Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.
Você tem coragem de ir às aulas neste aniversário de Columbine?
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As mensagens se alastram em fóruns, grupos de WhatsApp, chats de games e nas redes sociais.
— Estão dizendo que vão entrar em um monte de escolas.
— Atirando, é claro, como fizeram em Columbine, vinte e quatro anos atrás.
— Dia 20, né? Bem que disseram no outro grupo.
— Ouvi dizer que vão botar bombas.
— Machado. Outro dia teve um que usou um machado.
— É boato, gente. Fake news. Vocês precisam parar de acreditar em tudo.
— O caso do machado é fake news?
— Não, essa história de atentado no dia 20.
— Mano, é sério que vocês acham que nossa escola é pouco segura?
— Uai, de que adianta ter catraca? E se for algum aluno da própria escola?
— Bullying. Dizem que esses caras são trollados pelos colegas e professores, até o dia em que um resolve fazer uma merda pra chamar atenção, pra provar que é macho.
— Precisa reforçar o policiamento, botar a ronda escolar.
— Ah, tá. E a ronda escolar vai fazer o quê, cabeção? Prender o cara depois que ele matar quatro? De que adianta?
Pronto. Não precisa mais do que isso para instalar o pânico. E se rolar? Você vai pagar pra ver?
"Papai, uns colegas estão dizendo no grupo que não vão à aula no dia 20", meu filho veio me contar. "Não sou louca de arriscar; minha filha vai ficar em casa", me disse uma mãe.
Terrorismo é o nome genérico que se dá a diferentes usos da violência, inclusive a psicológica, a fim de provocar medo, insegurança ou intimidação. O sequestro de aviões por fundamentalistas religiosos para a explosão de edifícios icônicos cheios de gente, como o World Trade Center ou o Pentágono. Uma bomba colocada por um grupo separatista numa estação de metrô ou num monumento turístico.
Numa das primeiras cenas do filmaço "Os Intocáveis", a saga de Eliot Ness contra Al Capone, que ninguém mais assiste (mas deveria), uma garotinha percebe que um sujeito esqueceu uma valise na lavanderia, corre para entregá-la e... BUM!
Nos anos de chumbo no Brasil, milicos e policiais deram de chamar de ações terroristas os assaltos a bancos praticados por organizações de resistência à ditadura a fim de obter recursos para sustentar a vida na clandestinidade, a locação de aparelhos e demais atividades necessárias à guerrilha. Os ativistas chamavam de "expropriação bancária". Roubavam contestando em voz alta a truculência da repressão, denunciavam as torturas, diziam que nenhum dos clientes seria prejudicado. "Terroristas procurados", alertavam cartazes com rostos de bandidos perigosos como Carlos Lamarca, Iara Iavelberg e Carlos Marighella. "Ajude-nos a proteger sua própria vida e a de seus familiares".
Tem também o terrorismo de Estado, sistemático no Brasil desde tempos imemoriais. O desterro, o pelourinho, a forca (hoje festejamos Tiradentes, veja só), a decapitação sumária seguida de exposição pública (Lampião, Maria Bonita, Corisco, presentes!), a condução coercitiva, a delação premiada, são todos recursos empregados com a meta de disseminar o pânico. Quem não delatar continua preso, ameaçavam, a viva voz ou na surdina, os terroristas da Lava Jato. Bem-vindo à sucursal do inferno, diziam os torturadores enquanto se preparavam para pendurar os militantes de esquerda no pau-de-arara ou amarrá-los na cadeira-do-dragão.
Afogamentos, choques elétricos, estupros, é extenso o rol de técnicas de terrorismo utilizadas naquele período. Para torturar Rose Nogueira, que havia dado à luz 33 dias antes, fizeram seu leite secar e ameaçaram machucar o menino. Para torturar Amelinha Teles, trouxeram à cela seus dois filhos, um casal de 4 e 7 anos, com a ameaça de que ambos poderiam sofrer violências semelhantes às que ela acabara de encarar. Para torturar Miriam Leitão, grávida, deixaram-na sozinha na solitária com uma jiboia.
O nome disso é terrorismo de Estado, como são terrorismo de Estado o extermínio praticado pela polícia militar nas favelas, a tortura que ainda impera em tantas delegacias, o desaparecimento forçado (onde está Amarildo?) ou a escabrosa insistência, amparada por um STF abjeto, em não punir torturadores.
A quem serve o terrorismo instalado no Brasil nas últimas semanas em torno dos massacres e demais episódios de violência nas escolas? A meia dúzia de arruaceiros? A uma extrema-direita imbecilizada que insiste em boicotar a escola, a educação, o pensamento crítico? Aos mesmos lunáticos que detonam Paulo Freire, elogiam Olavo de Carvalho e cultuam Brilhante Ustra? Aos entusiastas do homeschooling e aos que estão convencidos de que sala de aula é coisa do passado? Aos que promovem a barbárie, incendiando a opinião pública e as instituições, promovendo quebra-quebra não apenas na Praça dos Três Poderes, mas também no zap-zap e nas timelines?
Terrorismos precisam ser contidos. Não com terrorismo de Estado, evidentemente, mas com leis, regras, pedagogia e muita saliva: educação para a cidadania, educação em democracia, educação em direitos humanos. Incitar violência, fazer vista grossa para discurso de ódio ou apologia a crimes e criminosos, agarrar-se a uma pretensa liberdade de expressão para justificar a leniência diante de plataformas infestadas de ameaças, ofensas e desinformação, tudo isso contribui para o cenário de terror que nos cerca.
— Mas, professor, você vai dar aula, mesmo sabendo de tudo isso?
Vou. Se não formos à aula, o terrorismo terá vencido, e essa gente terá alcançado seu objetivo. Por via das dúvidas, não haverá seminários nem atividade para nota. Cada um sabe onde seu calo aperta.
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