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Cristina Tardáguila

OPINIÃO

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

Última cartada: TSE vota se Moraes pode ampliar seu vale-tudo contra fakes

Ministro Alexandre de Moraes, presidente do TSE - Antonio Augusto/Secom/TSE
Ministro Alexandre de Moraes, presidente do TSE Imagem: Antonio Augusto/Secom/TSE

Colunista do UOL

20/10/2022 04h00

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O Tribunal Superior Eleitoral (TSE) decide nesta quinta-feira (20) se, na luta contra as notícias falsas e os conteúdos antidemocráticos que viralizam nas redes sociais, vale tudo ou não.

O ministro Alexandre de Moraes levará à sessão plenária desta manhã uma resolução que deve dar ao TSE o direito de, sem que tenha sido acionado por qualquer outra entidade ou indivíduo, determinar a remoção imediata de conteúdos que falem sobre o processo eleitoral - material que, aos olhos do tribunal (sozinho), seja considerado falso.

Quem está no front do combate às "fake news" sabe que não existe medida semelhante em nenhum outro país democrático e também não viu nos rascunhos da resolução nenhuma informação detalhada sobre o nível ou os processos de transparência que o TSE adotaria nesse cenário. Que indivíduos apontarão os links a serem derrubados judicialmente? Que formação eles têm e que critérios adotarão? Como definirão o que é falso e/ou antidemocrático?

É claro que ninguém duvida de que a democracia brasileira corre risco, que as narrativas sobre fraude eleitoral são fortes e que ganharão ainda mais vulto nos próximos dias. Também é verdade que as urnas eletrônicas são auditáveis e que não há - nem nunca houve - qualquer indício de que os resultados de uma eleição ocorrida no Brasil depois de 1996 tenham sido manipulados ou alterados. Ou seja, o processo eleitoral brasileiro é confiável, e isso precisa ser de amplo conhecimento da nação.

Mas talvez seja hora de debater o tamanho do poder do ministro Alexandre de Moraes e do TSE - partes obviamente envolvidas no combate às notícias falsas eleitorais. Estaria o ministro exportando para o TSE a lógica que aplicou no polêmico inquérito das fake news, aberto em 2019 no Supremo Tribunal Federal (STF)? E, será que, para combater a ameaça antidemocrática, o Brasil topa que o TSE exerça - ao mesmo tempo - o papel de advogado, juiz e oficial de justiça?

Vejamos um caso concreto.

No fim de semana do primeiro turno, viralizou pelas redes sociais e aplicativos de mensagem um vídeo que mostrava funcionários do Tribunal Regional Eleitoral de São Paulo (TRE-SP) preparando urnas eletrônicas dentro de um sindicato em Itapeva (SP). A gravação vinha acompanhada de mensagens que sugeriam irregularidades no processo e questionavam a prática.

Em poucas horas, os fact-checkers mostraram que aquela era uma narrativa falsa. Embasaram suas apurações em fatos e documentos, publicaram textos e alertaram as plataformas com as quais têm parceria sobre a baixa qualidade da informação. Algumas das plataformas sinalizaram o conteúdo como indevido e reduziram seu alcance. Quem não gostou do resultado pôde apelar junto às big techs e aos checadores (usando canais existentes e sempre abertos).

Se a resolução que deve ser votada hoje já estivesse valendo antes do primeiro turno, o TSE poderia ter queimado diversas etapas.

Não precisaria ver qualquer análise independente que atestasse a inveracidade das afirmações contidas no vídeo para requerer - via ordem judicial - a remoção imediata de todos os links que estivessem espalhando aquela gravação. As plataformas que não reagissem em poucas horas, por sua vez, receberiam pesadas multas. Seus usuários não poderiam usar os canais de apelação e precisariam entrar numa briga judicial para recolocar seus conteúdos no ar.

Especialistas ouvidos por esta coluna acompanharão muito de perto a sessão plenária de hoje no TSE. Representantes das big techs esperam que os ministros da Corte vejam que Morais "está mudando as regras do jogo no meio da partida". E integrantes do próprio tribunal desejam checar se a instituição entende que Moraes está ou não "se aproximando perigosamente da censura".

A sessão está marcada para as 10h e deve ser rápida. Acredita-se que, por volta do meio-dia, o pleno do TSE já terá decidido se a luta contra as fake news é ou não um vale-tudo.

Cristina Tardáguila é diretora do ICFJ e fundadora da Lupa