Acordo Mercosul e União Europeia ainda está muito longe de 'final feliz'
A recente conclusão das negociações do acordo Mercosul-União Europeia representa, à primeira vista, um sopro de esperança para o comércio internacional em tempos turbulentos. Em um cenário global marcado pela ascensão do protecionismo, por tensões geopolíticas crescentes e pelo questionamento da ordem liberal internacional, o simples fato de duas importantes regiões do mundo sinalizarem disposição para maior integração comercial merece atenção.
O acordo, cujas negociações se arrastam desde 1999, abrange uma ambiciosa agenda que vai além do comércio, incluindo diálogo político e cooperação. Sua amplitude é notável: propõe-se a reduzir tarifas, eliminar barreiras ao comércio de serviços e harmonizar regras em áreas cruciais como propriedade intelectual e compras governamentais. Em teoria, representa um compromisso com o multilateralismo e o livre comércio em um momento em que estas ideias enfrentam severos questionamentos.
No entanto, uma análise mais aprofundada revela contradições preocupantes. O histórico das negociações já demonstra as dificuldades inerentes ao processo: após uma primeira troca de ofertas malsucedida em 2004, as conversações ficaram paralisadas por seis anos. Mesmo após a formalização do acordo em 2019 e sua revisão em 2024, persistem obstáculos significativos para sua implementação efetiva.
O mais recente desenvolvimento - a inclusão de um anexo pela União Europeia com novas exigências ambientais - ilustra perfeitamente o padrão que tem caracterizado estas negociações: avanços seguidos de novos entraves, em um ciclo que parece interminável. Este padrão sugere que o acordo pode estar servindo mais como instrumento de retórica política do que como verdadeiro catalisador de mudanças concretas nas relações comerciais.
Os governos de ambos os lados do Atlântico podem estar usando o acordo como uma vitrine política, uma forma de "mostrar serviço" e construir legado, sem necessariamente ter a disposição ou capacidade política para enfrentar os custos e desafios reais de sua implementação. A necessidade de ratificação por todos os países-membros adiciona outra camada de complexidade, tornando o caminho para a concretização do acordo ainda mais incerto.
É louvável que, em um mundo cada vez mais fragmentado, ainda existam esforços para fortalecer laços comerciais e institucionais entre diferentes regiões. No entanto, o ceticismo quanto à materialização efetiva deste acordo não é apenas justificável - é necessário. A história nos ensina que acordos internacionais ambiciosos frequentemente sucumbem diante de realidades políticas domésticas e interesses setoriais arraigados.
O verdadeiro teste para o acordo Mercosul-UE não está em sua assinatura ou mesmo em sua eventual ratificação, mas na capacidade e vontade política dos países envolvidos de transformá-lo em políticas públicas concretas que beneficiem suas populações. Até o momento, os sinais nesse sentido não são particularmente encorajadores.
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