Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.
Não é 'fake news': Brasil avançou na luta contra desinformação
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Deve ser um delírio momentâneo. Uma fase de otimismo exagerado. Mas uma coleção de eventos recentes indica que, a um ano das eleições, o Brasil pode estar mais preparado do que nunca para fazer frente às notícias falsas.
Pela primeira vez na história, o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) cassou um mandato político em consequência da desinformação. Se os recursos não prosperarem, o deputado estadual Fernando Francischini (PSL-PR) pode ficar inelegível por oito anos por ter feito uma live disseminando ataques mentirosos contra as urnas eletrônicas. O caso abre um importante precedente para as eleições de 2022.
Antes disso, o Brasil assistiu ao desfecho da CPI da Pandemia. É fato que o relatório final poderia ter se aprofundado mais na avalanche de inverdades ouvidas na comissão. Mas o relator, senador Renan Calheiros (MDB-AL), detalhou no documento ao menos sete terríveis ondas desinformativas que tomaram conta do Brasil durante a pandemia. Falou das mentiras que circularam no país sobre a origem do vírus, o isolamento social, a responsabilidade do presidente Jair Bolsonaro na política sanitária, o maldito "tratamento precoce", a distorção de estatísticas sanitárias, o uso de máscaras e e os ataques às vacinas. Não fosse pela extensa cobertura midiática da CPI e do trabalho dos senadores para manter os holofotes na questão desinformativa, certamente haveria mais brasileiros acreditando nas mentiras sobre a covid-19.
Ainda no que diz respeito à pandemia, vale destacar que apesar do insistente discurso negacionista e antivacina de Bolsonaro, mais de 54% da população brasileira já está totalmente imunizada com duas injeções (ou dose única) contra o novo coronavírus. Será que os últimos anos de mentiras torrenciais fizeram com que desenvolvêssemos um anticorpo?
Lembre-se que, em setembro, o país também assistiu boquiaberto ao momento em que caminhoneiros em início de greve duvidaram de um áudio (verdadeiro) transmitido por WhatsApp pelo presidente Bolsonaro.
Para quem batalha contra as mentiras que circulam por universos criptografados, essa foi uma baita vitória. Ao que tudo indica novas camadas sociais se antenaram para a possibilidade de um áudio ser mentiroso ou manipulado - e já parecem dispostas a colocar esse tipo de conteúdo à prova.
E as redes sociais? Se a Justiça Eleitoral deu passos amplos e certeiros na luta contra a desinformação, se o Legislativo fez seu trabalho crucificando mentiras pandêmicas, se a sociedade dá sinais de já reconhecer notícias falsas, como andam as plataformas tecnológicas que - sem sombra de dúvidas - servem de palco para toda essa avalanche de falsidades?
Pois avançaram! Se em 2018, o WhatsApp tinha apenas sete pessoas cuidando da eleição presidencial do Brasil a partir de um escritório nos Estados Unidos, hoje a estrutura é maior e está enraizada no Brasil. Se em 2018 o YouTube não se mostrava preocupado com a difusão de vídeos falsos, hoje, tem representante no país e já se mostrou disposto a derrubar canais inteiros por disseminarem mentiras. O Facebook e o Instagram ampliaram a parceria com os checadores. Em 2018, o programa de verificação de notícias contava apenas com Lupa, Aos Fatos e AFP. Hoje também tem Estadão Verifica - e as quatro organizações aumentaram consideravelmente suas equipes e sua capacidade de produção.
Isso tudo resolve o problema que vemos logo ali, no horizonte? Não. Haverá toneladas de notícias falsas na eleição de 2022, mas não há dúvidas de que o Brasil aprendeu muito sobre o tema e parece melhor equipado para reencontrar as urnas eletrônicas.
Cristina Tardáguila é diretora sênior de programas do ICFJ e fundadora da Agência Lupa
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