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Josias de Souza

ANÁLISE

Texto baseado no relato de acontecimentos, mas contextualizado a partir do conhecimento do jornalista sobre o tema; pode incluir interpretações do jornalista sobre os fatos.

CPI da Covid tem potencial para desgastar Bolsonaro, não para derrubá-lo

Colunista do UOL

27/04/2021 19h36

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A experiência mostra que dois espetáculos não cabem ao mesmo tempo no palco de Brasília. Dividida entre um e outro, a plateia acaba privilegiando o mais barulhento. Estava em cartaz há pouco mais de um mês o comitê anti-covid, integrado por Bolsonaro e pelos presidentes do Senado e da Câmara. A ideia do senador Rodrigo Pacheco e do deputado Arthur Lira era oferecer pela primeira vez uma coordenação nacional da crise sanitária. Não conseguiram coordenar nem Bolsonaro, que dirá a pandemia. Entrou em cartaz um espetáculo novo, que tende a se consolidar como um novo polo de poder na Capital: a CPI da Covid.

O governo entra na CPI perdendo de goleada. Quando Randolfe Rodrigues começou a coletar assinaturas para um pedido de investigação parlamentar, o Planalto imaginou que o senador não alcançaria o número regimental de 27 apoiadores. Ultrapassou. Avaliou-se que certos senadores não resistiriam ao assédio do governo para retirar as rubricas do requerimento. Resistiram. Apostou-se que o Supremo não ousaria arrancar a CPI da gaveta do presidente do Senado. Arrancou.

Minoritário na CPI, Bolsonaro mastigará nos próximos meses o pão que o Tinhoso amassou. Utilizando o fermento fornecido pelo próprio Bolsonaro, a CPI deve documentar o negacionismo sanitário do presidente. Isso será suficiente para desgastar politicamente o capitão, não para derrubá-lo. Uma CPI investiga, mas não processa. No limite, pode concluir que Bolsonaro cometeu, por ação ou omissão, crime comum ou crime de responsabilidade.

Na hipótese de crime comum, o relatório da CPI iria para a mesa do procurador-geral Augusto Aras, a quem caberia processar o presidente junto ao STF. Na hipótese de crime de responsabilidade, o caminho seria um pedido de impeachment, que cairia no colo de Arthur Lira, o chefe da Câmara.

Ainda que Aras ou Lira decidissem abrir as gavetas, os processos só avançariam se 342 dos 513 deputados votassem contra Bolsonaro. Isso dificilmente ocorrerá. Os adversários de Bolsonaro olham para a urna de 2022. E tentam enfraquecê-lo eleitoralmente. Os aliados do presidente olham para o Diário Oficial. Querem Bolsonaro fraco para arrancar dele mais verbas e cargos.