Topo

Fernanda Magnotta

OPINIÃO

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

Acusados por ataque ao Capitólio responsabilizam Trump ou alegam ignorância

Registro da invasão do Capitólio - Win McNamee/Sony World Photography Awards
Registro da invasão do Capitólio Imagem: Win McNamee/Sony World Photography Awards

Colunista do UOL

12/01/2023 09h06

Receba os novos posts desta coluna no seu e-mail

Email inválido

Poucos dias antes dos atentados a sede dos 3 poderes no Brasil, foi divulgado pelo Departamento de Justiça dos Estados Unidos, o balanço de atividades referente aos 2 anos de investigações do ataque de 6 de janeiro ao Capitólio. No relatório, autoridades norte-americanas enfatizam que as apurações ainda estão em andamento mas que, até o momento, já é possível dizer que as perdas estimadas contabilizam cerca de US$ 2.734.783, sobretudo em função dos danos às instalações físicas do Congresso daquele país e de custos ligados à Polícia do Capitólio.

Por lá, estima-se que cerca de 2000 pessoas estiveram envolvidas no episódio, das quais, por ora, mais de 950 foram presas em quase todos os estados do país. A operação é liderada pelo procurador dos Estados Unidos para o Distrito de Columbia e por forças do FBI na capital norte-americana. Calcula-se que o Departamento de Justiça já tenha emitido mais de 5.000 intimações, além de ter apreendido mais de 2.000 dispositivos eletrônicos e revisado mais de 20.000 horas de gravações. Assim como temos visto acontecer no Brasil, também nos Estados Unidos cidadãos foram convidados a prestar assistência na identificação de indivíduos relacionados aos ataques ao Capitólio por meio de canais diretos de comunicação.

Os principais números atualizados, segundo a publicação mais recente do relatório oficial, dão conta que:

- ao menos 860 indivíduos foram acusados por invadir terreno federal restrito, alguns com arma perigosa ou mortal;
- houve 295 acusações por obstrução de justiça e/ou tentativa de corrupção;
- houve 284 acusações por agressão, resistência ou tentativa de impedir a ação de oficiais;
- houve 59 acusações por destruição de propriedade pública e 36 por roubo do patrimônio nacional;
- houve 50 acusações por conspiração; e
- houve 11 foram acusações por acusações ligadas a agressão de membros da mídia e/ou destruição de seus equipamentos.

Até o momento, nos Estados Unidos, cerca de 484 indivíduos se declararam culpados por mais de uma acusação e enfrentam sentenças que envolvem prisão. Aproximadamente 351 réus federais tiveram seus casos julgados e receberam sentenças, a exemplo do que ocorreu com Guy Reffitt, do Texas, condenado a 87 meses de cadeia, e Albuquerque Cosper Head, do Tennessee, condenado a 90 meses.

É importante enfatizar que no caso norte-americano, assim como no Brasil, existiram diversos indivíduos ligados a instituições policiais e/ou militares envolvidos no atentado do Capitólio e que já foram punidos pela Justiça. Entre eles destacam-se figuras como Stewart Rhodes, líder da milícia Oath Keepers e ex-paraquedista do Exército dos Estados Unidos, condenado por conspiração e com perspectiva de pena que pode chegar a 60 anos de prisão, e Thomas Webster, ex-policial da cidade de Nova York, já condenado a 10 anos. O andamento de todos os casos pode ser acompanhado aqui.

Apesar dos avanços citados, o caminho ainda parece longo para que essa página possa ser virada nos Estados Unidos. Segundo análise do portal POLITICO, é possível dizer os juízes norte-americanos têm sido cautelosos em impor longas penas de prisão na maior parte dos casos e que boa parte dos réus ainda aguarda definição de sentença.

O portal mantém um rastreador dos processos referentes à invasão do Capitólio, e, com base em informações nele contidas, afirma que a maior parte das sentenças até agora foi para contravenções, culminando em penalidades mais brandas, como curtos períodos prisão domiciliar, alguns anos de liberdade condicional, multas ou serviço comunitário. Dos condenados, penas severas foram decretadas apenas quando envolviam aspectos mais violentos e destrutivos, especialmente relacionados à agressão de policiais.

É interessante notar que, no caso norte-americano, boa parte dos réus estrutura suas defesas em torno de dois principais eixos: ou tentam transferir a responsabilidade para Donald Trump, com afirmações como "eu estava apenas seguindo instruções do meu Presidente", ou simplesmente alegam ignorância sobre o que exatamente significava participar do ato.

Além das tramitações individuais no sistema judiciário, cabe destacar que as investigações do 6 de janeiro de 2021 também miram relações entre a Casa Branca e milícias organizadas do país, como os chamados "Proud Boys" e que o FBI analisa, ainda, se houve algum tipo de interferência externa (de governos, organizações ou indivíduos) que possa ter fornecido apoio financeiro ou de outra natureza aos criminosos norte-americanos.

Por lá, as respostas à tentativa de golpe vieram também por meio da constituição de um Comitê Especial da Câmara dos Representantes para investigar os ataques. O grupo bipartidário ouviu mais de mil testemunhas e encaminhou conclusões e recomendações para o Departamento de Justiça do país por meio de um relatório que se tornou público no fim de 2022. O Comitê indicou, nesse material, o indiciamento do ex-presidente Donald Trump.

Já em 2021, aliás, o então Procurador Geral de DC, Karl Racine, analisava se deveria acusar formalmente não apenas Trump, mas também pessoas próximas a ele, como seu filho Donald Trump Jr., e aliados de primeira ordem, como Rudy Giuliani e Mo Brooks. Vale mencionar, por fim, que logo após os ataques, independente de decisões na Justiça, Trump foi banido de todas as redes sociais por ter sido considerado um incentivador direto de tais movimentos.

É importante ter claro que o sistema judicial de Brasil e Estados Unidos guardam importantes diferenças e que comparações nesse campo precisam ser muito cuidadosas. Ainda assim, por aqui, tornou-se imperativo acompanhar os ventos que sopram do Norte. Olhos atentos, portanto.