Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.
Todo dia alguém discursa em defesa da democracia no Brasil e isso preocupa
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O Brasil inaugurou neste ano uma forma peculiar de democracia: aquela que precisa ser defendida em cada esquina, a toda hora. A Constituição de 1988 é o marco da consolidação da democracia no país. Até dia desses, não havia dúvida sobre a estabilidade do sistema político. Agora, o vento mudou. Toda vez que uma pessoa pública sai em defesa da democracia, vem a mensagem subliminar de que, talvez, a situação seja preocupante.
Em discurso proferido hoje, o presidente do TSE (Tribunal Superior Eleitoral), Luís Roberto Barroso, precisou dizer que o Brasil terá eleições livres em 2022. Disse também que as instituições funcionam e, daqui um ano, elas continuarão firmes. O ministro acrescentou que, diante dos ataques constantes, o Congresso Nacional, o STF (Supremo Tribunal Federal) e o TSE têm sido bons guardiões da democracia.
"Que tempos são estes, em que temos que defender o óbvio?", perguntaria Bertold Brecht. Barroso tem a resposta. Segundo o ministro, a erosão da democracia no mundo tem sido protagonizada por lideres políticos eleitos pelo voto popular e que, "tijolo por tijolo, desconstroem alguns pilares da democracia, concentrando o poder no Executivo".
Barroso afirmou que esses líderes políticos mudam a legislação com abuso de poder e atacam tribunais constitucionais e autoridades eleitorais. Ele não mencionou o nome do presidente Jair Bolsonaro - mas, para bom entendedor, um pingo é letra. Antes de Barroso, outros integrantes da cúpula do Judiciário precisaram fazer declarações públicas em defesa da democracia - como o presidente do STF, Luiz Fux, e a vice, Rosa Weber.
A democracia que precisa ser defendida a cada minuto foi inaugurada junto com os ataques de Bolsonaro às instituições, que chegaram ao ápice neste ano. Bolsonaro disse que, sem voto impresso, não poderia haver eleições em 2022. Recuou depois. O presidente chamou Barroso de "imbecil", "idiota" e "filho da puta". Também recuou depois. Teve também a declaração de que não cumpriria ordem do ministro Alexandre de Moraes. Recuou, como de costume.
A militância, no entanto, está interessada em legitimar o presidente que quer "mudar tudo o que tá aí, ok?", como diria o candidato vitorioso na campanha de 2018. Os recuos posteriores pouco importam. Ninguém acredita neles - nem a claque, muito menos parlamentares e ministros do Judiciário.
A cada declaração de ódio contra as instituições, Bolsonaro conclama seus militantes mais fiéis a repetirem o gesto. Especialmente nas redes sociais, apoiadores do mandatário pesam a mão nos ataques ao STF e ao Congresso. Em casos extremos, chegam a ameaçar os ministros. Exemplo disso é Roberto Jefferson, presidente do PTB e aspirante a amigo do presidente. Acabou preso. O deputado Daniel Silveira, outro bolsonarista convicto, teve o mesmo destino, pelo mesmo motivo.
O Brasil vive tempos estranhos, como diria Marco Aurélio Mello, ministro aposentado do STF. É um tempo em que a defesa da democracia não se limita mais aos discursos. Foi preciso fazer uma escalada para os decretos de prisão como forma de provar que as instituições estão funcionando.
Não precisa ter bola de cristal para prever que, se Bolsonaro for derrotado nas urnas em 2022, a militância vai aumentar a carga dos ataques às instituições. Alguns ministros do STF e do TSE temem um levante nos moldes do que aconteceu nos Estados Unidos, onde defensores de Donald Trump tentaram invadir o Capitólio. Se os bolsonaristas chegarem a esse ponto no Brasil - aí sim, será a hora de verificar se as instituições são fortes o suficiente para defender a democracia.
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