Texto baseado no relato de acontecimentos, mas contextualizado a partir do conhecimento do jornalista sobre o tema; pode incluir interpretações do jornalista sobre os fatos.
Bolsonaro inventa a blindadociata, ostentação em que há tanques e trouxas
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Cinco dias depois da invasão das tropas do centrão à cidadela da Casa Civil, Bolsonaro inventou uma brincadeira nova: a blindadociata. Consiste num desfile de blindados e outros veículos militares pela Esplanada dos Ministérios, com pit-stop na frente do Planalto. A cena inclui uma reverência do general Braga Netto, ministro da Defesa, ao capitão que faz as vezes de "chefe supremo das Forças Armadas."
Estava entendido que Ciro Nogueira, o coronel do centrão, chegara ao quarto andar do Planalto para "estabilizar" o governo e "diminuir as tensões". Arthur Lira, outro coronel do mesmo pelotão, contribuiria para a estabilização encaminhando a polêmica do voto impresso, que "já foi longe demais", para um "ponto final" no plenário da Câmara.
Os blindados chegam à Praça dos Três Poderes no dia que os deputados escolheram para atravessar uma derrota na traqueia do presidente. "Coincidência trágica", lamentou Lira, como que tentando ajustar o olhar à paisagem. De repente, o centrão virou "amortecedor" de tanques.
Mal comparando, a blindadociata de Bolsonaro tem uma semelhança historiográfica com o Comício da Central, realizado em 13 de março de 1964, diante do Ministério da Guerra. Ali, os blindados pareciam representar o apoio militar ao presidente de esquerda João Goulart. Agora, representariam o aval da farda ao regime civil mais militar da história.
Dono de uma genialidade que sumiu do cenário político, Carlos Lacerda chamou a manifestação realizada há 57 anos de "Comício das Lavadeiras". Ao explicar-se, disse que só havia no ato "tanques e trouxas". Dias depois, os tanques começaram a prender os trouxas.
Com a popularidade em declínio e submetido a um cerco judicial que aguça os seus maus bofes, Bolsonaro coloca os blindados na rua com a mesma naturalidade com que retira a motocicleta da garagem. Submetido a uma chiadeira, o capitão convida presidentes dos tribunais superiores e congressistas para a ostentação militar.
Partidos de oposição foram ao Supremo Tribunal Federal para tentar barrar o desfile de blindados, "particularmente nas adjacências do Palácio do Congresso Nacional". A encrenca aterrissou na mesa do ministro Dias Toffoli.
Dado a confraternizações com a família Bolsonaro, Toffoli afinou. Indeferiu o mandado de segurança sob o argumento de que a autoridade organizadora do desfile é o comandante da Marinha, não o presidente da República. E a competência para julgar e processar comandantes militares é do Superior Tribunal de Justiça, o STJ.
A paisagem é um hábito visual. Só começa a existir depois de 1.500 olhares, dizia o cronista Nelson Rodrigues. Pois Bolsonaro injeta anomalias em série na paisagem enquanto pisa na democracia, distraído. Só os trouxas ainda não perceberam que passa da hora de lavar a roupa suja.
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