Deputado bolsonarista desafia estado e refaz muro derrubado em praia de PE
Poucas horas após o início da demolição do muro de mais de 500 metros erguido na praia do Pontal de Maracaípe, no município de Ipojuca, no litoral sul de Pernambuco, o deputado federal bolsonarista Coronel Meira (PL) anunciou em seu perfil nas redes sociais que a estrutura estava sendo reconstruída. Ao lado do dono do terreno, o empresário João Vita Fragoso de Medeiros, Meira classificou a derrubada da estrutura como "ilegal" e criticou a Secretaria de Meio Ambiente do Estado.
O Governo de Pernambuco, por meio da CPRH (Agência Estadual de Meio Ambiente), autorizou a derrubada do muro na terça-feira (15). A operação começou à tarde e continuaria nesta quarta-feira (15), segundo a agência. Em nota, a CPRH informou ontem que não havia nenhuma justificativa que amparasse a permanência da estrutura. Cerca de 100 metros da barreira de contenção haviam sido retirados por agentes do governo pernambucano e pela Polícia Militar.
Mas, por volta das 20h de ontem, o deputado Meira e o proprietário do terreno foram ao local e iniciaram uma operação para reconstruir o muro. Em um vídeo publicado nas redes sociais, o parlamentar aparece ao lado de João Vita Fragoso e afirma que a derrubada de parte do muro seria um "crime ambiental".
Na manhã de hoje, toda a estrutura derrubada havia sido reconstruída.
Vídeos obtidos pela reportagem mostram um grupo de pessoas, com a ajuda de um trator, recolocando os coqueiros. Em entrevista ao UOL, Fragoso explicou que recebeu ajuda dos próprios barraqueiros que trabalham no Pontal de Maracaípe.
O muro, que tem 576 metros de extensão, é feito com troncos de coqueiro firmados no chão com sacos de ráfia com areia. A construção foi autorizada pela própria CPRH, em 2022, mas ele teria sido erguida fora dos parâmetros e por isso foi derrubada. A liberação previa metade do comprimento: apenas 250 metros.
O que alega o proprietário
O dono do terreno afirma que a barreira de contenção foi feita para proteger uma área de preservação ambiental da erosão. Fragoso também detalhou que o caso está sendo analisado na Justiça Federal e que não há nenhuma decisão determinando a derrubada do muro.
"A barreira de contenção tem que ficar até a realização de uma perícia determinada pela Justiça Federal para saber se o muro invade a praia, se é prejudicial ou se protege o meio ambiente, como eu venho falando. A CPRH veio ontem, com ajuda da Polícia Militar, sem mandado, sem ordem judicial e sem oficial de justiça, e derrubou 70 metros desse muro, eu tentei argumentar, mas eles passaram o trator. Das 20h às 3h da madrugada, nós reconstruímos com a ajuda dos barraqueiros que trabalham no Pontal", afirma Fragoso.
Fragoso disse ainda que vai "cobrar na Justiça as consequências para os responsáveis desses atos". "O TRF-5, por unanimidade, sabe que tem uma perícia para ser feita aqui no Pontal para ver se essa barreira de contenção tem ou não de ser realizada. Eu só posso acreditar que a CPRH está com medo do resultado dessa perícia".
O deputado Meira declarou que o muro "está absolutamente dentro de todos os critérios legais" e afirmou que o caso está no Tribunal Regional Federal da 5ª Região, que determinou perícia no local para confirmar a necessidade da proteção.
O UOL entrou em contato com a CPRH para esclarecer de quem partiu a autorização da derrubada do muro, mas não houve retorno. O espaço segue aberto para manifestação.
A reportagem também entrou em contato com o TRF-5 para esclarecer detalhes do processo. Em nota, o órgão afirmou que, por unanimidade, negou provimento ao agravo de instrumento interposto pelo Ministério Público Federal que determinou a remoção do muro.
O Tribunal entendeu que o deferimento do pedido do MPF esbarra na imprecisão acerca de questões cruciais, notadamente quando diz que "foi extrapolada a área particular e alcançada área da União". Para a Turma, é fundamental saber: Há dano ambiental? Qual a extensão do dano? O muro de contenção marítima foi construído em desacordo com as autorizações emitidas pela Agência Estadual do Meio Ambiente. Sem a resposta para tais quesitos, a concessão da liminar fundamentada única e estritamente no princípio da precaução representaria afronta à proporcionalidade, pois é oneroso e açodado impor ao particular a imediata demolição do muro construído com autorização do ente público estadual, sem aprofundamento da matéria e a produção de provas para deslinde da questão controvertida.
Tribunal Regional Federal da 5ª Região
Governo de Pernambuco diz que muro é ilegal; Ibama aponta prejuízo ao ecossistema
O muro restringia acesso de barraqueiros, turistas e moradores locais à faixa de areia e ao manguezal, segundo a CPRH. De acordo com a agência, a estrutura foi erguida em área de preservação ambiental e invadiu a faixa de praia, prejudicando a fauna e a flora locais.
Ainda segundo a CPRH, o muro de contenção provocou danos à vegetação de restinga, está impedindo a desova de tartarugas, restringindo o acesso da população à praia, causando desequilíbrio na disposição de sedimentos na área e agravando o risco de erosão costeira no seu entorno.
Em dezembro de 2023, o Ibama visitou o local após denúncia da Associação dos Moradores e Pescadores das Áreas de Mangue de Ipojuca. O relatório da visita foi publicado em 4 de março de 2024 e apontou que o muro foi feito com 576 metros de extensão "em área de praia, cercando todo o Pontal de Maracaípe". A obra tem formato de "U" e dificulta o acesso ao local, segundo o instituto.
Esta grande obra, que viola em mais de duas vezes a autorização ambiental, gera um impacto sem precedentes naquele pontal. Como agravante, este muro está instalado na foz do rio Maracaípe, um local ecologicamente sensível e um dos principais ecossistemas que depositam sedimentos na praia.
Relatório do Ibama
O instituto ambiental destacou que o muro "acentua a erosão costeira" e prejudica o ecossistema.
Por fim, o Ibama afirma que a obra fere o direito de acesso às praias. O órgão diz ainda que são "bens públicos de uso comum do povo, sendo assegurado o livre e franco acesso a elas e ao mar, em qualquer direção e sentido".
Verifica-se basicamente que há mudanças sazonais na dinâmica de sedimentos costeiros decorrente do fluxo e refluxo da maré. Não foi identificado evento extremo com impacto adverso no transporte de sedimentos que justificasse a construção do muro objeto de ação fiscalizatória.
Relatório do Ibama
Diante das irregularidades, a CPRH notificou o proprietário da área em junho de 2024. A agência o informou sobre o cancelamento da autorização e deu cinco dias úteis para retirada do muro. O órgão também pediu investigação para apurar os supostos excessos cometidos com o muro.
Às vésperas do prazo se encerrar, a juíza Nahiane Ramalho de Mattos, da Vara da Fazenda Pública de Ipojuca, acolheu pedido do proprietário da área e proibiu a CPRH de fazer a retirada do muro. A agência recorreu ao TJPE, que manteve a liminar até o julgamento do caso, que ocorreu em outubro e lhe deu ganho de causa.
Em outubro, o Tribunal de Justiça de Pernambuco autorizou a demolição do muro. Mas, segundo o TJPE, a decisão não tem mais validade já que o caso agora está em tramitação na Justiça Federal de Pernambuco.
Em nota, o TJPE esclareceu que a União manifestou interesse no processo, alegando que a questão tinha conexão com uma ação civil pública em tramitação perante a 35ª Vara Federal da Seção Judiciária de Pernambuco. "A manifestação de interesse da União implica automaticamente o deslocamento da competência da Justiça Estadual para a Justiça Federal, abrangendo inclusive os recursos interpostos no segundo grau".
Dono do terreno diz que muro preserva o manguezal
João Vita Fragoso de Medeiros alegou que tinhas as autorizações necessárias para a permanência do muro. Ele afirmou ainda que a CPRH estaria agindo de forma abusiva.
Esse muro preserva o Pontal porque depois que fizeram obras do outro lado do rio, o mar começou a avançar em direção ao Pontal de Maracaípe. Está chegando em uma fase que se ele romper vai avançar sobre o mangue e isso vai ser prejudicial, pode mudar a salinidade da água, a reprodução dos animais. Estou lutando para preservar o meio ambiente em uma propriedade que é minha há 51 anos. Eu não tenho interesse de construir nada aqui, mas tenho a obrigação de preservar.
João Vita Fragoso de Medeiros
O muro foi construído em julho 2022. Na ocasião, a CPRH concedeu uma autorização de construção para o empresário João Vita Fragoso, dono de quatro terrenos em Maracaípe, segundo registros do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária. Conforme o órgão estadual, a autorização dava direito ao dono da área a fazer a obra com 250 metros de extensão usando troncos de coqueiros e sacos de fibra têxtil de palmeiras.
À época, ele alegou que o muro era necessário porque estaria havendo erosão costeira no local. A autorização era válida por um ano. Já em setembro de 2023, a CPRH emitiu uma nova autorização — que também seria válida por 12 meses — para que fosse feita uma manutenção do muro.
Pedi a autorização para cercar o lugar. Eles verificaram e autorizaram. Fui na CPRH para pedir a autorização para construir a barreira de contenção e fiz 250 metros de muro com coqueiros, do jeito que exigiram. No restante da propriedade, que é particular e minha há mais de 51 anos, eu também cerquei com coqueiros. Mas o caso começou a ser politizado. Em julho do ano passado, fizeram uma vistoria e disseram que estava tudo certo. Depois, a CPRH mudou a versão e afirmou que o muro não poderia ficar. O caso saiu da Justiça Estadual e foi para a Federal. O Ministério Público Federal entrou com uma ação para derrubar o muro, mas o juiz negou. No TRF-5 foi julgado esse agravo e a decisão é de que não pode mexer na barreira de contenção porque precisa ser feita uma perícia no local.
João Vita Fragoso de Medeiros
90 comentários
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Fábio Cardoso de Souza
Assim é a privatização das praias da turma do Bolsonaro
Alexandre Horta Azeredo
Perde tempo não, prende o sujeito e sua turma, derruba e cobra deles o serviço. Ponto
Fernando Martins de Oliveira
É isso aí mais coronel acima da lei.