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Jamil Chade

REPORTAGEM

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'Quero esquecer Bolsonaro. É parte do passado', diz líder palestino

31.mar.2019 -Presidente do Brasil, Jair Bolsonaro, discursa ao lado do primeiro-ministro israelense, Benjamin Netanyahu, em visita a Israel - Jack Guez/AFP
31.mar.2019 -Presidente do Brasil, Jair Bolsonaro, discursa ao lado do primeiro-ministro israelense, Benjamin Netanyahu, em visita a Israel Imagem: Jack Guez/AFP

Colunista do UOL

28/02/2023 15h50

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Se o ex-presidente Jair Bolsonaro queimou pontes com diversos parceiros do Brasil durante os quatro anos de seu governo, em uma região específica seu nome passou a ser alvo de duras críticas: nos territórios palestinos.

Em entrevista ao UOL, o líder palestino Riyad al-Maliki deixou claro seu alívio com o fim do governo de extrema direita no Brasil e que, de forma inédita, modificou de maneira radical o posicionamento do Itamaraty sobre a questão palestina e alinhou o Brasil aos interesses de Israel e dos EUA.

Na ONU, o Brasil passou a votar ao lado dos americanos em todos os temas relacionados com Israel, enquanto o governo chegou a anunciar que iria transferir sua embaixada de Tel Aviv para Jerusalém. O ato significaria o reconhecimento da cidade como capital de Israel, um gesto considerado por dezenas de países como um aberração diplomática e uma violação do direito internacional.

Bolsonaro jamais cumpriu a promessa de modificar a embaixada. Mas sua aproximação ao governo de Israel minou a confiança dos demais países árabes no Brasil.

"Bolsonaro é parte do passado", disse Al-Maliki, atual chanceler palestino e que, nos últimos vinte anos, ocupou alguns dos principais cargos no governo em Ramallah. "Minha intenção é de esquecer dele, e não me lembrar dele", insistiu.

O palestino não disfarça que espera que, com o novo governo brasileiro, uma nova relação seja estabelecida com todo o continente latino-americano.

"Lula é um homem da justiça e do direito internacional", disse. "Quando estive com ele no começo do ano, ele me disse que o Brasil vai se posicionar a favor da justiça pela Palestina e que vai apoiar a causa do povo palestino, o direito à autodeterminação e que o povo palestino tenha seu estado independente", explicou.

"Não é exatamente uma surpresa escutar isso dele. Foi Lula quem reconheceu o estado da Palestina em seu primeiro mandato e, como resultado, vários outros países seguiram sua decisão na América Latina", declarou.

"Por isso, é muito importante a volta de Lula ao cenário político no Brasil. Ele vai influenciar muito o ambiente politico no continente e esperamos que isso reflita a posição de muitos países na América Latina, em defesa da justiça e autodeterminação dos países. Em especial, sobre a Palestina. Contamos com isso", completou.

Na avaliação do chanceler, mais que uma posição "pró-palestina", o que o Brasil e o restante da região defendem é o direito internacional. "Estão se posicionando pelo direito internacional e sua aplicação. Por terem essa posição, eles são automaticamente pró-palestinos", disse.

Documento revela condução desastrada da diplomacia brasileira no Oriente Médio

A situação do Brasil com Israel foi alvo de um exame por parte da equipe de transição do governo de Luiz Inácio Lula da Silva.

"A partir de 2019, as relações do Brasil com Israel estiveram associadas à inflexão nas posições históricas do Brasil acerca da questão do Oriente Médio, refletida em votos favoráveis a posicionamentos israelenses em organismos internacionais, notadamente na Assembleia Geral da ONU e no Conselho de Direitos Humanos, mas com reflexo também na AIEA", afirma o documento.

"Tal curso de ação, adotado sem contrapartida, contribuiu para minar a credibilidade e o papel do Brasil como ator com influência nos dossiês médio-orientais e não resultou em benefícios na relação com Tel Aviv, que já era intensa antes dessa inflexão", destacou.

"Ao contrário, os padrões de votação e a possibilidade de transferência da embaixada em Israel para Jerusalém, anunciada durante a campanha presidencial pelo então candidato Bolsonaro, provocaram atrito junto à Autoridade Palestina e outros países árabes", afirmou.

"Motivaram, também, moções condenatórias da Liga dos Estados Árabes (LEA) e o cancelamento, pelo Egito, de visita que o então chanceler Aloysio Nunes faria ao Cairo, logo após as eleições de 2018. A exclusão da Palestina do roteiro das duas viagens presidenciais ao Oriente Médio também gerou mal-estar com os palestinos", concluiu.