Trump sabe que o mundo está derretendo, por isso quer a Groenlândia
Oficialmente, a extrema direita e os aliados de Donald Trump negam que as mudanças climáticas estejam ocorrendo, mesmo com 2024 se perfilando para bater, de novo, os recordes de temperaturas no planeta. Uma das primeiras medidas do presidente eleito deve ser a retirada dos EUA do Acordo de Paris, assim como a aprovação de um desmonte das regulações ambientais em seu país.
Mas é justamente apostando no aquecimento global e no derretimento dos polos que Trump faz sua ofensiva sobre a Groenlândia.
Numa coletiva de imprensa nesta terça-feira, ele deixou evidenciado que poderia até mesmo usar a força para uma aquisição do território dinamarquês. O governo de Copenhague rebateu, alertando que a área não está à venda. Tudo isso no dia em que um de seus filhos fazia uma visita ao território.
A Groenlândia é de fato uma ilha num local estratégico do mundo. Mas ganhou um destaque ainda maior diante da rapidez do derretimento de suas geleiras. E, sob eles, estão minérios e fontes de energia estratégicos para a indústria de tecnologia.
Um estudo da Universidade de Barcelona analisou episódios extremos de derretimento na Groenlândia entre 1950 e 2022. Os resultados mostram números de perda de água de derretimento que, em média, atingiram cerca de 300 gigatoneladas por ano - o equivalente a um volume de cerca de 48 milhões de piscinas olímpicas por ano - entre 1980 e 2010.
O aquecimento do planeta e da maior ilha do mundo ainda deve abrir novas rotas de comércio, encurtando as viagens entre os EUA e os mercados asiáticos.
Mas isso também abrirá a região para uma verdadeira disputa geopolítica entre EUA, Europa, Rússia e China.
De fato, a região do Ártico está se aquecendo quatro vezes mais rápido do que o resto do mundo nas últimas quatro décadas, de acordo com um estudo de 2022 realizado por cientistas finlandeses e noruegueses. Os cientistas estão projetando que, até 2035, partes do Ártico estarão livres de gelo durante os meses de verão, abrindo perspectivas para a navegação comercial nessas águas e reduzindo o tempo de trânsito entre os EUA, a Europa e a Ásia.
Alguns estudos projetam que as rotas do Ártico poderão ser de 30% a 50% mais curtas do que as rotas do Canal de Suez e do Canal do Panamá, com um tempo de trânsito reduzido em cerca de 14 a 20 dias.
O próprio governo de Joe Biden lançou sua Estratégia Nacional para a Região do Ártico em outubro de 2022. Nela, a segurança nacional é a primeira prioridade. Diante da invasão da Ucrânia pela Rússia, a estratégia cita a necessidade de proteger a região e garantir que o Ártico não seja militarizado.
A estratégia também chama a atenção para os esforços da China para aumentar sua influência no Ártico, dobrando seus investimentos com foco na extração de minerais essenciais e usando compromissos científicos para realizar pesquisas de uso duplo em aplicações militares ou de inteligência no Ártico.
Essas preocupações não são puramente teóricas. Os levantamentos mostram que a Rússia tem mais bases do que a OTAN no Ártico e que está atualizando as pistas de pouso para melhorar a operacionalidade. Além disso, as distâncias mais curtas para um ataque de mísseis ou bombardeiros russos contra os EUA são sobre a calota polar.
Portanto, Trump não mente quando diz que a Groenlândia é estratégica. Ele apenas não conta aos seus apoiadores que sabe que o aquecimento global é real.
Ao mostrar sua ambição pelo território ártico, o presidente eleito está provando que o negacionismo climático é coisa de charlatães.
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