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Correntes de WhatsApp impedem que corte no Auxílio Brasil arranhe Bolsonaro
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Para quem ainda duvidava da capacidade do bolsonarismo de fazer de um limão uma limonada, ou seja, de criar uma narrativa que lhe é favorável e de impulsioná-la em ambientes criptografados, hoje há mais uma prova.
Apesar de ter sido flagrado numa evidente contradição sobre o futuro do Auxílio Brasil e de ter reduzido o valor médio desse apoio emergencial em quase duzentos reais para o ano que vem, o presidente-candidato conseguiu colher elogios e manter sua popularidade no WhatsApp.
Na noite do último domingo (28), o país escutou da boca de Bolsonaro a seguinte frase:
"No momento, o Auxílio Brasil é de R$ 600. E nós vamos manter esse valor a partir do ano que vem. Tá?".
O presidente participava do debate promovido pela Band, TV Cultura, Folha e UOL, junto com outros candidatos ao Palácio do Planalto e havia sido questionado sobre o assunto. Na tarde de ontem (31), no entanto, os brasileiros souberam que o governo federal havia mandado para aprovação do Congresso uma Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) que fixava o valor médio do Auxílio Brasil para o ano que vem em R$ 405. Longe dos R$ 600 prometidos na TV.
Monitor desenvolvido pela empresa Palver para acompanhar — de forma anonimizada — cerca de 14 mil grupos públicos que falam sobre política nacional no aplicativo de mensagens mais usado do país mostra que, em vez de ser criticado, Bolsonaro colheu frutos frondosos desse episódio.
Desde o domingo (28) o tema "Auxílio Brasil" conjugado com a palavra "Bolsonaro" registrou forte alta, e a maior parte das menções foram positivas para o presidente. Veja os gráficos abaixo:
Em 29 de agosto, dia seguinte ao debate da Band, 38,4% de todas as mensagens coletadas sobre "auxílio Brasil" e "Bolsonaro" foram classificadas como positivas para o presidente-candidato. As neutras chegavam a 42,2%, e as negativas não passavam de 19,2%. Ontem (31), após a contradição e o corte no valor, as menções positivas passavam de 54%, as neutras estavam em 29,6%, e as negativas haviam caído para 15,7%.
Ou seja: mais da metade de tudo que se falou no WhatsApp sobre o Auxílio Brasil ao longo desta semana foi bom para Bolsonaro.
E como isso é possível? Sabendo usar a plataforma.
Uma das mensagens mais populares captadas pelo sistema da Palver — conteúdo que circulou pelos DDDs 75 e 73 (na Bahia), 22 (no Rio de Janeiro) e, 43 (no Paraná) — contém uma lista de 60 itens intitulada "Se alguém te perguntar o que foi que Bolsonaro fez de bom para o Brasil, mostre essa lista abaixo com algumas coisas que ele fez".
No item 19, aparece a referência ao Auxílio Brasil: "Aumentou de 180,00 no Bolsa Família para 600,00 com o programa Auxílio Brasil".
Ou seja: ao construir a narrativa positiva, o bolsonarismo preferiu olhar para trás e ignorar o que vem pela frente. E a estratégia funcionou.
É claro que a história contada no digital sobre o auxílio emergencial anda de braços dados com declarações feitas pelo presidente no mundo real. O fato de Bolsonaro ter dito que poderia vender uma estatal para garantir a volta do Auxílio Brasil ao patamar de R$ 600 encontrou adeptos. A promessa de que seu governo vai envidar os maiores esforços para elevar o valor fixado na LDO (Lei de Diretrizes Orçamentárias) desta semana também mereceu reconhecimento.
Pena que, no mundinho do WhatsApp, ninguém parece saber que, quem quer que seja o próximo presidente do Brasil, terá que respeitar a Lei de Teto de Gastos. E ela não comporta (sem consideráveis mudanças) os R$ 600 prometidos no domingo.
Em um país onde quase 19 milhões de pessoas estão desempregadas e quase 40 milhões têm trabalhos informais, uma limonada é bem melhor do que um limão azedo: R$ 405 no bolso é fartura frente ao nada.
Cristina Tardáguila é diretora do ICFJ e fundadora da Lupa
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