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Jamil Chade

REPORTAGEM

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"Pacote do Veneno" é criticado na UE e dificulta acordo com Brasil

Soja, grãos, agricultura - iStock
Soja, grãos, agricultura Imagem: iStock

Colunista do UOL

10/02/2022 12h03

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A aprovação do texto-base do projeto de lei que muda as regras sobre os agrotóxicos no Brasil distancia o país ainda mais de um acordo comercial com a União Europeia. Em Bruxelas, a votação no Congresso brasileiro foi acompanhada de perto, com a constatação de que a medida não ajudará a aproximar as posições entre os dois lados do Atlântico para ratificar o tratado de livre comércio entre a UE e o Mercosul.

Nesta semana, o plenário da Câmara dos Deputados aprovou, por 301 votos a favor e 150 contrários, o texto que foi apelidado de "pacote do veneno" pela oposição e alvo de críticas de ambientalistas.

O projeto de lei 6299/02 facilita a aprovação de novos pesticidas e altera diversos pontos sobre os agrotóxicos.

A iniciativa, porém, foi recebida nesta quinta-feira com preocupação nas instituições europeias. "A aprovação deste projeto de lei é muito preocupante", disse Anna Cavazzini, deputada europeia pelo Partido Verde e presidente do Comitê sobre Mercado Interno e Proteção do Consumidor do Parlamento Europeu. Por meses, ela ainda liderou os trabalhos do Legislativo nas relações com o Mercosul.

"Este projeto de lei significa que será mais provável que os pesticidas inseguros sejam utilizados pelos agricultores brasileiros", alertou.

"Isto pode ter impactos negativos não apenas sobre o meio ambiente, a biodiversidade e a saúde dos consumidores no Brasil, mas também sobre os consumidores europeus, pois frequentemente importamos agroprodutos brasileiros que possuem resíduos de pesticidas", disse.

"Já antes da aprovação deste projeto de lei, muitas pessoas na Europa estavam preocupadas que o acordo comercial UE-Mercosul agravasse esta situação. O projeto de lei aumenta ainda mais nossas preocupações", destacou a deputada.

O acordo foi negociado durante 20 anos e, em 2019, o tratado foi fechado entre os dois blocos. Mas, para entrar em vigor, ele precisa ser ratificado por todos os parlamentos e governos, o que hoje é impraticável diante do comportamento do governo de Jair Bolsonaro no campo ambiental.

Dentro da Comissão Europeia, fontes revelaram à coluna que a aprovação do PL "não facilitará" o trabalho do bloco de convencer líderes europeus a acatar o acordo com o Brasil. A Comissão defende o acordo, principalmente diante das oportunidades de ampliar as exportações da Europa para a América do Sul. Na avaliação do Executivo europeu, se Bruxelas não acelerar a aproximação com o Mercosul, a região acabará se tornando um parceiro privilegiado de outros polos de poder, em especial a China.

O governo brasileiro alega que a resistência europeia não tem relação com a proteção ao consumidor ou o meio ambiente. Em Brasília, a oposição é interpretada como uma manobra dos europeus para impedir a entrada de bens agrícolas brasileiros no mercado da UE.

Apesar disso, parlamentos regionais e nacionais já aprovaram moções indicando que irão se opor a um acordo com o Brasil, enquanto a política ambiental não mudar de forma radical.

Um levantamento realizado após um pedido de partidos ecologistas da Europa ainda revela que quase metade dos empresários afirma estar preocupado com impacto ambiental que um acordo comercial entre o Mercosul e a UE poderia gerar. 49% deles ainda afirmam que a melhor maneira de garantir que o Brasil cumpra suas obrigações ambientais, num acordo entre a UE e o Mercosul, seria por meio de medidas legalmente vinculantes, inclusive por meio de sanções.

O estudo foi realizado com 2,4 mil empresários na Alemanha, Bélgica, Holanda, Espanha, Itália e França. Os resultados revelam que apenas 22% estavam familiarizados com acordo comercial e que 40% dizem que o tratado não vai ter impacto em seus negócios.

Yannick Jadot, deputado europeu e candidato à presidência na França, diz que os dados "são claros" da preocupação dos empresários com o impacto ambiental. "Para as pequenas e médias empresas em particular, é um acordo muito pobre, escrito para beneficiar as maiores empresas, como a BASF e a Bayer Monsanto, que poderiam mais facilmente exportar pesticidas perigosos que são proibidos na UE", disse.