos de estação de rádio", disse Richards. "Fazemos muito mais do que isso. Nós nos vemos como uma organização de mídia, uma organização comunitária."

Tradutor: Eloise De Vylder

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