Jamil Chade

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Potências silenciam sobre proposta de Lula na ONU; EUA sinalizam outro rumo

A proposta do presidente Lula (PT) de convocar uma "constituinte" para a ONU (Organização das Nações Unidas) foi recebida com uma mistura de silêncio e dúvidas por parte das principais potências. Os EUA indicaram outro caminho para a reforma da instituição.

Ministros que estavam na reunião optaram por nem sequer mencionar o tema, ainda que todos concordem com a ideia de algum tipo de reforma na ONU. Ao UOL, vários deles também admitiram a incerteza diante da proposta. Segundo fontes do Itamaraty e do Planalto, Lula não consultou os demais países antes de avançar com a proposta.

O Brasil considera apresentar proposta de convocação de uma conferência de revisão da carta da ONU com base no seu artigo 109. Cada país pode ter sua visão quanto ao modelo de reforma da governança global ideal. Mas precisamos todos concordar quanto ao fato de que a reforma é fundamental e urgente.
Lula, em fala no G20

Na cúpula da ONU, a ideia foi aplaudida. O secretário-geral da instituição, António Guterres, vem insistindo, em conversas fechadas, que a ONU jamais foi feita para ser "imutável". "Não era para ser gravada em mármore", disse, em um recente encontro.

Para ele, não há opção para salvar a instituição que não seja por meio de uma reforma. "Não é reformar ou não reformar. Mas reformar ou colapso", disse, também em encontros fechados e relatado com exclusividade ao UOL.

A recomendação de Lula não faz parte do documento final do G20, o que reflete a ausência de um consenso entre as potências em relação à ideia, considerada como "ambiciosa e arriscada" por diversas delegações. Durante o debate que se seguiu ao discurso de Lula, o chefe da diplomacia europeia, Josep Borell, repetiu o apelo por uma reforma do Conselho de Segurança da ONU. Mas não citou a proposta do brasileiro. Já o Canadá anunciou ser contra a expansão de novos membros ao Conselho.

O governo dos EUA sinalizou que sua proposta é outra: começar a discutir dentro dos órgãos de negociação uma reforma apenas do Conselho de Segurança.

Em um discurso na reunião convocada pelo Brasil, Anthony Blinken destacou que os americanos querem um conselho com duas vagas permanentes para africanos, um para América Latina e assentos para Índia, Alemanha e Japão. "Os países em desenvolvimento precisam ter maior voz", disse o secretário de Estado norte-americano.

Sergei Lavrov, chanceler russo, tampouco tocou na proposta de Lula. Mas usou o evento para criticar o governo dos EUA. Segundo ele, são eles quem não querem dar maior poder para a Assembleia Geral da ONU.

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Para o representante de Putin, uma reforma da ONU deve levar em conta que há uma "nova distribuição dos centros de poder" no mundo. "O Ocidente abusou do poder nos organismos internacionais e estamos preocupados com o uso desses órgãos de forma confrontacionista", disse, destacando que os russos vão focar suas relações com América Latina, África e Ásia, além do Brics. Do outro lado da mesa, estava Blinken.

Ryad Mansour, embaixador palestino na ONU, explicou ao UOL que a proposta de Lula é uma tentativa de romper com o impasse de 30 anos na reforma do Conselho de Segurança e que vem sendo impedida pelas potências. Questionado se ela pode ter êxito, ele admitiu: "Não há como saber". A reforma vem sendo debatida desde 1990. Mas sem qualquer avanço real.

Ministros da Coreia do Sul, Alemanha, Japão e outros também evitaram tocar no tema apresentado por Lula em seus discursos durante a reunião.

Pequim é contra a adesão de grande emergentes no órgão, temendo que tenha de dividir espaço com a Índia, seu grande rival na Ásia. Dentro do Itamaraty, os chineses são considerados como um dos maiores obstáculos para uma reforma que possa levar o Brasil e outros emergentes ao órgão.

Na história da instituição, apenas quatro emendas pontuais foram feitas à carta das Nações Unidas e apenas em temas marginais. Depois de uma "constituinte" da ONU, caso ela realmente seja instalada, para que uma nova carta seja aprovada precisa haver apoio de todos os cinco membros do Conselho de Segurança.

Não há prazo para isso acontecer. A partir de agora, o governo brasileiro vai avaliar como vão reagir os outros países e passar a construir uma proposta concreta.

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