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Josias de Souza

Capitão perdoa 83,4% de penas impostas a policiais

Adriano Machado/Reuters
Imagem: Adriano Machado/Reuters

Colunista do UOL

24/12/2019 05h27

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O indulto concedido por Jair Bolsonaro a policiais condenados criminalmente foi de uma generosidade sem precedentes. O capitão perdoou 83,4% das penas de agentes de segurança pública enviados à cadeia após condenação por crimes culposos (sem intenção). O decreto presidencial prevê a abertura das celas dos criminosos que já cumpriram um sexto da pena (16,6%).

Além de policiais federais, rodoviários, civis e militares, serão alcançados pela clemência de Bolsonaro os agentes penitenciários, bombeiros, guardas municipais, agentes de trânsito e guardas portuários. O decreto perdoa também militares das Forças Armadas condenados por crimes não intencionais cometidos em operações de Garantia da Lei e da Ordem, as chamadas GLOs.

Bolsonaro foi mais condescendente com os presos da sua base eleitoral do que Michel Temer com os condenados por corrupção. Em decreto assinado às vésperas do Natal de 2017, Temer incluiu os ladrões de dinheiro público entre os beneficiários do indulto. Condicionou o perdão ao cumprimento de um quinto da pena (20%). Ou seja, apagou 80% das penas.

De acordo com o Código de Processo Penal, um preso só pode obter a liberdade condicional após cumprir pelo menos um terço da pena (33%). Quer dizer: Bolsonaro e Temer foram mais complacentes com seus condenados de estimação do que a mais benevolente das hipóteses aprovadas no Congresso para a concessão de liberdade a condenados —ainda assim liberdade condicional.

Previsto na Constituição como um ato discricionário do presidente da República, o indulto não pode se confundir com prêmio a criminosos ou condescendência com o crime. Não é razoável que o presidente subverta por meio de decreto as leis aprovadas pelo Legislativo, anulando de forma genérica as penas impostas pelo Judiciário em casos julgados sob os rigores do devido processo legal.

Na prática, Bolsonaro impôs na marra a versão natalina de uma obsessão pessoal que o Congresso acaba de rejeitar: o excludente de ilicitude, regra que permitiria aos juízes isentar de culpa policiais e militares que praticam violência ou matam sempre que o "excesso decorrer de escusável medo, surpresa ou violenta emoção".

Em novembro do ano passado, quando o Supremo discutia se o indulto de Temer era ou não inconstitucional, Bolsonaro foi às redes sociais para avisar que, depois de sua posse, não haveria mais clemências com sentenciados.

O então presidente eleito escreveu: "Fui escolhido presidente do Brasil para atender aos anseios do povo brasileiro. Pegar pesado na questão da violência e criminalidade foi um dos nossos principais compromissos de campanha. Garanto a vocês, se houver indulto para criminosos neste ano, certamente será o último". Fez papel de bobo quem acreditou.

Assinado também pelo ministro Sergio Moro (Justiça), o decreto de Bolsonaro exclui do indulto os condenados por 38 tipos de violações —dos crimes hediondos ao estupro. E inclui o perdão a condenados que sofrem de doenças graves. A despeito das exceções, a oposição deve recorrer ao Supremo Tribunal Federal para tentar derrubar o pedaço tóxico do decreto.

Membros do Ministério Público avaliavam na noite desta segunda-feira (23) que o próprio procurador-geral da República Augusto Aras deveria questionar na Suprema Corte a constitucionalidade do decreto de Bolsonaro.

Eventuais recursos não devem dar em nada. Depois que avalizou o decreto baixado por Temer para beneficiar corruptos, o Supremo tornou-se parte do fenômeno que transforma indulto em avacalhação.